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Nathaly Campitelli Roque

Nathaly Campitelli Roque

07/04/2017

Desde a divulgação do caso de assédio sexual ocorrido entre uma figurinista e um ator conhecido, diversas opiniões têm sido expressadas sobre o tema. Porém, o debate deve ultrapassar as opiniões de fundamento meramente ideológico, que não são suficientes para justificar a gravidade de situações como a que tem atualmente o foco das atenções.

Segundo o Direito Brasileiro, toda pessoa tem direito à proteção de suas integridades física e moral, sendo vedado qualquer tratamento degradante. Está no artigo 5º da Constituição Federal. Sendo assim, toda conduta que seja apta a trazer qualquer dano físico ou moral é ilícita, podendo até mesmo ser configurada como crime.

Também é protegida a liberdade em suas mais diversas dimensões. No que toca à liberdade de expressão, é esta limitada pela própria Constituição Federal pela tutela da integridade moral dos demais membros. Em outras palavras: é livre a manifestação, é proibida a ofensa à reputação ou à dignidade de outra pessoa (crimes previstos nos arts. 139 e 140 do Código Penal).

Desse modo, parece claro que homens e mulheres devem ser protegidos da violência. Todos devem ser igualmente protegidos em suas vidas, em diferentes aspectos. Porém, a igualdade que a Constituição Federal estabelece é uma igualdade material, e não a meramente declarada.

Neste ponto, há dados sociais relevantes que apontam que as mulheres se encontram em uma posição de maior vulnerabilidade do que os homens em relação a uma prática especial de violência. É o que demonstra, por exemplo, o Mapa da Violência contra Mulheres de 2015 (disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/MapaViolencia_2015_mulheres.pdf), em que se constata que a taxa de homicídio de mulheres é muito elevada, sendo o 5º país no qual mais se matam mulheres (taxa de 4,8 homicídios por 100 mil mulheres), havendo 48 vezes mais homicídios femininos que o Reino Unido, 24 vezes mais homicídios femininos que a Irlanda ou a Dinamarca, e 16 vezes mais homicídios femininos que o Japão ou a Escócia.

Esta violência é verificada no contexto pessoal (familiar ou de trabalho), e se caracteriza pelo constrangimento, físico ou moral, a praticar ou ter de suportar a prática de atos de conteúdo especificamente sexual com os quais não há consentimento.

Homens também podem sofrer esse tipo de violência, sem dúvida. Porém, constata-se que tais práticas se verificam em situações específicas de vulnerabilidade (infância e adolescência, presídios, campos de guerra, entre outras) e que, nas mesmas condições de vulnerabilidade, as mulheres ainda representam um número maior de vítimas.

Temos como exemplo o índice de atendimento de mulheres que sofrem violência doméstica, sexual e/ou outras violências registrado no Sinan, em 2014, e que está sistematizado no Mapa da Violência mencionado. Concluindo: a cada dia de 2014, 405 mulheres demandaram atendimento em uma unidade de saúde por alguma violência sofrida; ou seja, a violência contra mulher gera impacto também na administração da saúde pública.

Esses fatos têm provocado a atuação cada vez mais relevante dos movimentos sociais de defesa das mulheres e, em resposta, o Brasil tem adotado legislações protetivas (participando de diversos tratados internacionais e editando diversas leis especiais, como a Lei Maria da Penha), avançando nas discussões judiciais sobre o assédio sexual no trabalho e desenvolvendo políticas públicas que protegem as mulheres em condição de violência (como o “Disque 180”).

É certo que tais atitudes ainda não são suficientes para combater esse tipo especial de violência. Há um importante trabalho de educação a ser feito, a fim de que essas atitudes – tidas como normais – passem a ser socialmente indesejadas.

É um exemplo a campanha encabeçada pela CAARJ (Caixa de Assistência dos Advogados do Rio de Janeiro), realizada no Aeroporto Galeão, em que foram veiculados cartazes com frases de “brincadeiras” ouvidas por advogadas e demonstrando que são formas de assédio, tais como “Você é muito bonita, nem precisava ser competente” (preconceito disfarçado de elogio continua sendo preconceito); “Não contrato advogada mulher porque engravida” (a violência contra a mulher advogada aparece de várias formas. Todas têm de ser combatidas) e “Aumento para quê? Não é seu marido que paga as contas?” (a violência contra a mulher advogada aparece de várias formas. Até mesmo no salário: as mulheres ganham 20% menos que os homens).

Não se pode considerar “brincadeira” o que ofende, direta ou disfarçadamente. Não de pode considerar “paquera” um ato de constrangimento, físico ou moral. Diversão só é diversão verdadeira quando todos se divertem; paquera só é paquera quando há consentimento dos envolvidos. Não há nada de “chato” ou de “politicamente correto” nisso. Há simplesmente “correto”.

Não se trata de reclamações exageradas (o chamado “mimimi”). São condutas tão sérias que são reprimidas pelo direito, muitas das quais são caracterizadas como crimes. São condutas tão sérias que as impedem de trabalhar (para se recuperar de lesões físicas e psicológicas graves, se não forem incapacitantes), de transitar pelas cidades para trabalhar, ter acesso à cultura e à educação (para evitar abordagens indevidas e estupros), entre outras restrições graves. Trata-se de uma questão de respeito ao sofrimento das outras pessoas e de desenvolvimento da necessária empatia.

Concluindo, deve ser a todos assegurado o direito a qualquer mulher de não querer ser assediada, violada, violentada. Com o correspondente dever de respeito à liberdade de uma mulher sobre o próprio corpo e sobre o próprio desejo.


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