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Conceito universal de ética

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Existe conceito universal de ética?

ÉTICA

Kiyoshi Harada

Kiyoshi Harada

16/02/2018

O comportamento dos indivíduos e da sociedade em geral varia de um povo para outro. O que é normal para uma determinada nação não o é para outra. Cada povo tem o seu costume tido como um hábito salutar ou bom por razões religiosas, ou por razões outras. Povos existem que ainda vivem com práticas sociais que muitos consideram como uma barbárie do passado como, por exemplo, a circuncisão feminina que é praticada em larga escala em vários países africanos, no Iêmen, no Curdistão iraquiano e em algumas localidades da Ásia e do Oriente Médio, bem como, a aplicação de penas corporais aos condenados (chibatadas, decepamento das mãos etc.).

É certo que os costumes variam de acordo com as tradições de cada povo. O que não é sequer imaginável no Brasil, por exemplo,  constitui uma velha tradição dos povos muçulmanos (Índia, Paquistão, Afeganistão) de cobrirem as mulheres com burca, uma vestimenta que oculta o corpo inteiro dos pés à cabeça, deixando apenas dois pequeninos furos para não prejudicar a função visual.

Outros contrastes existem no mundo político-social. É comum em vários países, tidos como democráticos, que as autoridades políticas se afastem dos cargos ou das funções que ocupam, quando acusadas de práticas corruptivas, independentemente da procedência ou improcedência dessas acusações. Outras pessoas, ainda que qualificadas para o exercício do cargo a que foram  indicadas, deixam de tomar posse ante à simples  notícia veiculada pela mídia, segundo a qual as pessoas indicadas não preencheriam os requisitos da moralidade pública.

No Brasil acontece exatamente ao contrário. Autoridades investidas em cargos ministeriais, quando acusadas de práticas delituosas comuns, ou de improbidade administrativa jamais pedem demissão; pelo contrário, apegam-se aos cargos com unhas e dentes para fortalecer o seu poder de fogo, com o fito de neutralizar  seus acusadores, ou até mesmo para tentar destruir as provas das infrações praticadas. Em recente episódio, uma Deputada Federal foi indicada para exercer o cargo de Ministro de Estado. A sua posse no cargo foi impedida por uma liminar concedida pela Justiça. Está insistindo até agora no seu direito de tomar posse do cargo, percorrendo todas as instâncias judiciais de acordo com os preceitos processuais em vigor. Por razões políticas, o governante que a nomeou, também não quer revogar o ato de nomeação. E o impasse continua. Quem perde com isso é a sociedade, o País. Isso é um desrespeito total à sociedade!

Por que existem essas diferenças de comportamentos? É que aqui não se distingue o que é legal daquilo que é legítimo. A legitimidade precede a legalidade de tal sorte que nem tudo que é legal é legítimo. Nem tudo que é legal é justo, é moral, é razoável, e de acordo com o bom senso e a ética.

Ao se separar a legalidade, da moralidade que a precede, os detentores do poder político estarão sempre pairando acima da lei, ou de conformidade com a lei que eles próprios elaboraram ou concorreram para a sua elaboração. Daí porque, apesar do princípio constitucional de igualdade de todos perante a lei, algumas pessoas são mais iguais que outras. Só a título de ilustração, lembre-se do teto remuneratório dos cargos, funções e empregos públicos. Como é possível alguém aposentar-se com os proventos mensais  de R$ 145 mil reais, quando a imensa maioria da população não chega aos R$ 6 mil reais? Houve ilegalidade em sentido estrito? Não! Tudo está de acordo com a legislação que criou uma porção de penduricalhos que engordam, por vias oblíquas, o teto salarial representado por subsídio em espécie do Ministro do Supremo Tribunal Federal. Na PEC da reforma previdenciária em discussão no Congresso Nacional, que mexe e remexe com tudo (os proventos da aposentadoria, pensões, idades mínimas para obter o benefício previdenciário, regimes especiais, base de cálculo dos benefícios etc.) curiosamente  ficou assegurada aos parlamentares federais a faculdade de permanecer no regime atual.

Se consideramos que a ética significa o agir no relacionamento entre as pessoas e entre estas e a natureza, buscando sempre o bem comum, pode-se dizer que há um conceito de ética aplicável na ordem internacional. Pessoas que agem considerando e respeitando outras pessoas, buscando a construção de uma agenda político-social humanística são aquelas que atuam com ética. Os éticos preocupam-se na construção de um mundo com sentido. Ao contrário, pessoas que agem para si próprio, para satisfação de seus interesses egoísticos em detrimento do bem estar da sociedade são pessoas desprovidas de ética. Os aéticos preocupam-se apenas de construção de um mundo para si próprio, isto é, um mundo sem sentido.

O individualismo conduz ao egoísmo que consiste em querer colher todos os frutos sem ter plantado a árvore. Esse tipo de indivíduo é aquele desprovido de ética, de pudor! O coletivismo está para a ética,  assim como o individualismo está para a falta de ética.

Por isso, entendemos que a raiz da conduta sem ética está no individualismo que tem como regra de conduta o “ter” a qualquer custo e de qualquer maneira, para satisfação do consumismo ilimitado que está tomando conta do mundo atual.

Para restabelecer a ética na sociedade em geral é preciso, antes de tudo, romper e sepultar o individualismo enraizado na nossa cultura desde os tempos imemoriais. E não há lei que faça isso. A mudança cultural depende da ação de cada indivíduo no sentido de respeitar o próximo, de aceitar a diversidade de pensamentos, de aumentar a empatia entre as pessoas. Isso se faz com ação concreta, não com discursos ocos ou com pregações demagógicas em torno da inclusão social que virou moda entre os políticos desprovidos de ética e que vivem como nababos, contrastando com a imensa maioria de população que vive abaixo da linha da miséria. Dar de comer na mão para os pobres, também, nada tem a ver com a conduta ética. Muito ao contrário, esse tipo de ação oculta sempre objetivos dos mais sórdidos que rompem todas e quaisquer  barreiras da moralidade e da ética. Pessoas que assim agem vivem plantando a semente da pobreza a ser explorada.

Finalmente, uma observação do cotidiano. Nas pessoas mais humildes encontramos os comportamentos éticos. É que ética nada tem a ver com conhecimentos técnicos genéricos ou específicos, nem com o grau de instrução escolar, ou com a erudição. Aliás, os humildes são incapazes de cunhar frases de efeito para enganar a população, como fazem as velhas raposas da política brasileira em sua imensa maioria altamente escolarizada. Tampouco conseguem escrever textos prolixos mediante uso de linguagem invulgar com o fito de revelar a sua erudição ou a pseuda erudição, sempre visando um benefício próprio. Conhecimentos e sabedoria são conceitos diferentes.

Enquanto não se restabelecer a ética, os preceitos constitucionais concernentes aos direitos e garantias individuais não passarão de comoventes e utópicas proclamações poéticas.


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