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Do “Usucapião Familiar”
Gediel Claudino de Araujo Junior
21/11/2018
Usucapião é forma originária de aquisição da propriedade de um bem, seja móvel ou imóvel. Tradicionalmente tínhamos três tipos de usucapião de bens imóveis, quais sejam: o ordinário, o extraordinário e o especial. No entanto, a Lei nº 12.424/2011, que trata do programa Minha Casa Minha Vida, introduziu um quarto tipo de usucapião, que a doutrina e a jurisprudência chamam de “usucapião familiar”.
Segundo o art. 1.240-A do Código Civil, acrescentado pela referida lei, seus requisitos formais são: (I) posse direta, exclusiva, sem oposição e ininterrupta pelo prazo de 2 (dois) anos; (II) que o imóvel seja urbano e com metragem de até 250m/2 (duzentos e cinquenta metros quadrados); (III) que o interessado divida com o ex-cônjuge ou ex-companheiro a “propriedade” do bem; (IV) que o interessado utilize o imóvel para sua moradia ou de sua família; (V) que o co-proprietário, ex-cônjuge ou ex-companheiro, tenha abandonado o lar; (VI) não ser o interessado proprietário de outro imóvel urbano ou rural e não ter anteriormente usado deste benefício.
De forma geral, os requisitos são claros e simples. O que levantou alguma critica da doutrina é o prazo prescricional pequeno, apenas dois anos; já as maiores discussões na jurisprudência sobre o tema envolvem os requisitos para a caracterização do “abandono do lar” por parte do ex-cônjuge ou ex-companheiro.
O correto entendimento sobre estas questões pressupõe que o operador considere o forte aspecto social que está por trás da Lei nº 12.424/2011. Inegável que a intenção do legislador foi proteger principalmente a mulher pobre e abandonada pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro, daí o prazo prescricional tão pequeno. Abandonada, neste caso, é a mulher deixada sozinha para cuidar de si e/ou dos filhos (financeira e emocionalmente). Este tipo de abandono é aquele em que o homem “voluntariamente” some, desaparece; ou seja, se ele fica por perto (tem residência conhecida), mantém contato com a mulher e/ou com os filhos, ainda que de forma esporádica, não se caracteriza o abandono previsto pela norma legal, mesmo que ele não pague pensão alimentícia, que a mulher pode sempre cobrar pelos meios legais (ação de alimentos). Não se deve confundir a inércia do homem com abandono; ou seja, o simples não ajuizamento, conforme o caso, de ação de divórcio, de dissolução de união estável, de partilha de bens ou até o não ajuizamento de ação de arbitramento de aluguel, não faz pressupor que o homem “abandonou o lar” para efeito de caracterizar o usucapião familiar.
Outra questão que merece destaque é a exigência de que o casal seja “proprietário” do bem. Com efeito, em razão do texto do artigo ser expresso quanto a este requisito, alguns juízes indeferem o pedido ao constatar que o casal tinha apenas a posse do bem (lembrando que só é proprietário quem tem título registrado). Este formalismo acaba por ser extremamente restritivo, visto que a grande maioria dos casais pobres só possuem compromissos de compra e venda firmado por terceiros, que não os proprietários, ou são titulares de contrato de financiamento bancários. Sabendo que o legislador quis favorecer a mulher pobre abandonada, a questão não deve se limitar aos casos em que o casal é formalmente proprietário do bem, mas deve, ao nosso ver, alcançar os casos em que o casal seja titular de “direitos possessórios” sobre certo bem imóvel, a fim de possibilitar que no futuro a interessada possa exercer, com exclusividade, os direitos sobre o bem.
O usucapião familiar pode ser reconhecido por meio de ação própria ou ainda no bojo de ação de divórcio ou de dissolução de união estável (no item que trata da partilha do bem, se pede sua adjudicação ao interessado); pode, ainda, ser alegado como defesa em qualquer outra ação que o ex-cônjuge ajuíze buscando a partilha do bem ou cobrança de aluguel, desde que, é claro, tenha ocorrido a prescrição aquisitiva e estejam presentes os demais requisitos legais. Quanto a estes, aliás, o colega advogado não deve olvidar de juntar os documentos necessários à sua prova; ou seja, se pretende alegar como defesa a exceção do usucapião familiar, o interessado deve lembrar de juntar à sua petição de defesa os documentos tendentes a provar especialmente a metragem do imóvel, a posse com “animo domini”, a não propriedade de outros imóveis urbanos ou rurais e o não uso anterior dessa faculdade.
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