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A indisponibilidade dos direitos trabalhistas no ordenamento jurídico

DIREITOS PATRIMONIAIS DE CARÁTER PRIVADO

INDISPONIBILIDADE DOS DIREITOS TRABALHISTAS

LEI 9.307/1996

PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE

PROTEÇÃO AO TRABALHO

Gustavo Filipe Barbosa Garcia

Gustavo Filipe Barbosa Garcia

31/03/2016

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O Direito do Trabalho tem como um de seus preceitos fundamentais o princípio da irrenunciabilidade, no sentido de que o empregado não pode dispor dos seus direitos, os quais são assegurados por meio de normas cogentes e de ordem pública[1].

Com isso, entende-se, tradicionalmente, que os direitos trabalhistas, justamente em razão da sua relevância para preservar a dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988), são dotados de certo grau de indisponibilidade.

Em harmonia com o exposto, o art. 444 da Consolidação das Leis do Trabalho permite que as relações contratuais de trabalho sejam objeto de livre estipulação das partes interessadas, mas desde que isso não contrarie as disposições de proteção ao trabalho, os contratos coletivos (ou seja, as convenções e os acordos coletivos) que lhes sejam aplicáveis e as decisões das autoridades competentes.

Nota-se, portanto, nítida restrição à autonomia privada na esfera da relação de emprego, justificada pela natureza essencial dos direitos envolvidos, assegurados por meio de normas imperativas, bem como pela subordinação inerente ao contrato de trabalho, caracterizando a forma como o serviço é prestado pelo empregado e que decorre do poder de direção do empregador (arts. 2º e 3º da CLT).

Apesar de já sedimentadas essas importantes noções, inclusive na doutrina e na jurisprudência, é necessário examinar, com maior cuidado, se os direitos trabalhistas são, efetivamente, indisponíveis, bem como, em caso positivo, o alcance e o grau dessa indisponibilidade.

Trata-se de questão que interfere, inclusive, no cabimento da arbitragem, pois o art. 1º da Lei 9.307/1996 dispõe que as pessoas capazes de contratar podem se valer da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.

Ainda quanto ao tema, o art. 852 do Código Civil de 2002 prevê ser vedado o compromisso (arbitral) para a solução de questões de estado, de direito pessoal de família e de outras que não tenham caráter estritamente patrimonial.

Nesse contexto, consoante o art. 11 do Código Civil de 2002, com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.

No plano processual, segundo o art. 392 do CPC de 2015, “não vale como confissão a admissão, em juízo, de fatos relativos a direitos indisponíveis”.

Não obstante, no dissídio individual trabalhista, em regra, admite-se a confissão decorrente do depoimento pessoal (arts. 819 e 820 da CLT), não apenas do empregador, que normalmente figura no polo passivo da relação processual, mas também quanto ao autor.

Nesse sentido, consoante a Súmula 74, inciso I, do Tribunal Superior do Trabalho, “aplica-se a confissão à parte que, expressamente intimada com aquela cominação, não comparecer à audiência em prosseguimento, na qual deveria depor”.

Evidentemente, se o direito material discutido no processo trabalhista fosse plenamente indisponível essa confissão não teria como incidir.

Além disso, de acordo com o art. 345, inciso II, do CPC de 2015, a revelia não acarreta a presunção de veracidade das alegações de fato formuladas pelo autor “se o litígio versar sobre direitos indisponíveis”.

Entretanto, no litígio trabalhista, em regra, admite-se o efeito da revelia voltado à confissão (ficta) quanto à matéria de fato (art. 844 da CLT), sabendo-se que o empregado também pode figurar como réu em ação na Justiça do Trabalho, como se observa, por exemplo, na consignação em pagamento (arts. 539 a 549 do CPC de 2015) e no inquérito para apuração de falta grave (arts. 853 a 855 da CLT).

Novamente aqui, se o direito material fosse verdadeiramente indisponível, naturalmente que essa presunção de veracidade não seria aplicável.

Ainda quanto ao tema, o art. 840 do Código Civil de 2002 dispõe ser lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas.

Não obstante, apenas quanto a direitos patrimoniais de caráter privado é que se permite a transação (art. 841 do Código Civil de 2002).

Os direitos trabalhistas, tanto individuais como coletivos, normalmente são patrimoniais (ainda que quanto aos efeitos) e também admitem a transação, por meio de negociação coletiva de trabalho (art. 114, § 1º, da Constituição da República), de mediação (art. 11 da Lei 10.192/2001) e de conciliação, essa última tanto na esfera judicial (arts. 764, 831, 846, 852-E, 850 e 860 da CLT) como no âmbito extrajudicial (arts. 625-A a 625-H da CLT, acrescentados pela Lei 9.958/2000, versando sobre as Comissões de Conciliação Prévia).

Aliás, mesmo a arbitragem, como modalidade de heterocomposição que difere da jurisdição estatal, é expressamente admitida quanto aos conflitos coletivos de trabalho (art. 114, §§ 1º e 2º da Constituição Federal de 1988).

Fica nítida, assim, a relevância de se aprofundar o debate a respeito do relevante tema voltado à indisponibilidade dos direitos trabalhistas.


[1] Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 98.

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