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Incorporação imobiliária para empreendimento hoteleiro
Melhim Namem Chalhub
27/12/2022
Neste trecho do livro Incorporação Imobibiária, Melhim Namem Chalhub discorre sobre a Incorporação imobiliária para empreendimento hoteleiro. Entenda as leis e as regras!
Incorporação imobiliária para empreendimento hoteleiro
A Lei nº 11.771/2008 dispõe sobre a política nacional de turismo e entre os meios de hospedagem que qualifica estão figuras como “condomínio hoteleiro, flat, flat-hotel (…), apart-service condominial, condhotel e similares”; para seu cadastramento no Ministério do Turismo, exige-se a apresentação, entre outros documentos, de “convenção de condomínio ou memorial de incorporação ou, ainda, instrumento de instituição condominial, com previsão de prestação de serviços hoteleiros aos seus usuários, condôminos ou não, com oferta de alojamento temporário para hóspedes mediante contrato de hospedagem no sistema associativo, também conhecido como pool de locação” (art. 24, II, “a”).
Por envolver a venda, durante a construção, de partes de condomínio geral ou de unidades autônomas de condomínio edilício e, ainda, a contratação de participação nos resultados dos meios de hospedagem a serem futuramente instalados, o negócio se submete também, e simultaneamente, às normas sobre a incorporação imobiliária, de que trata a Lei nº 4.591/1964, e aos requisitos dos contratos de investimento coletivo (CIC) de que trata o inciso IX do art. 2º da Lei nº 6.385/1976.12
Articulam-se, assim, duas formas jurídicas para a oferta pública. A primeira correspondente à habilitação do incorporador, mediante registro do Memorial de Incorporação de que trata a Lei nº 4.591/1964, para venda das unidades ou das partes do condomínio geral, e a segunda correspondente à habilitação do empreendedor para oferta dos CIC, nos termos da Lei nº 6.385/1976.
Os meios de hospedagem previstos na Lei nº 11.771/2008 comportam distintas formas de atribuição da propriedade da edificação onde serão prestados os serviços de hotelaria: se se tratar de condomínio edilício, o imóvel é desdobrado em tantas matrículas quantas sejam as unidades autônomas, e estas, em regra, são atribuídas a distintos titulares; ou, caso se trate de condomínio geral, o imóvel será objeto de uma única matrícula e a propriedade da totalidade da edificação é dividida em quinhões passíveis de serem atribuídos a distintos proprietários.
O negócio se desenvolve basicamente em dois estágios: o primeiro correspondente à produção imobiliária, à venda das unidades e à celebração dos contratos de investimento coletivo; e o segundo correspondente à prestação dos serviços de hospedagem e sua administração, nos termos definidos pela Lei nº 11.771/2008.
Em relação ao regime da incorporação imobiliária, os documentos caracterizadores do empreendimento integrarão o Memorial de Incorporação, que, após arquivado no Registro de Imóveis, habilita o empreendedor a negociar a futura edificação.
Apesar de a operação ter como suporte estrutural os elementos que conformam a incorporação imobiliária, a essência do negócio é a participação dos adquirentes nos resultados do empreendimento, impondo que sejam observados os requisitos de oferta pública de valores mobiliários vinculados à captação de recursos para edificação do empreendimento imobiliário e à exploração dos meios de hospedagem, nos termos das Leis nos 6.385/1976 e 11.771/2008.
Assim, considerando que a aquisição dos imóveis não se destina à fruição pelos próprios adquirentes, mas sua função econômica é a participação dos adquirentes nos resultados da exploração econômica do empreendimento hoteleiro, a operação deve observar também as normas da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) destinadas a propiciar adequada informação e proteção do investidor.
Em razão da configuração assim delineada, a divulgação da oferta compreende os elementos do Memorial de Incorporação e, ainda, informações constantes no prospecto de que tratam as normas do CVM, correspondentes às características da futura exploração comercial do empreendimento, que devem esclarecer, entre outros aspectos, a possibilidade de os investidores não obterem lucro ou apurarem prejuízo em decorrência de eventual insucesso do empreendimento hoteleiro.
Entre os aspectos a serem divulgados no prospecto avultam informações sobre viabilidade econômica que apresentem as perspectivas de rentabilidade; gestão da atividade hoteleira e dos interesses do condomínio, compreendendo as normas de prestação de contas; resumo das cláusulas dos futuros contratos a serem celebrados entre os ofertantes e os investidores e entre estes e as demais contrapartes no conjunto de contratos; remuneração dos investidores e da administradora do empreendimento hoteleiro e dos demais participantes do empreendimento; e fatores de risco do negócio, como acima referido.
A par dos aspectos que sujeitam a primeira fase desse negócio a uma configuração que é típica da incorporação imobiliária, o condomínio é organizado em conformidade com as características da exploração empresarial do meio de hospedagem instalado no conjunto imobiliário.
Assim é porque as unidades imobiliárias integrantes desses condomínios não se destinam à fruição mediante ocupação pelos próprios titulares, mas, sim, à exploração mediante contratos de hospedagem que lhes permita auferir resultados econômicos, de modo que os termos dos instrumentos de instituição e de convenção de condomínio devem conformar-se a essa finalidade, visando sua adequação à exploração do potencial econômico do conjunto imobiliário para os fins de hospedagem, e não para fruição dos próprios titulares das unidades e/ou dos quinhões em que se divide a propriedade da edificação.
Dado que a aquisição das unidades imobiliárias dessa espécie de empreendimento não visa seu uso pelo adquirente como destinatário final, mas, sim, sua exploração econômica, o contrato de compra e venda não caracteriza relação de consumo, não se aplicando ao caso o Código de Defesa do Consumidor por qualificar-se o adquirente como investidor, e não como consumidor.13
As normas da instituição e da convenção, assim, devem priorizar o regular desenvolvimento da atividade empresarial para obtenção de resultado econômico e sua distribuição aos proprietários participantes.
Para adequado aproveitamento econômico, a administração desses condomínios é, em regra, atribuída à empresa de operação hoteleira.
Nas hipóteses em que a empresa de hotelaria é contratada no momento inicial do lançamento da incorporação, a operação contempla a articulação de dois negócios jurídicos submetidos a regimes distintos, que se desenvolvem em dois estágios subsequentes.
Nesses casos, não raras vezes a operação é formalizada mediante (i) contrato de alienação das futuras unidades, (ii) contrato de constituição de uma sociedade em conta de participação integrada pelos adquirentes e pela empresa de hotelaria ou, alternativamente, (iii) contrato de locação sob condição suspensiva tendo por objeto a exploração do futuro edifício a partir da imissão da locatária na posse, celebrado entre o incorporador e empresa de hotelaria, em cujos direitos e obrigações os adquirentes se sub-rogam em ato concomitante ao da celebração do contrato de aquisição das unidades.
Nesse quadro, a responsabilidade dessas empresas perante os adquirentes é demarcada pela função de cada um dos distintos contratos que com eles celebraram, respondendo o incorporador pela execução do empreendimento e a empresa hoteleira pela exploração do futuro edifício, a partir do habite-se, reconhecendo a jurisprudência a ilegitimidade dessa empresa, em regra, para responder pelo inadimplemento da obrigação de construir e entregar o edifício por não integrar a relação jurídica correspondente ao contrato de incorporação imobiliária.14
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Notas:
13 “Direito dos Contratos. Compromisso de compra e venda entre particular e incorporadora. Aquisição de imóvel com o objetivo de empregá-lo em atividade hoteleira. Conflito negativo de competência entre Câmara Cível Especializada e Câmara Cível para julgamento do recurso. Ausência de relação de consumo, uma vez que o autor adquiriu o imóvel para utilizá-lo na exploração de atividade empresarial de hotelaria, com o intuito de lucro. Pela teoria finalista, consumidor é o destinatário final fático e econômico do bem ou serviço, o que não se evidencia no caso. Questão já apreciada pelo Órgão Especial no Conflito de Competência nº 0059085-87.2015.8.19.0000, de Relatoria do Des. Antonio Eduardo F. Duarte, julgado em 18.01.16: ‘Conflito negativo de competência. Câmara Cível e Câmara Cível Especializada em Direito do Consumidor. Aquisição de unidade integrante de ‘Pool’ Hoteleiro. Finalidade de lucro. Inexistência de relação de consumo. Improcedência do conflito’. Procedência do conflito para declarar competente o Juízo da 9ª Câmara Cível” (TJRJ, Órgão Especial, Conflito de Competência nº 0002469-58.2016.8.19.0000, rel. Des. Nagib Slaibi Filho, j. 16.6.2016).
14 “Recurso especial. Civil. Promessa de compra e venda de Unidade de apart-hotel. Paralisação das obras. Ação Resolutória. Código de defesa do consumidor. Aplicabilidade. Consumidor final. Afastamento. Investidor. Teoria finalista mitigada. Vulnerabilidade. Aferição. Necessidade. Futura administradora de serviços hoteleiros. Legitimidade passiva ad causam. Cadeia de fornecimento. Descaracterização. Oferta e publicidade. Responsabilidade solidária. Inexistência. Informação clara. Atuação especificada. Adquirente. Ciência efetiva. Pool de locação. Sociedade em conta de participação. Contratação. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. As questões controvertidas na presente via recursal são: a) definir se o Código de Defesa do Consumidor se aplica às ações de resolução de promessa de compra e venda de imóvel não destinado à moradia do adquirente (finalidade de investimento) e b) delinear se a futura administradora de empreendimento hoteleiro, cujas obras foram paralisadas, possui legitimidade passiva ad causam, juntamente com a promitente vendedora, a intermediadora e a incorporadora, em demanda resolutória e reparatória de contrato de aquisição de unidades de apart-hotel. 3. O adquirente de unidade imobiliária, mesmo não sendo o destinatário final do bem e apenas possuindo o intuito de investir ou auferir lucro, poderá encontrar abrigo da legislação consumerista com base na teoria finalista mitigada se tiver agido de boa-fé e não detiver conhecimentos de mercado imobiliário nem expertise em incorporação, construção e venda de imóveis, sendo evidente a sua vulnerabilidade. Em outras palavras, o CDC poderá ser utilizado para amparar concretamente o investidor ocasional (figura do consumidor investidor), não abrangendo em seu âmbito de proteção aquele que desenvolve a atividade de investimento de maneira reiterada e profissional. 4. O apart-hotel (flat services ou flats) é um prédio de apartamentos com serviços de hotelaria. No caso, é incontroverso que o empreendimento se destina a aluguéis temporários. Como não é permitido aos condomínios praticarem atividade comercial, e para haver a exploração da locação hoteleira, os proprietários das unidades devem se juntar em uma nova entidade, constituída comumente na forma de sociedade em conta de participação, apta a ratear as receitas e as despesas das operações, formando um pool hoteleiro, sob a coordenação de uma empresa de administração hoteleira. 5. Na hipótese, é inegável que a promissária compradora era investidora, pois tinha ciência de que as unidades habitacionais não seriam destinadas ao próprio uso, já que as entregou ao pool hoteleiro ao anuir ao Termo de Adesão e ao contratar a constituição da sociedade em conta de participação para exploração apart-hoteleira, em que integraria os sócios participantes (sócios ocultos), sendo a Blue Tree Hotels a sócia ostensiva. Pela teoria finalista mitigada, a Corte local deveria ao menos aferir a sua vulnerabilidade para fins de aplicação do CDC. 6. Na espécie, não há falar em deficiência de informação ou em publicidade enganosa, porquanto sempre foi divulgada claramente a posição da BTH no empreendimento, tendo se obrigado, nos termos da oferta ao público e dos contratos pactuados, de que seria tão somente a futura administradora dos serviços hoteleiros após a conclusão do edifício, sem ingerência na comercialização das unidades ou na sua construção. Reconhecimento da ilegitimidade passiva ad causam. 7. Deve ser afastada qualquer responsabilização solidária da recorrente pelo não adimplemento do contrato de promessa de compra e venda das unidades do apart-hotel, seja por não integrar a cadeia de fornecimento relativa à incorporação imobiliária, seja por não compor o mesmo grupo econômico das empresas inadimplentes [empresas incorporadoras], seja por também ter sido prejudicada, visto que sua pretensão de explorar o ramo hoteleiro na localidade foi tão frustrada quanto a pretensão da autora de ganhar rentabilidade com a aquisição e a locação das unidades imobiliárias”. (REsp 1785802-SP, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, DJe 6.3.2019). No mesmo sentido: AgInt na TutPrv no TP 2.733/SP, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, DJe 1.9.2020; AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.888.274-RJ, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 15.12.2021.