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CLÁSSICOS FORENSE
EDUCAÇÃO
REVISTA FORENSE
O Federalismo e a Universidade Regional
Revista Forense
21/11/2022
REVISTA FORENSE – VOLUME 155
SETEMBRO-OUTUBRO DE 1954
Semestral
ISSN 0102-8413
FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO
FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto,
Abreviaturas e siglas usadas
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SUMÁRIO REVISTA FORENSE – VOLUME 155
CRÔNICA
DOUTRINA
- A organização e o funcionamento do Poder Judiciário, M. Seabra Fagundes
- Autarquias estaduais e municipais, Carlos Medeiros Silva
- Normas gerais de direito financeiro, Rubens Gomes De Sousa
- As transformações do Direito de família, Lino De Morais Leme
- Nulidades no Direito contratual do Trabalho, Orlando Gomes
- Pressupostos processuais, Ademar Raimundo Da Silva
- A evolução do desvio de poder na jurisprudência administrativa, Roger Vidal
PARECERES
- Mandado de Segurança Contra a Lei em Tese – Ato Normativo – Requisição de Aguardente pelo Instituto do Açúcar e do Álcool, Francisco Campos
- Fideicomisso e Usufruto – Distinção, Carlos Medeiros Silva
- Impôstos – Arrecadação Estadual – Excesso a ser entregue aos Municípios, Aliomar Baleeiro
- Imposto de Renda – Pessoa Jurídica Domiciliada no Estrangeiro – Convenção de Royalties, Rui Barbosa Nogueira
- Contrato Administrativo – Revisão de Preço – Teoria da Imprevisão, Caio Tácito
- Contrato por Correspondência com Firma Estrangeira – Nota Promissória – Requisitos Essenciais, Afrânio de Carvalho
- Advogado – Retirada de Autos de Cartório – Processos Criminais, Evandro Lins e Silva
NOTAS E COMENTÁRIOS
- A conclusão de atos internacionais no Brasil, Hildebrando Accioly
- O Federalismo e a Universidade Regional, Orlando M. Carvalho
- Inelegibilidade por Convicção Política, Osni Duarte Pereira
- Embargos do Executado, Martins de Andrade
- Questão de Fato, Questão de Direito, João de Oliveira Filho
- Fantasia e Realidade Constitucional, Alcino Pinto Falcão
- Da Composição da Firma Individual, Justino de Vasconcelos
- A Indivisibilidade da Herança, Gastão Grossé Saraiva
- O Novo Consultor Geral da República, A. Gonçalves de Oliveira
- Desembargador João Maria Furtado, João Maria Furtado
JURISPRUDÊNCIA
LEIA:
SUMÁRIO: Origem e evolução da fórmula federalista. A federação no Brasil. Predomínio da União e marcha para o Estado unitário. Federalização das faculdades de ensino superior. A Universidade regional e os seus fins. O problema do ensino em Minas Gerais. Êxodo rural e urbanização. Oportunidade para as mulheres. Conhecimento do meio físico, social e econômico. Preparação das elites. Condições para a pesquisa. Bôlsas de estudo. Conclusão.
Sobre o autor
Orlando M. Carvalho, vice-reitor da Universidade de Minas Gerais.
NOTAS E COMENTÁRIOS
O Federalismo e a Universidade Regional
Origem e evolução da fórmula federalista. A federação no Brasil
* A fórmula da Federação, no mundo moderno, foi uma solução de circunstância – como soem ser as soluções políticas. Destinou-se a resolver a situação das colônias americanas, no processo de integração, mas o sucesso da medida, concomitante com o êxito econômico, determinou a criação de nova categoria política – o Estado federal.
Por tôda parte, a medida foi analisada e destrinçada para servir de modêlo e exemplo aos ensaios posteriores de redivisão política. Com o crescimento desmesurado dos Estados modernos – Rússia; 200 milhões; Índia: 340 milhões; China: 480 milhões – a fórmula modesta dos americanos do fim do século XVIII transformou-se em panacéia universal.
Mas, há Estados federais de todos os tipos e feitios. Sua evolução tem sido tão radical que o tipo médio elaborado sôbre a base dos Estados Unidos de 1787 já não serviu para compreender o federalismo suíço de 1848; nem ambos serviram para o estudo dos novos tipos contemporâneos.
O tipo brasileiro tem sido comparado freqüentemente com o americano; mas o símile é enganoso. Os americanos construíram a sua unidade partindo de colônias separadas. Tentaram, primeiro, a Confederação, que falhou, como falharam tôdas as Confederações. Evolveram, em seguida, para o Estado federal, em que se encontram, e êsse Estado federal caminha para a unidade e a centralização. A discriminação das rendas públicas revela claramente a tendência:
1927 1948 União 26,6% 75% Estados 15,3% 14% Local 58,1% 11%
No Brasil, viemos da unidade imperial para a descentralização federalista. O Império, em 1868, destinava 80,8%. das rendas públicas ao Centro; 16,7% às Províncias, e 2,5% aos Municípios. Em 1951, acusa-se uma certa descentralização, mas o predomínio do Centro permanece:
União …… 47,71%
Estados ….. 35,68%
Distrito Federal e Municípios …. 16,61%
Predomínio da União e marcha para o Estado unitário
Ao contrário da União nos Estados Unidos, que só consegue ampliar o seu raio de ação a golpes de pressão, a União nos Estados Unidos do Brasil vem recebendo cada vez maior capacidade de ditar normas uniformes para todo o território. Pelo menos na forma, regredimos nìtidamente para o Estado unitário, de que viemos, e êsse movimento deveria ser objeto da meditação do homem da Província, cujo destino, como personalidade, está indissolùvelmente ligado ao sentido regional da forma política.
No Brasil, tudo indica que a União está recebendo mais do que necessita para as despesas de sua competência. Nada é mais expressivo dêsse fato do que a quantidade de convênios com Estados e Municípios, que sucessivamente se executam. A União está subvencionando iniciativas e obras de caráter provincial e local, porque sua renda excede as necessidades reais da administração central, aliás bastante cara para os serviços que presta ao homem do interior. Os empréstimos de fonte federal a Estados-membros e Municípios constituem rotina e há governos que não mais funcionariam na atividade progamática, se o socorro financeiro do Contro não ocorresse.
O predomínio das rendas federais Brasil, somado às competências vastíssimas atribuídas à União, determina o aparecimento da tendência para a uniformização. Homens da Província, na Constituinte de 1946, votaram pelo aumento de poderes da União e pelo enfraquecimento financeiro dos Estados-membros, por não terem sabido resistir ao impacto da experiência ditatorial.
Estabelecida uma União abastada, o movimento para estender o seu domínio desenvolve-se como rotina. A técnica tem sido a de alargar a esfera de ação burocrática através da uniformização. Armada de dinheiro e de regulamentos, a burocracia central está fazendo esforços para eliminar as peculiaridades regionais e uniformizar o país. Para tal objetivo conjuga-se a ação dos elementos humanos da atividade estatal – os políticos e os burocratas – associados na obra comum de destruir a Federação e abrir o caminho para-o Estado unitário.
Estará essa construção política e administrativa de acôrdo com a estrutura sociológica da Nação brasileira? Temos sérias dúvidas e reservas a respeito de semelhante orientação.
Federalização das faculdades de ensino superior
Estas tendências manifestaram-se claramente em muitos setores da administração governamental. No ensino superior, a sua forma mais visível foi a federalização de estabelecimentos de ensino, estaduais ou não. O movimento das federalizações tem natureza política. Os líderes que o patrocinaram vigiaram ao problema local e não procuraram com êle ampliar o raio de ação da burocracia central. Neste sentido, estavam certos e de sua intervenção resultou imediata elevação de padrões materiais nos estabelecimentos federalizados. O exemplo de Minas é expressivo. Em 1949, o orçamento total da U.M.G. foi de Cr$ 16.800.000,00; em 1954 elevou-se a Cr$ 174.040.000,00; com um aumento de 1.000% em cinco anos. Os professôres, que tinham o vencimento médico de Cr$ 2.500,00, passaram ao mínimo de 8.400,00 por mês. Quem percorrer as instalações de quaisquer dos institutos universitários verá com os próprios olhos a melhoria material alcançada.
Mas, a fórmula da federalização apresenta peculiaridades. Em Minas, por exemplo, a U.M.G. foi federalizada com a natureza de autarquia. Autarquia significa capacidade para gerir seus próprios interêsses e governar a sua vida. E isto não temos, na realidade. Nossa autarquia sofreu limitações legais, tais como a subordinação do pessoal permanente diretamente ao govêrno federal e a outorga dos estatutos foi atribuída à competência da autoridade federal. Tais restrições, conquanto compreensíveis, deram oportunidade a que o govêrno, federal, através de sua burocracia, procurasse uniformizar as universidades regionais, primeiro com uma inspeção burocrática para a organização do pessoal e, posteriormente, com ã tentativa em curso de padronizar os estatutos. As Universidades de Minas, Bahia, Paraná, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Goiás deveriam ter a mesma organização, como se o fato sociológico da cultura pudesse ser absorvido nos quadros uniformes de uma estrutura legal. É instituir fôrma fria e sem sentido para o ensino universitário regional, numa hora em que a diversidade brasileira é reconhecida pela própria Constituição, não só com a adoção do Estado federal, como com o estabelecimento de áreas de administração especial no vale do São Francisco, na região sêca do Nordeste e na Bacia Amazônica.
Devemos resistir sem alarde, mas sem desfalecimentos, à uniformização. A experiência mostra que não é necessário que as regiões sejam iguais para que o Estado brasileiro funcione regularmente. O que podemos afirmar é que o progresso espiritual e material se baseia na diversidade humana, porque tem seus alicerces na personalidade. Não há necessidade de identificar-se a vida cultural com a uniformidade jurídica e é indispensável que a vida cultural se desenvolva sôbre a base das particularidades de cada meio. Há dias, conversava em São Paulo com um professor de sociologia regional de Dakar sôbre êsses problemas e ouvi dêle a informação esclarecedora de que as autoridades francesas, menos amoldáveis em face do meio estrangeiro, estavam instalando naquela cidade africana uma universidade que se assemelhava em tudo a qualquer universidade da metrópole. Enquanto isso, em Ibadan, na Nigéria, os inglêses estão tentando adaptar a estrutura universitária européia ao meio, como único processo de integrar as tribos africanas na estrutura jurídica da Comunidade (ex-Britânica de Nações). A sabedoria política dos inglêses, neste como em outros setores de administração, mereceria dos burocratas brasileiros mais atenta consideração.
Que fins deve ter uma Universidade regional?
Primeiro, deve ter os fins de tôda universidade: ensino, pesquisa e vida em comum. Em nossa casa, reconheçamos com simplicidade, há de bom o ensino. Somos uma universidade de lecionadores. Não se pode dizer que a pesquisa tenha realmente o lugar de relêvo em nossa vida universitária. Há pesquisa e pesquisadores, mas não é de meu conhecimento que professôres tenham sido desligados da tarefa de dar aulas para dedicarem-se à pesquisa científica ou filosófica. Quanto à vida em comum, não é preciso dizer que a não temos. Apesar dos pesares e com poucas modificações, ainda somos o que, no meu tempo de estudante, se dizia da U.M.G.: “Escolas Reunidas Mendes Pimentel”. E, mesmo quando houver maior entrosamento, a vida em comum ficará dependendo de substancial reforma do tipo de ensino. Ou faremos cursos universitários básicos comuns a todos os alunos, que depois irão para as respectivas especialidades; ou daremos particular expansão ao Colégio Universitário, que deverá ser obrigatório e comum a todos os alunos, oferecendo-lhes a oportunidade de vida em comum, característica da vida universitária. Em minha opinião, com a atual organização do ensino, nem a reunião de alunos e professôres na futura Cidade Universitária permitirá a realização dêsse objetivo, porque continuarão a faltar os interêsses espirituais congregadores.
Além dêsses fins comuns, a função da Universidade regional é servir ao meio em que se encontra. Ora, as condições de Minas não são as mesmas do Rio Grande do Sul ou de São Paulo. A estrutura social e econômica da comunidade paulista impõe deveres diversos à universidade da região e de seus estabelecimentos de ensina estão surgindo especialistas que correspondem às exigências do meio urbanizado e industrializado. Em Minas, a estrutura da comunidade solicita ação diferente da Universidade regional. Não se destina a U.M.G. a fomentar particularismos, nem regionalismos políticos, mas é de sua missão organizar e sistematizar conhecimentos precisos e extensos de todos os aspectos da vida em Minas Gerais. É também sadio e patriótico regionalismo o estudo das condições de progresso e de melhoria destinado a servir de guia para o planejamento da ação política e administrativa, já que entramos na fase do welfare State e necessitamos de dados básicos.
Dois exemplos bastarão para esclarecer êste ponto.
O problema do ensino em Minas Gerais. Êxodo rural e urbanização
Segundo dados do “Anuário Estatístico de Minas Gerais”, para 1950, é a seguinte a situação das cidades e vilas mineiras sem assistência: há 66 sedes municipais e 667 vilas sem médicos; 59 sedes e 589 vilas sem farmacêuticos formados e 187 sedes e 681 vilas sem odontólogos formados.
Esta situação alarmante deve ser conjugada com o mais importante dos fenômenos demográficos do país no momento: o êxodo rural. Segundo dados de PIERRE MONBEIG (“Le Brésil”, Presses Universitaires de France, 1954), entre 1940 e 1950, enquanto a população rural aumentava de 18%, a das cidades crescia de 49%. Quanto a Minas, sabe-se que a população rural decresceu de 13% em 10 anos, em benefício da população urbana e, em comunicado recente, a Comissão Nacional de Política Agrária informa, que 85% dos Municípios mineiros acuam a existência de êxodo rural e que 9% dos migrados declaram que vão “para a cidade”.
Quer dizer, Minas se urbaniza com rapidez, e, sob o aspecto que nos interessa, tende a agravar-se a situação da assistência no interior. Cabe à Universidade regional o estudo dêsse problema e o planejamento de sua solução. Sugeriríamos acaso a lição da Universidade de Pôrto Rico, cuja Faculdade de Medicina acolheu estudantes como bolsistas com uma condição especial – passar dois anos em uma localidade do interior da ilha. Hoje, 70% dos alunos são bolsistas da Universidade e a assistência médica às populações do interior está equacionada e em vias de ser resolvida.
Oportunidade para as mulheres
Outro exemplo de ação à espera de iniciativa é o da situação das mulheres na estrutura social mineira. No conjunto, a posição das mulheres é a seguinte: em 5.345.631 pessoas acima de 10 anos em Minas, 2.278.987 são mulheres ocupadas em atividades domésticas não remuneradas ou em atividades escolares discentes. Isto é, 43% do total da população acima de 10 anos são econômicamente improdutivos, o que constitui massa formidável de elementos humanos que uma campanha bem orientada pela Universidade regional poderá recuperar. Basta, para isso, comparar a situação análoga verificada na Rússia. Ali, ao tempo do czar, 80% das mulheres que trabalhavam eram empregadas em atividades domésticas. Em 1937, havia sòmente 1,8% de mulheres ocupadas em tal setor.
Prosseguindo na análise, apuraremos que, em Minas, em 1950, 36% dos homens com curso médio freqüentaram cursos superiores, enquanto que só 1,6% das mulheres nas mesmas condições ingressaram em cursos superiores, o que faz conjeturar que 57.000 mulheres mineiras aguardam que se lhes ofereça uma oportunidade para progredir. Na Rússia, para mantermos o mesmo símile, em 1940, as mulheres eram 43% dos alunos dos cursos superiores e 50% dos médios do país (TOWSTER, “Political power in the U.R.S.S.”, Oxford Univ. Press, 1948, págs. 330 e segs.).
Só aí encontraríamos grande campo de ação universitária, de caráter regional e decorrente de situações locais, cujo ataque e cuia superação constituiriam legítima política universitária.
Conhecimento do meio físico, social e econômico
Há, pois, problemas culturais regionais que devem ser equacionados pelas universidades locais as quais, por isso mesmo, podem diferir na organização, no tipo de ensino e na ênfase com que estudem mais um aspecto da vida das populações. Na estrutura jurídica, o federalismo procurou amoldar-se às diversidades regionais, fixando apenas princípios básicos, que as unidades federadas são obrigadas a respeitar, como mínimo de padronização.
Não há razão para transformar as universidades regionais federalizadas apenas em fábrica de diplomados. Cabe-lhes o papel de cultivar e desenvolver a personalidade dos jovens, dando-lhes o toque da terra. Não desejamos que se uniformizem os espíritos e as lições, como não aprovamos que, em tôdas as vendas de Minas, só se encontre a mesma e irreparável coca-cola.
A tarefa que nos compete, neste momento em que a U.M.G. completa a sua adaptação à nova forma, poderia ser resumida nos seguintes itens principais:
1. Conhecimento mais exato do meio físico, social e econômico. Há em Minas alguns trabalhos monográficos de vulto, que provocaram alterações sensíveis na política e na administração, mas são de fonte particular ou, pelo menos, de fora da Universidade. Durante o govêrno do honrado Sr. MÍLTON CAMPOS, por exemplo, foi levantada a situação real da população escolar quanto à sua dispersão pelo território, chegando-se à conclusão de que cêrca de 300.000 crianças mineiras, dada a localização de suas residências ao longo das estradas, estavam fora do alcance da ação do poder público. Esta verificação modificou os planos administrativos no setor.
Também o pesquisador infatigável que é SALOMÃO VASCONCELOS demonstrou que baianos já estavam em Minas antes de paulistas e que FERNÃO DIAS não foi enterrado em São Paulo.
Ora, estudos dessa natureza são da competência da U.M.G., que não se dispôs ainda a encetá-los, para descerrar o véu de desconhecimento que ainda rodeia Minas Gerais.
Preparação das elites
2. Preparação das elites para atuar nesse meio. Damos hoje aos jovens que freqüentam nossos institutos bom ensino de matérias especializadas. Mas não formamos a mentalidade dêsses maços para que possam atuar corretamente no meio, como líderes espirituais da população. Falta à U.M.G. a comunidade de interêsses. Cada instituto cultiva a sua especialidade, mas não dispõe de instrumentos para fazer do especialista de seus bancos um líder da sociedade.
Segundo pesquisas a que procedi no ano passado, 58% dos advogados do interior; 34% dos farmacêuticos; 32% dos médicos; 27% dos odontólogos, e 22% dos engenheiros são líderes da opinião pública do Estado, através das posições que ocupam nos diretórios políticos de todos os partidos. No entanto, a U.M.G. não os preparou para o exercício dessa forma essencial de liderança social, porque, prêsa à tendência legalística, não lhe ocorreu abrir aulas para a instrução moral e cívica e o preparo da liderança social. A importância dêsse problema já se fêz sentir nos Estados Unidos, onde 18 institutos de nível universitário já se afiliaram à Citizenship Clearing House da Universidade de New York, com o objetivo de preparar seus jovens alunos para mais consciente participação na vida pública.
Condições para a pesquisa
3. Estabelecimento de condições para a pesquisa. Se bem que não tenhamos as condições especiais encontradas pelo Professor MÁRIO WERNECK, diretor da Escola de Engenharia da U.M.G., em universidades americanas por êle recentemente visitadas, conforme consta de interes:ante relatório, a U.M.G. está promovendo e incentivando a pesquisa científica. Embora seja rotina geralmente aceita que o professor deve dar aulas, é tempo de mudar êsse conceito para permitir que o professor pesquise. Em Minas, quem pesquisa, tem de interromper o trabalho com freqüência, para atender aos horários e aos trabalhos escolares, havendo professôres com um número tal de aulas, que se transformam em pianolas, repetindo temas durante horas a fio, semanas a fio, anos a fio. Enquanto predominar êste estado de espírito, estaremos andando para trás. Tal mudança de atitude trará concomitantemente a dignificação do trabalho do professor, hoje uma espécie de pária da administração: para muita gente somos apenas os beneficiários do padrão e, para a administração, somos uns anormais, que devem ser vigiados com sentinela à vista.
Bôlsas de estudo
4. Criação de bôlsas para estudantes pobres bem dotados. Esta seria talvez a obra mais urgente e útil para dar à nossa Universidade o sentido da ação libertadora que deve exercer sôbre o meio. Nossa Universidade não cobra taxas. As despesas dos estudantes com o ensino são pràticamente sem importância. Mas, para viverem na capital enquanto estudam, os jovens necessitam de renda. Os que não podem auferi-la da família, procuram trabalho nas horas de folga. Os que trabalham e estudam são cada vez em maior número e os prejuízos para a cultura, que essa situação acarreta, são realmente sérios. Depois de 6 ou 8 horas de trabalho, não há moço ou moça que possa enfrentar proveitosamente o preparo das lições.
Além disso, aquêles jovens bem dotados que não conseguem meios para se manterem na capital constituem uma legião de soldados perdidos para a batalha da cultura.
É indispensável, por isso, a nosso ver, coroar a obra universitária de caráter regional com a instituição do sistema de bôlsas, que não existe ainda entre nós, país de pobreza franciscana que insiste Em comportar-se como terra de milionários.
Informações de 1948, esclarecem-nos que 68% de todos os estudantes universitários da Grã-Bretanha recebem bôlsas. Em Oxford e Cambridge, tais auxílios atingem 82% dos estudantes. E’ verdade que não há mais quase nenhum rico naquele país, tendo diminuído de 19.000, em 1939, para 900, o número de pessoas que ficam com mais de £ 4.000 (Cr$ 240.000,00), depois de pagos todos os impostos, embora sejam 26.000.000 os contribuintes do impôsto sôbre a renda. Há motivos para a solicitude do Estado inglês.
Entre nós, não haverá menor razão. Se, em 1952, 14.967 pessoas declararam renda superior a Cr$ 300.000,00, não temos mais de 250.000 contribuintes do Impôsto sôbre a renda. Por outro lado e abrindo a porta para o lado escuro da lua, há cêrca de 12.000.000 de trabalhadores na agricultura e na indústria, cujo rendimento não atinge o limite tributável e cujos filhos não conseguem libertar-se da necessidade, ainda quando bem dotados, por deficiência econômica de que não são responsáveis.
Nesta direção, a ação universitária regional tem um mundo a percorrer.
Orlando M. Carvalho, vice-reitor da Universidade de Minas Gerais.
________
Notas:
* N. da R.: Palestra realizada na Faculdade de Odontologia e Farmácia da Universidade de Minas Gerais.
LEIA TAMBÉM O PRIMEIRO VOLUME DA REVISTA FORENSE
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 1
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 2
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 3
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 4
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 5
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 6
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