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NOVO CPC
PROCESSO CIVIL
Vigência do Novo CPC: um IRDR para chamar de seu
14/03/2016
Há mais de um ano escrevemos [1] sobre o Novo Código de Processo Civil nesta coluna, o qual já estará em vigor, certamente, no próximo dia 19. A ideia subjacente aos textos é tentar antecipar o impacto do Novo Código na realidade forense, sendo que, em boa medida, observamos o conselho de Abraham Lincoln: “A melhor maneira de prever o futuro é inventá-lo”.
Porém, durante todo esse exercício de contínua previsão do porvir há um aspecto, de suma importância, a ser analisado: a partir de quando teremos em nossas mãos o Novo Código, para, não mais prever, mas sim produzir o futuro?
Sim, estamos a falar da data de vigência do Novo Código.
Todos temos acompanhado atônitos às discussões sobre a data da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil[2], sendo que três correntes se apresentam, cada qual propugnando data própria para o início da vigência, dia 16, 17 ou 18[3].
Para quem defende o dia 16, o prazo de contagem deve observar pronunciamentos do Superior Tribunal de Justiça editados sobre a entrada em vigor do Código Civil de 2002 (v.g. REsp 1.125276-RJ), inclusive em respeito à segurança jurídica (artigo 927 do Novo CPC). Em tais precedentes, o Superior Tribunal de Justiça teria assentado a necessidade da contagem do prazo da vacatio em dias, independentemente da lei se referir ao período de ano, tudo em respeito ao artigo 8, § 2o, da Lei Complementar no 95/1998. Assim, considerando que a contagem envolve ano bissexto e a forma de contagem estabelecida no § 1o do referido artigo 8o, o Código entraria em vigor no dia 16[4].
Noutra linha, os defensores do dia 17 propugnam que a contagem observe exclusivamente a Lei Complementar no 95/1998, que trata diferentemente a contagem do prazo frente ao disposto na Lei no 810/1949. Assim, o dia da publicação seria computado, pelo que o prazo de vacatio de um ano exaurir-se-á no dia 16 de março, entrando em vigor o Código em 17 de março de 2016[5].
Finalmente, a contagem, na visão dos que pretendem marcar o dia 18, passa pelo seguinte: o prazo de vacância do novo CPC, deve observar o disposto no art. 8º, § 2º da Lei Complementar nº 95/1998, mas em anos. Nos termos do art. 1º da Lei no 810/1949, ano é o período de doze meses contado do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte. Além disso, o art. 132, § 3º do Código Civil prevê que os prazos de anos expiram no dia de igual número do de início. Estabelecidas tais premissas, o prazo de vacância de um ano começou em 17.3.2015 (data da publicação do novo CPC no Diário Oficial) e se esgota em 17.3.2016. Como a vacatio termina no dia útil seguinte (art. 8º, § 2º da LC 95/98), isso significa que ele começa a viger em 18.3.2016.
Não deixa de ser paradoxal, como bem anotou Marcelo Pacheco, coautor desta coluna, que: “O que não podemos admitir, todavia, é que a técnica (processo civil) que visa exatamente a eliminar incerteza (pacificar o conflito) seja ela, em si mesma, uma grande, enorme, produtora de crises, debates e discussões.”[6].
As consequências para o processo da discussão sobre qual diploma aplicar são inúmeras, denunciadas a todo tempo, bastando lembrar a incerteza sobre a (des)necessidade de interposição de recurso de agravo retido contra decisão prolatada em tal período para evitar a preclusão.
Sem dúvida, o melhor é que houvesse consenso nesse tema, ou seja, convergência quanto à data de da entrada em vigor do Código. Mas a divergência é de tal monta, para se ter uma ideia, que os próprios coautores desse texto divergem sobre o critério adequado para contagem do prazo de vacatio e, consequentemente, do dia da entrada em vigor do Código.
Essa é daquelas dissonâncias que constrangem os cultores da matéria. É lamentável que não tenhamos conseguido estabelecer uma data certa para a vigência do Código. Em verdade, não existem culpados nisto, mas sim derrotados pelo calendário.
Demais disso, o fato de o Pleno do Superior Tribunal de Justiça[7], em sessão administrativa, e o Conselho Nacional de Justiça[8] terem estabelecido o dia 18 como a data de entrada em vigor do Código não resolve definitivamente a questão. E, vale destacar, o CNJ cogitou declarar feriado forense dias 16, 17 e 18, mas felizmente não declarou nenhum dia como feriado.
De qualquer forma, a data foi decidida no âmbito administrativo, não importando em precedente vinculante, mesmo no contexto do Novo Código[9]. Ainda, durante a referida apreciação, foram realizadas ressalvas quanto à possibilidade de o tema ser reexaminado em sede jurisdicional, o que por si só mina sua eficácia[10]. Finalmente, salvo na via do incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), o tema tende a aportar no Superior Tribunal de Justiça depois de vários anos, quando certamente sua composição estará alterada[11].
A par disso, não viemos nesta coluna sugerir data e sim desejar solução.
Um dos novos institutos trazidos pelo Código, que poderá ser manejado a partir do dia 16, 17 ou 18 (depende da corrente…), é o incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR).
O objetivo primordial do IRDR é evitar a quebra de isonomia, preservando a estabilidade do direito (segurança jurídica), com a apreciação molecularizada de determinada questão de direito (artigo 976 do Novo CPC).
O IRDR moleculariza determinada questão de direito, comum em diversas demandas, submetendo sua solução ao Tribunal de Justiça ou Regional Federal, com a possibilidade de revisão recursal pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal.
A tese fixada no IRDR passa a funcionar como prejudicial ao julgamento dos feitos, razão porque o provimento posteriormente emitido na IRDR é imposto aos feitos sobrestados e aos processos vindouros (artigo 985 do Novo CPC). Ademais, acaso submetido ao Superior Tribunal de Justiça ou ao Supremo Tribunal Federal, no âmbito de suas competências (a saber, a partir de REsp ou RE), a tese ganha contornos nacionais (artigo 987, § 2o, do Novo CPC).
Portanto, o IRDR permite, num rendimento ótimo, a maximização da eficácia de um provimento jurisdicional, com a menor utilização de esforço processual, tudo em resguardo à isonomia e à segurança jurídica.
Ademais, o IRDR possibilita igualmente a aceleração na definição da questão, realizando a uniformização jurisprudencial, porquanto já inicia nos Tribunais, com submissão recursal – facilitada, na forma do art. 987 – ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal.
Dito isso, talvez a solução sobre a vigência do Novo Código esteja nele mesmo. É a doença que nos dá o bacilo da cura.
Quem sabe, e esse é o nosso desejo, desde logo instaure-se um IRDR para definição da data de vigência do Novo Código, talvez até mesmo o primeiro, na medida em que o incidente é cabível para questões de direito material e processual (artigo 976, § 4o).
O julgamento rápido do IRDR, inclusive com o recurso especial respectivo, seria a primeira prova de fogo do Código, fazendo com que seja definida nacionalmente a data de entrada em vigor deste, afastando qualquer dúvida residual no tema, a par da autoridade do julgado a ser emanado naquele (precedente vinculante – artigo 927, inciso III). A decisão jurisdicional confirmaria a decisão administrativa.
Vale o registro, a Emenda Constitucional 3, que institui a ação declaratória de constitucionalidade, foi objeto de exame, na perspectiva de sua constitucionalidade, exatamente em questão de ordem suscitada na primeira ADC proposta (no 1)[12]. Por assim dizer, o exame do criador pela criatura.
Assim, esperamos que seja suscitado IRDR sobre a questão da vigência do Novo Código. Conquanto cada um de nós esteja convencido, a seu modo e por razões próprias, da data mais correta para entrada em vigor do Código, o melhor na situação e para os cidadãos, para além de vencidos e vencedores, é uma data certa.
[1] O projeto nasceu de uma coluna individual de Fernando Gajardoni, que posteriormente convidou os demais coautores deste texto, os quais são gratos ao primeiro pela oportunidade. Em celebração à coluna, será lançado um e-book com todos os textos escritos, sobre o qual daremos notícias em breve.
[2] O problema estaria resolvido com a inserção de data certa no artigo 1.045, sendo que se teve nova oportunidade para isso com o projeto que veio a se converter na lei n. 13.256/2016. Tal projeto, ao invés de resolver (o que se fazia em sua primeira redação, na Câmara, ao se apontar uma data certa para vigência), na sua versão simplesmente remeteu sua vigência para aquela estipulada pelo Código… Os portugueses foram muito mais astutos, pois ao editarem seu novo Código de Processo Civil estabeleceram data certa para entrada em vigor (artigo 8o da Lei no41/2013: “A presente lei entra em vigor no dia 1 de setembro de 2013.”.
[3] Sobre o tema: http://justificando.com/2015/06/19/divergencia-doutrinaria-sobre-a-entrada-em-vigor-do-novo-cpc-e-propostas-de-solucao/ Acesso em: 13-mar-2016.
[4] O argumento nos foi apresentado por Cristiano Imhof pelo twitter.
[5] Na questão, leia-se: https://www.jota.info/pela-ordem-a-polemica-sobre-o-inicio-da-vigencia-do-cpc2015 Acesso em: 13-mar-2016.
[6] Disponível em: https://blog.grupogen.com.br/juridico/2016/03/07/novo-codigo-processo-civil-atencao/ Acesso em: 13-mar-2016.
[7] Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunicação/Not%C3%ADcias/Not%C3%ADcias/Pleno-do-STJ-define-que-o-novo-CPC-entra-em-vigor-no-dia-18-de-março Acesso em: 13-mar-2016.
[8] Disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/81698-cnj-responde-a-oab-e-decide-que-vigencia-do-novo-cpc-comeca-em-18-de-marcoAcesso em: 13-mar-2016.
[9] Temos que a hipótese prevista no artigo 927, inciso V, seja relativa ao exercício jurisdicional de tais órgãos. Quando o Código pretendeu estabelecer interlocução com decisões de caráter administrativo, explicitou tal circunstância (artigo 496, § 4o, inciso IV).
[10] Nada obstante, pensamos que seja plenamente válido às partes utilizarem tais manifestações para salvar o (não) exercício de posições processuais com base nelas, haja vista a boa-fé objetiva, a proteção da confiança e a consequente segurança jurídica (artigo 5o do Novo CPC).
[11] A rigor, a alteração de componentes do órgão não deveria significar na modificação do entendimento firmado por este. As pessoas passam e as teses ficam, exceto quando tenha ocorrido alguma ruptura nas suas linhas de força. Porém, essa é a prática atualmente observada, bastando considerar as contínuas flutuações na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nos últimos anos.
[12] “Ação declaratória de constitucionalidade. Incidente de inconstitucionalidade da emenda constitucional n. 03/93, no tocante a instituição dessa ação. Questão de ordem. Tramitação da ação declaratória de constitucionalidade. Incidente que se julga no sentido da constitucionalidade da emenda constitucional n. 3, de 1993, no tocante a ação declaratória de constitucionalidade.” (ADC-QO 1, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, julgado em 27/10/1993, publicado em 16/06/1995, Tribunal Pleno).