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Despedida indireta — Indenizações cabíveis

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REVISTA FORENSE 154

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18/10/2022

REVISTA FORENSE – VOLUME 154
JULHO-AGOSTO DE 1954
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto,

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Sobre o autor

Henrique Stodieck, professor da Faculdade de Direito de Santa Catarina e juiz do trabalho.

NOTAS E COMENTÁRIOS

Despedida indireta — Indenizações cabíveis

* Sustento aqui, como o venho fazendo há tempos em decisões da Junta de Conciliação e Julgamento de Florianópolis, que os efeitos legais da despedida indireta, são idênticos aos da despedida direta.

Indenização por tempo de serviço e aviso prévio

Quanto à indenização por tempo de serviço, não há dúvida. Esta sòmente surge quando se trata do aviso prévio. De fato, a jurisprudência do egrégio Tribunal Superior do Trabalho, absolutamente pacífica, é no sentido de que não cabe pagamento do aviso prévio quando o empregado considera rescindido o contrato de trabalho. Para ilustrar esta afirmação, cito apenas uma das muitas decisões dessa colenda Côrte:

“Tratando-se de despedida indireta, não cabe pagamento de aviso prévio” (proc. TST-4.452-50, citado por B. CALHEIROS BONFIM, em “Dicionário de “Decisões Trabalhistas”, pág. 64).

Essa orientação não me parece acertada, pelos fundamentos que se seguem. A lei é clara, não dando margem para a interpretação que está sendo adotada pela jurisprudência referida. Na verdade, não só o artigo da Consolidação das Leis do Trabalho comentado pelo Prof. MOZART

VÍTOR RUSSOMANO, como em seguida veremos, é de meridiana clareza, como ainda outro artigo da Consolidação é suficientemente preciso. A argumentação de RUSSOMANO é a seguinte, extraída de sua obra, “O Empregado e o Empregador no Direito Brasileiro”, vol. 2º, pág. 92:

“É exato que o aviso prévio é devido por quem delibera a rescisão do contrato. O que não é exato é que, nas despedidas indiretas, seja o empregado quem rescinde o contrato. Êste apenas considera rescindido o contrato. São essas as palavras da lei (art. 483). O empregado apenas declara, proclama, veicula a rescisão do pacto. Quem, de fato, o rescindiu não foi o empregado, foi o empregador, ao cometer um dos atos consignados nas alíneas daquele artigo da lei. “Tanto é assim que, na alínea d do artigo 483, é considerada despedida indireta o não-cumbrimento, pelo patrão, das obrigações do contrato. Aí se vê que o contrato foi violado pelo patrão. O empregado apenas declara o contrato rescindido e vai pleitear as indenizações que lhe são devidas”.

O outro dispositivo da Consolidação das Leis do Trabalho que merece nossa atenção é o art. 487: “Não havendo prazo estipulado, a parte que, sem justo motivo, quiser rescindir o contrato, deverá avisar a outra da sua resolução, com a antecedência mínima de…”

Ora, querer rescindir, parece evidente, é expressão que tanto se aplica a quem se declara de forma expressa como quem se manifesta de maneira tácita ou velada. Assim, quem quer rescindir o contrato, pode dizê-lo aberta e francamente, mas pode fazê-lo também indiretamente, bastando, para tanto, praticar ato previsto nas hipóteses do art. 483.

A vontade, e isto é sabido, pode ser manifestada ostensivamente ou de forma disfarçada através de outros atos, ou, enfim, de maneira apenas tácita. Porque, então, em Direito do Trabalho, há de se fazer distinção quanto às modalidades da parte manifestar a sua intenção de rescindir o contrato? A lei não prescreve forma taxativa. Portanto, de qualquer maneira pode-se querer rescindir o contrato de trabalho.

A manifestação da vontade pode, como bem o salienta PAUL DURAND (“Traité de Droit du Travail”, tomo II, 1950, págs. 841-842), fundado na jurisprudência francesa, “resulter d’une simple attitude“. E mais adiante: “C’est ainsi que la modification des conditions du travail imposée par l’employeur, la grève, et même la simple menace de grève, de la parte des salariés, ont pu être considérées comme manifestant la volonté de romprele contrat. Des difficultés pourront seulement se présenter pour établir une volonté tacite“.

Trata-se, portanto, apenas, de uma questão de prova, mas não de princípio. No direito italiano igualmente se encontra refôrço à tese ora sustentada. O artigo 2.119 do Cód. Civil, na parte final do primeiro parágrafo, combinado com o segundo parágrafo do art. 2.118, expressamente determina o cabimento do aviso prévio, como indenização, nos casos em que, por justa causa, o empregado se retira do emprêgo:

Se il contratto è a tempo indeterminato, al prestatore di lavoro che recede per giusta causa compete l’indennità indicata nel secondo comma dell’articolo precedente“.

Até aqui foi objeto de apreciação a lei, sob um ponto de vista apenas jurídico, no sentido restrito. Não se pode, no entanto, deixar de julgá-la em face da moral, pois êste critério deve também ser levado em conta na boa hermenêutica. Aliás, é a própria Consolidação das Leis do Trabalho, no seu art. 9º, que considera nulos os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos da Consolidação. CARLOS MAXIMILIANO, em “Hermenêutica e Aplicação do Direito”, págs. 190-201, da 3ª edição, trata da necessidade de se interpretar a Lei diante da Moral, afirmando:

“Em resumo: não pode haver Direito contra a Moral, embora nem todos os ditames desta encontrem sanção nos Códigos. Por isso, leis positivas, usos, costumes e atos jurídicos interpretam-se de acôrdo com a ética; exegese contrária a esta jamais prevalecerá.

“Cumpre dilatar ou restringir o sentido do texto, a fim de que êste não contravenha os princípios da Moral”.

Ora, o empregador, na prática de ato que obrigue o empregado a considerar-se despedido, age com inobservância da lei ou do contrato, e está desvirtuando ou fraudando a Consolidação. Admitir que, em tais hipóteses, o empregador fique livre da obrigação do aviso prévio é, evidentemente, interpretar a lei de maneira a premiar o desonesto e o violador do Direito.

Natureza jurídica do aviso prévio

Agora se impõe o exame de outro aspecto, a fim de caracterizar uma facêta da natureza jurídica do aviso prévio, muito embora não altere a interpretação prática dos textos legais até aqui citados.

Quero referir-me à expressão indenização, usada nela lei italiana, como se verifica também do segundo parágrafo do artigo 2.118 do Cód. Civil:

In mancanza di preavviso, il recedente è tenuto verso l’altra parte a un’indennità equivalente all’importo della retribuzione che sarebbe spettata per il periodo di preavviso“.

Tal caracterização do aviso prévio como indenização, no caso de não ter sido dado em lapso de tempo, não corresponde à que deriva da redação da nossa lei, bem como diverge da que sustenta o Prof. RUSSOMANO, com quem até aqui vínhamos concordando.

A lei pátria, art. 487, § 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho, assim é redigida:

“A falta do aviso prévio por parte da empregador dá ao empregado o direito aos salários correspondentes ao prazo do aviso, garantida, sempre, a integração dêsse período no seu tempo de serviço”.

O tratadista a que nos referimos, na mesma obra e volume, na pág. 83, do seguinte modo se expressa:

“Quando o aviso, como veremos, não é pago em tempo, mas em dinheiro, o que é possível em face da lei em vigor, mesmo assim tampouco se trata de indenização por falta de aviso. Aí, êsse pagamento corresponde ao salário devido ao trabalhador na exata proporção do tempo do aviso prévio que não foi dado. O aviso, pago em dinheiro, tampouco visa a indenizar: êle é, na hipótese, um autêntico salário”.

Neste ponto, é de se divergir do ilustrado e culto autor transcrito. A lei brasileira citada também não está redigida em linguagem inatacável. Igualmente a lei francesa, Cód. do Trabalho, em uma alínea do art. 29, m, se refere ao aviso prévio em têrmos semelhantes à brasileira:

En cas d’inobservation du délai-congé: à titre de salaire le montant“, etc…

Embora PAUL DURAND não se reporte claramente a êsse texto legal, não me parece possível discordar de sua crítica, contida na obra citada, pág. 898:

L’indemnité de délai-congé ne constitue pas pour lé travailleur un salaire, puisqu’il ne remunère pas un travail effectif…”

Precisamente porque não corresponde a pagamento de trabalho realizado, é que o pagamento de aviso prévio não concedido não é salário, mas indenização. No mesmo sentido se manifestam outros destacados tratadistas, ao se referirem ao aviso prévio, que classificam como indenização: CESARINO JÚNIOR, em “Direito Social Brasileiro”, vol. 2º, pág. 185; ERNESTO KROTOSCHIM, “Instituciones de Derecho del Trabajo”, vol. 1º, pág. 422; LUIGI DE LITALA, “El Contrato de Trabajo”, pág. 298; LUÍZA RIVA SANSEVERINO, no “Commentario del Codice Civile – Libro Quinto”, também fala em indenização.

Dir-se-á, talvez, que, em face do disposto no § 1º do art. 478 da Consolidação das Leis do Trabalho, e se admitirmos o aviso prévio como indenização, o mesmo não caberá no primeiro ano de vigência do contrato de trabalho. Tal argumentação, porém, não tem procedência diante da matéria regulada no art. 478, a que se prende aquêle parágrafo. O artigo só se refere à indenização por tempo de serviço, e, portanto, o parágrafo sòmente nega o direito a êsse tipo de indenização no primeiro ano, mas, em absoluto, nada pode dizer quanto a outras indenizações. Como, por exemplo, não nega nem poderia negá-lo, o direito à indenização por acidente ocorrido no primeiro ano de trabalho.

Em fce do exposto, e como conclusão, entendo que nas despedidas indiretas assiste ao empregado o direito não só à indenização por tempo de serviço, se tiver trabalhado por mais de um ano, como também, e sempre, a uma indenização equivalente ao aviso prévio a que teria direito se fôsse despedido diretamente.

Henrique Stodieck, professor da Faculdade de Direito de Santa Catarina e juiz do trabalho.

____________________

Notas:

* N. da R.: Tese apresentada ao 1º Congresso Internacional de Direito Social, em São Paulo, em agôsto de 1954.

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