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Dilma e a Lei das Inelegibilidades
Raquel Cavalcanti Ramos Machado
02/09/2016
Diante do diferenciado julgamento de ontem, em que se decidiu apartadamente o impeachment e a “suspensão dos direitos políticos” de Dilma, muito se tem questionado sobre sua inelegibilidade.
Inicialmente, deve-se atentar para o fato de que a lei das inelegibilidades, LC nº 64/90, alterada pela lei da ficha limpa, LC nº 135/2010, em seu art. 1º, I, “c”, ao tratar dos efeitos pela perda do cargo por descumprimento da Carta Política, não refere o presidente ou vice-presidente da República, mas apenas governadores, vice-governadores, prefeitos e vice-prefeitos, nos seguintes termos:
Art. 1º. São inelegíveis
I – para qualquer cargo:
(…)
c) o Governador e o Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal e o Prefeito e o Vice-Prefeito que perderem seus cargos eletivos por infringência a dispositivo da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente e nos 8 (oito)anos subsequentes ao término do mandato para o qual tenham sido eleitos.
Ou seja, a lei das inelegibilidades não se aplica aos presidentes e vice-presidentes da República. A questão, porém, está disciplinada diretamente na Constituição Federal, mais precisamente no art. 52, I e parágrafo único, nos seguintes termos:
Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
I – processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;
(…)
Parágrafo único – Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.
As palavras empregadas em um texto normativo e outro são, como se vê, diferentes.
Lei das Inelegibilidades | Constituição Federal |
Art. 1º, I, c – não se aplica ao Presidente e ao vice-presidente da República | Art. 52, I, parágrafo único- efeitos da decisão de perda de mandato ao presidente e vice-presidente da República |
Inelegibilidade | Impedimento |
Capacidade eleitoral passiva – capacidade para se eleger | Atinge o exercício de qualquer função pública – a expressão utilizada pelo texto constitucional como se vê é “inabilitação par ao exercício de função pública”, mais ampla do que inelegibilidade[1]. |
Outro ponto é saber se os efeitos da perda de mandato podem ser decididos apartadamente. Apesar de parecer estranho, deve-se considerar que sendo o julgamento do impeachment, sobretudo, político, além de jurídico, a conciliação de interesses parece válida constitucionalmente. Diante da pressão social, dos protestos contra o impeachment, do jogo necessário ao apoio político e à aprovação de normas jurídicas, a solução procurou ser conveniente aos vários participantes. É possível ainda se entender que o texto “limitando-se a condenação à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos para o exercício da função pública”, aponta a sanção máxima, dentro qual, diante da perda, seria possível ainda decidir sobre o período de inabilitação. Apenas uma interpretação literal leva à aplicação automática e integral da sanção de inabilitação por oito anos para o exercício de qualquer função.
Assim, caso a decisão do Senado não venha a ser anulada pelo Supremo Tribunal Federal, a decisão não lhe impede de se candidatar, nem de exercer outras funções públicas, como ocupar cargos em Ministérios, secretarias, etc.
[1] GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12 ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 230.
Veja também:
- Inaugurações de obras, eleições e proporcionalidade
- Financiamento e gastos de campanha: questão permanente
- Informativo de Legislação Federal: resumo diário das principais movimentações legislativas
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