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CIVIL

CLÁSSICOS FORENSE

REVISTA FORENSE

Depósito bancário – Conta conjunta – Doação entre cônjuges casados com separação de bens

CONTA BANCÁRIA

CONTA CONJUNTA

CONTA CORRENTE

DEPÓSITO BANCÁRIO

REVISTA FORENSE

REVISTA FORENSE 147

Revista Forense

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26/01/2022

REVISTA FORENSE – VOLUME 147
MAIO-JUNHO DE 1953
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto

Abreviaturas e siglas usadas
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CRÔNICA

DOUTRINA

PARECERES

NOTAS E COMENTÁRIOS

  • A uniformidade da legislação relativa à cooperação internacional no direito processual – Relatório da Comissão Jurídica Interamericana – George H. Owen; Osvaldo Vial; José Joaquín Caicedo Castilla; Francisco A Ursúa; Francisco Campos; Mariano Ibarico
  • Constituinte, Constituição, leis constitucionais – Inconstitucionalidade de leis e atos – A. Machado Paupério
  • Responsabilidade civil dos preponentes pela atuação de seus prepostos – Paulo Carneiro Maia
  • A nota promissória como instrumento da fraude – Wagner Barreira
  • Locação comercial – Pedro de Buone
  • Da representação do menor sob pátrio poder – Abelardo Barreto do Rosário
  • Direito ao sossêgo – Oscar de Aragão

BIBLIOGRAFIA

JURISPRUDÊNCIA

  • Jurisprudência Civil e Comercial
  • Jurisprudência Criminal
  • Jurisprudência do Trabalho

LEGISLAÇÃO

Sobre o autor

Arnoldo Medeiros da Fonseca, professor da Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil.

PARECERES

Depósito bancário – Conta conjunta – Doação entre cônjuges casados com separação de bens

– É lícita a abertura de conta conjunta, em banco, tanto para depósito de dinheiro como de títulos, ou para fins de guarda e administração.

– Interpretação dos arts. 1.168 e 1.174 do Cód. Civil.

PARECER

Ao falecer E. C., deixou êste apenas à sua espôsa, Dª M. C., com quem fôra casado sob o regime da completa separação de bens, por disposições testamentárias, uma chácara e um apartamento que possuía, situados respectivamente na cidade de e na Capital Federal, e ações nominativas de companhia, referidos nas cláusulas primeira, segunda e terceira de seu testamento. Os remanescentes da herança foram deixados aos seus sobrinhos, só se fazendo referência especial no mesmo testamento às ações da companhia X, legadas a sobrinhos varões, filhos legítimos de seus irmãos, ou aos filhos legítimos dêsses mesmos sobrinhos.

Não houve qualquer alusão a títulos ao portador que possuísse o de cujus e estivessem depositados em banco, do Rio de Janeiro.

Informa, entretanto, a consulente, Dª M. C., que a certo banco haviam sido, efetivamente, confiados, para guarda e recebimento de juros, alguns títulos ao portador, em virtude de depósito conjunto, ou melhor em conta conjunta, que nêle fôra feito em nome dela e de seu marido, com a estipulação expressa de que qualquer dêles poderia retirá-los, escrita pelo próprio punho do segundo, tratando-se, na verdade, de uma doação que êste assim lhe fizera em vida, sob condição resolutória de que ficaria sem efeito se a donatária falecesse antes dêle.

Em tais condições, tendo falecido seu marido e não se verificando, desta forma, a condição resolutória da doação que lhe fôra feita, considerou-se a consulente, como proprietária dos títulos, coze direito de retirá-los do banco, sem que encontrasse qualquer oposição ou dúvida da parte dêste, a quem deu plena e rasa quitação, conforme documento então firmado.

Constando-lhe, entretanto, haverem surgido dúvidas por parte dos herdeiros instituídos do finado quanto ao seu direito a todos os títulos que retirou do Banco, quer a consulente esclarecer-se por meio da presente consulta, indagando:

1º) Podia ela retirar do banco referido os títulos nêle depositados, como fêz?

2º) Procedem as dúvidas que lhe consta haverem sido levantadas pelos herdeiros quanto ao seu direito à totalidade dos mesmos títulos?

3º) É aconselhável qualquer providência para acautelar ou fazer reconhecer o seu direito?

A resposta aos quesitos formulados envolve a apreciação prévia das três questões seguintes: natureza das relações jurídicas que se estabeleceram com o banco depositário dos títulos; validade jurídica da doação feita à consulente; necessidade ou conveniência de providências judiciais para acautelar ou fazer reconhecer os direitos dela decorrentes.

I Possibilidade legal de conta conjunta

Em nosso direito, não se contesta a possibilidade legal de serem abertas nos bancos contas conjuntas de depósito de dinheiro, ou depósito de títulos de crédito ao portador, para fins de guarda e administração.

Na verdade, os depósitos bancários revestem, no direito moderno, formas variadas, como observam os mais recentes comentadores do Cód. Civil italiano, de 1942, no qual foi unificado o direito privado, em obra publicada sob a direção de MARIANO D’AMELIO, já falecido, e ENRICO FINZI.

Eis as próprias palavras de SÉRGIO BOTGIA, autor dos comentários relativos aos contratos bancários:

Secondo la dottrina oggi dominante, il deposito bancario puó assumere forme diverse, che, su diversi criteri, vengono diversamente classificate. Tra tali classificazioni predomina quella di: depositi a uso e depositi a custodia”.

E acrescenta:

I depoiti a custodia vengono di solito distinti in depositi bancari chiusied in depositi bancari aperti, con riferimento alla circostanza che la consegna delle cose alla banca avvenga in cassa, piego, pacco suggelató, oppure senza impiego di tali mezzi o alla rinfusa. Alla seconda sottospecie qui indicata viene attribuito il cosidetto deposito in amministrazione o a dossier, in forma del quale la banca oltre che la custodia, assume l’incarico di svolgere una speciale attività nell’interesse del depositante” (“Codice Civile”, “Obligazione”, comentário a cura de E. BRUNORI, F. CARESI, S. BOTGIA, etc., vol. II, parte II, págs. 108 e 109).

Quanto à possibilidade de ser a conta conjunta, isto é, aberta por duas pessoas, podendo qualquer delas movimentá-la, é grandemente elucidativa a lição insuspeita e autorizada do saudoso CARVALHO DE MENDONÇA (J.X.).

Escreveu o eminente comercialista:

“Em matéria comercial, a única vantagem da solidariedade ativa é nas contas conjuntas, isto é, nas contas de depósito, dinheiro ou títulos, abertas por bancos conjuntamente a duas ou mais pessoas, com a estipulação expressa e essencial de que cada um dos titulares pode dispor á sua vontade, no todo ou em parte, das somas ou valores levados a crédito, ficando os banqueiros vàlidamente liberados para com os depositantes pelos pagamentos feitos” (“Direito Comercial”, vol. 6, parte I, n° 265, pág. 263).

Em nota observou:

“Certo é que cada um dos titulares pode isoladamente retirar integral ou parcialmente as quantias ou valores depositados no banco, determinar a aplicação que bem lhe convenha, ordenar a venda, de títulos e compra de novos, pedir adiantamento sôbre os títulos, emitir cheques, efetuar remessas, em suma, promover a função da conta como seu único titular. As operações por êle efetuadas ou determinadas exoneram o banqueiro, tanto relativamente aos co-titulares como aos herdeiros dos que pré-morrerem” (ob. e vol. cits., nota 2, página 263).

E, mais adiante, esclarece:

Morrendo, portanto, um dos credores solidários, depositante do dinheiro em conta-corrente, os sobreviventes podem retirar os fundos disponíveis

Em todos êstes casos, a responsabilidade do banco está a salvo, porque os outros credores conservam intatos os seus direitos (CLÓVIS, comentário ao art. 901 do Cód. Civil, vol. 4º, 2ª ed., pág. 52). O banco pagando a um, ainda depois da morte do outro, fica com a sua dívida extinta (Cód. Civil, art. 900).

O banco nada tem a ver com o regresso direto ou imediato dos co-credores ou seus herdeiros para com aquêle que recebeu a dívida.

As relações de mandato, demissão, de sociedade ou quaisquer outras que existam entre os co-credores, nenhuma influência exercem quanto ao devedor.

Não há dúvida que a convenção pode oferecer perigo aos credores. É indispensável grande confiança recíproca entre êles, por isso, de ordinário, sòmente se prática entre marido e mulher, se também esta confiança existe em alto grau.

“Os depositantes, que assim ajustam, devem conhecer os perigos a que se expõem nas relações entre êles próprios” (“Tratado”, vol. e nota cits., pág. 265).

Voltando, noutro volume de seu “Tratado”, a ocupar-se do assunto e referindo-se, especialmente, às contas conjuntas entre marido e mulher, acentuou mais:

“Marido e mulher podem estabelecer no banco a conta-corrente conjunta, com a faculdade de cada um, separada e independentemente do outro, depositar e levantar somas, por meio de cheques ou ordens. É medida de previdência para que, no caso de moléstia do marido, a administração dos bens do casal continue sem dificuldades ou embaraços ou, no caso de falecimento repentino, disponha o sobrevivente dos recursos indispensáveis para os primeiros momentos de tão triste eventualidade” (“Tratado”, vol. 6, parte III, nº 1.446, pág. 173).

Se, prém, o casamento, como sucedeu na hipótese da consulta, houver sido celebrado sob o regime da completa separação de bens, já a abertura da conta conjunta pelos cônjuges, sobretudo para depósito de títulos ao portador, há de ter, lógica e racionalmente, explicação diferente, pois, em regra, não há bens comuns, pertencendo os mesmos individualmente a um ou outro dos esposos. A natureza das relações jurídicas entre êles estabelecidas é, portanto, nesse caso, matéria que exige explicação diferente, sobretudo tratando-se, como se acentuou, de depósitos de títulos ao portador, como adiante se verá.

De qualquer modo, porém, não há dúvida que a consulente podia, em face da situação jurídica existente, retirar, como fêz, os títulos depositado, apesar do falecimento de seu marido, havendo assim e banco se exonerado legalmente das obrigações que assumira.

II  Depósito Conjunto

Informa a consulente, quanto ao segundo ponto a esclarecer, que o que teria havido com o depósito conjunto de títulos ao portador efetuado por seu marido nos nomes dêle e dela, podendo assim qualquer dêles retirar os bens depositados e receber os respectivos rendimentos, seria uma doação, que assim lhe fôra feita, embora subordinada à condição resolutória, que não se verificou, de pré-morrer a seu espôso.

Ora, essa condição não era injurídica, nem invalidava o ato, em face do disposto no art. 1.174 do Cód. Civil, que expressamente a admite, nas doações.

Comefeito, apesar das dúvidas que a respeito, às vêzes, infundadamente, se suscitam, essa modalidade de doação é perfeitamente válida em nosso direito, sòmente se vedando a doação mortis causa realizada sob condição suspensiva, e, assim mesmo, com ressalva das feitas entre cônjuges, nos pactos antenupciais (Cód. Civil, art. 314).

A dúvida sôbre a validade de tais doações provém, em grande parte, do que se entende por doações morda causa, manifestando-se o dissídio a êsse respeito entre os próprios romanistas.

Assim, afirma MAYNZ que doações mortis causa no direito romano eram apenas aquelas que não deviam surtir seus efeitos senão depois da morte do doador e no caso que o donatário não morresse antes dêle. O que, na sua opinião, caracterizaria a doação mortis causa e a distinguiria das doações ordinárias, seria que, na intenção do doador, a eficácia da liberalidade, que pretendia fazer, dependeria da condição de que êle não sobrevivesse ao donatário. A doação mortis causa suporia, assim, a seu ver, essencialmente: 1º, que o doador quisesse fazer uma liberalidade tendo o caráter de uma doação, isto é, tendo por efeito um deslocamento patrimonial; 2º, que êsse efeito fôsse subordinado à morte dele, doador, de modo que não produzisse o ato tal conseqüência enquanto não verificada a condição de não haver o donatário morrido antes dêle. O característico essencial estaria, pois, na intenção do doador de que a eficácia da liberalidade ficasse subordinada à condição suspensiva de que êle não sobrevivesse ao donatário (CHARLES MAYNZ, “Cours de Droit Romain”, 4ª ed., t. III, § 450, págs. 705-707).

Já GIRARD sustenta, diversamente, que, sendo as doações mortis causa as realizadas tendo-se em vista a morte do doador antes do donatário, todavia essa condição, a que ficaria subordinada, tanto poderia ser suspensiva como resolutória. Suspensiva quando a liberalidade ficasse retardada até a morte do doador, por exemplo, em determinado evento perigoso. As mais das vezes, porém, quando a doação dependesse da morte do doador, a condição interviria simplesmente como condição resolutória, produzindo-se, desde logo, o efeito querido, mas devendo resolver-se no caso de predecesso do donatário, ou de mudança de resolução do doador (PAUL GIRARD, “Manuel Elémentaire de Droit Romain”, 4ª ed., págs. 944-945).

Modernamente, autorizados autores, como ENNECCERUS, em face do direito germânico, consideram também doações mortis causa não só as feitas para depois da morte do doador, mas também as que dependem de que o donatário lhe sobreviva. Afirma-se, assim, que a condição pode ser suspensiva ou resolutória. No primeiro caso, a doação só terá efeito por ocasião da morte do doador, se o donatário lhe sobrevive; no segundo caso, tem efeito imediato, mas resolve-se se o donatário morre antes do doador. Assim, em face do Cód. Civil alemão, se a doação se tiver executado, embora subordinada à condição resolutória de pré-morrer o donatário, aplicam-se-lhe as regras da doação entre vivos (L. ENNECCERUS, “Tratado de Derecho Civil”, “Derecho de Obligaciones”, t. II, vol. II, trad. da 35ª ed. alemã, pág. 113).

Êsse foi também o sistema adotado em nosso Cód. Civil. Ou porque não considerasse mortis causa a doação que se resolve no caso de sobreviver o doador ao donatário, ou porque a quisesse admitir, na hipótese de ser realizada sob essa condição resolutiva, o fato é que o art. 1.174 do nosso Código é peremptório, admitindo a cláusula de reversão; e, mesmo quanto às doações mortis causa pròpriamente ditas, realizadas para produzirem efeitos apenas depois da morte do doador, excepcionalmente as admite entre cônjuges, referindo-se expressamente ao caso de serem estipuladas em pactos antenupciais (Cód. Civil, art. 314).

É de notar, aliás, que, no próprio direito francês, onde as doações mortis causa pròpriamente ditas, isto é, subordinadas à condição suspensiva, não são admitidas, referindo-se à doação manual sob condição resolutiva, escrevem PLANIOL & RIPERT:

“Le don manuel peut être affecté d’une condition résolutoire comme une donation ordinaire et dans la mesure où les donations peuvent être affectées d’une condition (infra n° 427). Des difficultés ont cependant été soulevées à propos de la condition résoluteire de survie: on s’est demandé s’il ne s’agissait pás d’une donation pour cause de mort, nulle par conséquent. Tout dépend des circonstances de la cause qui permettent de savoir si le donataire a entendu ou non se dépouiller actuellement et irrévocublement” (“Traité pratique de droit civil”, t. V, nº 403).

Esclarecido êsse ponto, o que resta, portanto, é apenas apurar se, na hipótese, há elementos convenientes da existência da doação alegada.

Não se pode desconhecer que a doação é, em regra, no nosso direito, um contrato formal, devendo, por isso, constar de escritura pública ou de instrumento particular.

Todavia, não se nega validade à doação verbal se, versando sôbre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir in continenti a tradição (Cód. Civil, art. 1.168 e parág. único).

Na interpretação dêsse preceito, escreve CARVALHO SANTOS, reproduzindo doutrina assentada:

Cogita-se aí, neste passo, das doações manuais, de uso freqüente na vida social.

São essenciais para a validade das doações verbais ou manuais: a) que tenham por objeto bens móveis; b) de pequeno valor; c) se lhe seguir in continenti a tradição.

O Código exige, em primeiro lugar, como se vê, que a doação seja de bens móveis, sujeitos à tradição real. Vale dizer, em princípio, exige que êsses bens sejam móveis corpóreos.

Os títulos ao portador são, por sua natureza, equiparados, neste particular, aos móveis corpóreos, podendo, por isso mesmo, ser objeto de doações manuais.

“A razã é óbvia: …no título ao portador, o crédito torna-se absolutamente impessoal e a qualidade de credor acha-se vinculada à posse do título. Quem quer que o possua pode exercitar o direito por êle documentado, de modo que a tradição do título torna-se sinal legal da transmissão do direito (cf. BAUDRY-COLIN, ob. cit., nº 1.186; LAURENT, ob. cit., vol. 12, nº 231; DEMOLOMBE, ob. cit., nº 69; AUBRY ET RAU, ob. cit., vol. 7, § 659) (“Código Civil Brasileiro Interpretado”, vol. 16, pág. 347).

Quanto ao requisito de serem os bens doados de pequena importância, adverte o preclaro comentador com tôda a procedência:

“O valor da coisa deve, sem dúvida, ser encarado em face das posses do doador. Uma doação de bens de valor de 10:000$000 pode ser havida como de pequeno valor não sòmente quando o doador é muito rico, senão também quando possui rendimentos que lhe permitam fazer essa doação, sem menor sacrifício.

“A pessoa do donatário deve também ser levada em consideração, para se apurar se a doação foi de bens de pequeno valor. Não, porém, quanto aos seus haveres, que nada podem influir no caso. A pessoa do donatário, a nosso ver, deve ser encarada, na espécie, apenas em face das relações de amizade com o doador, ou melhor, como razão justificativa da própria doação que lhe faz o doador. O que se precisa apurar, em suma, é se a amizade, a gratidão ou o afeto que o doador dedica ao donatário justifica, ou não, a doação que fêz” (ob. e vol. cits., págs. 349-350).

Essa é também a tendência vencedora no direito italiano, nesse ponto semelhante ao nosso, em face do novo Código de 1942, no qual se prescreve expressamente (artigo 783):

“La donazione di modico valore che ha per oggetto beni mobili è valida anche se manca l’atto pubblico, purchè vi sia stata la tradizione.

La modicità deve essere valutata anche in rapporto alle condizione economiche del donante”.

Tal dispositivo é assim comentado por D. R. PERETTIGIVA:

Si è codificata la prassi giurisprudenziali di escludere la necessità dell’atto pubblico per le donazioni di mobile di valore modesto esigendosi però la condizione della tradizione. Il criterio della modicità é necessariamente elastico, ma ciò non deve preoccupare, finchè ci si affida al prudente arbitrio del giudice e perchè è stabilito che essa deve determinarsi con riguardo alle condizione economiche del donante, senza che possa influíre la posizione economica del donatario (R. G.)” (“Il nuovo Codice dell’Udienza Civile”, Turim, 1943, pág. 164, nota 3).

Exige-se, finalmente, para a validade da doação verbal, que haja a tradição da coisa doada ao donatário, único requisito, aliás, que se estabelece para sua eficácia no direito francês, onde não há limite de valor, desde que se trate de coisas móveis ou títulos ao portador a elas equiparados (v. PLANIOL & RIPERT, “Traité Pratique de Droit Civil”, t. V, números 378, 380 e 381; AUBRY & RAU, “Cours de Droit Civil Français”, 5ª edição, t. X, § 659, págs. 576 e 583; BEUDANT, “Cours de Droit Français”, t. VI, ns. 231 e 232; BAUDRY-LACANTINERIE & COLIN, “Trattato de Diritto Civile”, “Delle donazioni fra vivi e dei testamenti”, trad. italiana da 3ª ed. francesa, vol. I, ns. 1.159 e 1.160).

Observa BEUDANT que isso se explica porque as coisas que dela são objeto “… sont, en effet, celles pour lesquelles la possession forme un titre de propriétá, celles auxquelles l’art. 2.279 est applicable” (ob. e vol. cits., nº 234).

Aliás, a exigência de forma externa especial é também lá dispensada nas doações indiretas, que são aquelas que se realizam por atos ostensivos, não dissimulados, que não têm tal finalidade específica, mas de modo implícito envolvem liberalidades (BEUDANT, ob. e vol. cits., ns. 223 e 228; PLANIOL & RIPERT, ob. e vol. Cits., ns. 377 e 410; BAUDRY & COLIN, ob. e vol. cits., ns. 1.132 e 1.222).

E a respeito é de mencionar o que se decidiu relativamente à doação de títulos de bôlsa, que se encontravam em poder de um banco, hipótese que interessa particularmente à elucidação do caso da consulta.

Eis a síntese dos julgados proferidos:

Une donation de titres de bourse peut avoir lieu en donnant l’ordre au banquier dépositaire des titres de les transférer de son comete au comete du donataire dans le même établissement; il n’est pas besoin d’acte notarié (Sir,; 1946, 1,55). Rennes, 9 mai 1946 (Sir., 1947, 2, 83; D., 1947, 55; J. C. P., 47, II, 3.922)” (suplemento permanente ao “Tratado” de AUBRY & RAU, dirigido por PAUL ESMEIN, ficha aditiva nº 3, de 1948, ao § 659 do t. X, texto e nota 27).

Além disso, quanto a uma alegação feita no sentido da validade de uma doação de certa importância em dinheiro, realizada sob a forma, de transferência de crédito bancário, sob fundamento de se tratar de ato equivalente à tradição, exigida para eficácia das doações manuais, esclareceu-se:

Il n’est pas besoin de faire cette assimilation à un don manuel, puisque les donations indirectes sont dispensées des formes notariées“.

face do nosso direito, entretanto, essa questão se simplifica, pois a tradição, exibida como modo para aquisição da propriedade sôbre coisas móveis (Cód. Civil, art. 620), pode ser substituída pela cessão do direito à sua restituição (art. 621). Há texto expresso a respeito.

Além disso, na hipótese exposta na consulta, afigura-se-me inequívoca a significação do ato, praticado em vida pelo finado marido da consulente, com ela casado sob regime da completa separação de bens, quando depositou, em conta conjunta com ela, aberta no banco, os títulos ao portador que expressamente a autorizou a retirar a qualquer momento e que, na sua posse, que assim legitimamente obteve, se presumem de sua propriedade, em face do disposto no art. 1.505 do Cód. Civil.

Verificou-se, assim, na realidade, uma doação indireta, de acôrdo com a terminologia adotada pela doutrina francesa, ou, se se preferir apoiá-la em texto expresso do nosso direito – o art. 1.168, parágrafo único, do Cód. Civil, – uma doação verbal, pois a tradição entre nós, como atrás foi observado, pede ser substituída pela cessão ou concessão do direito à restituição da coisa, cessão esta implícita na faculdade que seu marido atribuiu à consulente de retirar livremente os títulos depositados no banco, para guarda e recebimento de juros, ato que univocamente revela a sua intenção e os seus propósitos.

Nem se pretenda, no caso, excluída a doação verbal, que os franceses preferem chamar doação manual, pelo valor dos títulos ao portador depositados no banco, pois êsse valor era moderadíssimo e reduzido, tendo-se em vista o montante da fortuna do doador e o afeto e dever de assistência que o ligavam à sua espôsa a donatária, com êle casada sob regime da completa separação de bens, circunstâncias a que não é possível deixar de atender na hipótese, devendo observar-se que, a não ser assim, teria o devedor feito disposição diversa em seu testamento, que, ao contrário, não fêz nenhuma alusão a tais títulos.

A declaração da consulente relativamente à condição resolutiva, não verificada, a que teria ficado subordinada a doação que lhe foi feita, resulta também implicitamente das circunstâncias em que a mesma se realizou, não tendo o ato outra explicação razoável. A sua afirmação, portanto, é de considerar-se comprovada por fortes indícios, a que o Cód. de Proc. Civil manda atender, tendo-se em vista a natureza do negócio, a reputação dos indiciados e a verossimilhança dos fatos alegados (art. 253).

Tendo os títulos doados sido entregues à consulente em conseqüência de um ato praticado por seu marido, cuja explicação natural só pode ser a apresentada, aos herdeiros do doador é que caberá o ônus da prova contrária, se pretenderem contestar o seu direito aos mesmos títulos.

Efetivamente, mesmo na doutrina e na jurisprudência, francesas, onde se tem, por vêzes, admitido, em casos delicados e duvidosos, para contestação da existência da doação manual, a prova, pelos herdeiros do doador, de vícios da posse obtida pelo suposto donatário, como suficiente para impor ao mesmo o ônus de contrariá-la, ensinam a respeito PLANIOL & RIPERT:

Le possesseur étant présumé propriétaire, il y a deux moyen de faire tomber cette présomption; un moyen direct, prouver le détournement; un moyen indirect, prouver qu’à raison des circonstances, par des présomptions contraires, que la présomption de propriété ne peut recevoir application. Dans lés deux cas le donataire aura la charge de prouver la réalité du don manuel” (“Traité Pratique de Droit Civil”, t. V, pág. 408).

Outros tratadistas, porém, são menos condescendentes. Assim, AUBRY & RAU peremptòriamente afirmam:

“… si le possesseur d’une chose mobilière prétendait qu’elle lui a été remise à titre de don manuel, le propriétaire ou ses hérìtiers seraient cependant admis à en réclamer la restitution, soit en prouvant, selon le droit commun de l’article 1.348, qu’il ne la detient qu’en vertu d’une convention qui l’oblige à la restituer, d’un dépôt, d’un mandat, par exemple, soit, à plus forte raison, qu’il se l’est indument appropriée” (“Cours de Droit Civil”, 5ª ed., t. 10, § 659, págs. 578-579).

No mesmo sentido inclinam-se BAUDRY-LACANTINERIE & COLIN (“Trattato pratico di Diritto Civile”, “Delle donazione fra vivi…”, tradução italiana da 3ª ed. francesa, vol. I, ns. 1.193 e 1,194), escrevendo:

La cosa é tutt’altra se il donatario è in possesso degli oggetti donati, e invoca, per esempio, il dono manuale per sottrarii ad una demanda di restituzione di quegli oggetti. Posto sotto la protezione dell’ art. 2.279, il donatario può allegare il dono manuale, senza aver da giustificari altri menti la sua allegazione. All’attore incombe l’onere di stabilire che il dono manuale non esiste.

Gli autori e le sentenze sono unanime nel costatare questa inversione delle parti, che risulta dal fatto stesso del possesso ed è necessariamente imposta dalla regola dell’art. 2.279 del Codice Civile.

Il donatario trova dunque nel suo stesso possesso una garanzia quasi sempre decisiva; ma a condizione che il possesso sia quero stesso protetto dall’art. 2.279.

Gli avversari del donatario hanno sempre la ricorsa di stabìlire che non è tale il possesso foro opposto”.

E BEUDANT observa igualmente:

Il est aujourd’hui de jurisprudence à peu près incontestée que la possession crée, au profit de celui qui allégue le don manuel, une prêsomptìon de propriété légitimement acquise. Par suite, le détenteur des meubles ou des valeurs qui déclare les détenir à titre de don manuel n’a pas à faire la preuve du don. C’est aux revendiquants, aux héretiers du de cujus dans l’espèce, à établir qu’il n’y a pas eu don: preuve négative qui, pratiquemente, se raméne à la preuve de l’existenee d’un dépôt, d’un prét, ou d’un détournement” (“Cours de Droit Civile Français”, t. VI, nº 236, pág. 324).

Ora, no caso em estudo, sem desconhecer certas particularidades do direito brasileiro, que precisariam ser atendidas, a situação da consulente é melhor, porque a entrega que lhe foi feita dos títulos ao portador doados resultou de um ato inequívoco do doador, embora não destinado especialmente a provar a doação, mas que, necessária e racionalmente, a implica e envolve.

III Solução para o caso

Penso, em conseqüência do exposto, que a consulente, para pôr-se a coberto de suspeitas ou acusações infundadas, deve expor por petição, no inventário de seu finado marido, lealmente o ocorrido, especificando os títulos ao portador que lhe foram doados e que retirou do banco em que estavam depositados, assim como os respectivos rendimentos recebidos.

Se houver contestação dos herdeiros, poderá, ou aguardar que êstes a acionem, para defender-se; ou, se preferir, tomar a iniciativa de um procedimento judicial, intentando ação declaratória para que seja reconhecido e afirmado por sentença o direito que lhe assiste aos títulos que lhe foram doados.

O cabimento da ação declaratória para êsse fim parece indubitável, em face do disposto no art. 2°, parág. único, do Código de Proc. Civil (v. JORGE AMERICANO, “Comentários ao Código de Processo Civil”, vol. I, pág. 621; H. DA SILVA LIMA, “Código de Processo Civil Brasileiro”, vol. I, páginas 550-551; CARVALHO SANTOS, “Código de Processo Civil Interpretado”, volume I, págs. 64 e segs.).

IV Em face do exposto, passo a responder aos quesitos da consulta pela forma seguinte:

Ao primeiro: Sim a consulente podia retirar do banco depositário, como fêz, os títulos ao portador nêle depositados em virtude da conta conjunta aberta no nome de seu marido e no seu.

Ao segundo: Não. A meu ver, no caso verificou-se uma doação que se considera perfeita em vista da não ocorrência da condição resolutória da pré-morte da donatária.

Ao terceiro: Sim, nos têrmos do que ficou exposto no item 22.

Tal é meu parecer, sub censura.

Rio de Janeiro, 11 de maio de 1952.

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  5. O(s) nome(s) do(s) autor(es) e sua qualificação devem estar no arquivo do texto, abaixo do título;
  6. As notas de rodapé devem ser colocadas no corpo do texto.

II) Normas Editoriais

Todas as colaborações devem ser enviadas, exclusivamente por meio eletrônico, para o endereço: revista.forense@grupogen.com.br

Os artigos devem ser inéditos (os artigos submetidos não podem ter sido publicados em nenhum outro lugar). Não devem ser submetidos, simultaneamente, a mais do que uma publicação.

Devem ser originais (qualquer trabalho ou palavras provenientes de outros autores ou fontes devem ter sido devidamente acreditados e referenciados).

Serão aceitos artigos em português, inglês, francês, italiano e espanhol.

Os textos serão avaliados previamente pela Comissão Editorial da Revista Forense, que verificará a compatibilidade do conteúdo com a proposta da publicação, bem como a adequação quanto às normas técnicas para a formatação do trabalho. Os artigos que não estiverem de acordo com o regulamento serão devolvidos, com possibilidade de reapresentação nas próximas edições.

Os artigos aprovados na primeira etapa serão apreciados pelos membros da Equipe Editorial da Revista Forense, com sistema de avaliação Double Blind Peer Review, preservando a identidade de autores e avaliadores e garantindo a impessoalidade e o rigor científico necessários para a avaliação de um artigo.

Os membros da Equipe Editorial opinarão pela aceitação, com ou sem ressalvas, ou rejeição do artigo e observarão os seguintes critérios:

  1. adequação à linha editorial;
  2. contribuição do trabalho para o conhecimento científico;
  3. qualidade da abordagem;
  4. qualidade do texto;
  5. qualidade da pesquisa;
  6. consistência dos resultados e conclusões apresentadas no artigo;
  7. caráter inovador do artigo científico apresentado.

Observações gerais:

  1. A Revista Forense se reserva o direito de efetuar, nos originais, alterações de ordem normativa, ortográfica e gramatical, com vistas a manter o padrão culto da língua, respeitando, porém, o estilo dos autores.
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  3. Uma vez aprovados os artigos, a Revista Forense fica autorizada a proceder à publicação. Para tanto, os autores cedem, a título gratuito e em caráter definitivo, os direitos autorais patrimoniais decorrentes da publicação.
  4. Em caso de negativa de publicação, a Revista Forense enviará uma carta aos autores, explicando os motivos da rejeição.
  5. A Comissão Editorial da Revista Forense não se compromete a devolver as colaborações recebidas.

III) Política de Privacidade

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