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Para onde vai o direito penal?
Yuri Carneiro Coêlho
12/02/2016
A construção de um direito que possibilite a solução dos anseios de justiça da sociedade e que seja adequado à construção do Estado Social e Democrático de Direito, voltado aos anseios fundamentais do homem, pressupõe o recurso a mecanismos que satisfaçam esta finalidade[1].
Isto implica na seleção não apenas de institutos da dogmática que permitam esta possibilidade, mas também a escolha de caminhos de política criminal compatíveis com estas opções dogmática e com uma concepção de democracia material.
O que vemos em nosso país e em nossa cultura jurídica, entretanto, é uma completa falta de sintonia, de ajuste e conexão entre estas perspectivas, fruto de uma política legislativa e de gestão governamental que não se preocupam com o “ser” e com a democracia em sua essência, mas, sim, com a manutenção de situações preestabelecidas voltadas a satisfação de interesses políticos imediatos.
Dentro deste caminho acima apontados observamos inúmeros exemplos em nosso cotidiano e o mais recente que me deixou perplexo foi uma declaração apontada ao governador da Bahia, já alvo de inúmeras críticas de juristas e acadêmicos de minha terra querida, que reflete exatamente o quanto apontado acima.
Postei em minhas redes sociais[2], declaração do governador Ruy Costa, divulgada na imprensa de nosso Estado, que “a polícia baiana estava autorizada a indicar pais ou responsáveis por crianças ou adolescentes acusados de cometerem algum tipo de delito”. A declaração do governador ocorreu após receber informações do secretário de segurança pública da apreensão de um menor com 14 (quatorze) anos portando uma metralhadora e ele determinou que se procedesse ao indiciamento dos pais ou responsáveis do menor por este fato.
Isto só pode beirar o absurdo, não tenho outras palavras! Inicialmente porque o governador esqueceu – ou não tem conhecimento – que o ato de indiciamento é privativo do delegado de polícia, conforme preceitua o § 6o do art.2º da lei nº12.830/13, que diz: “O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias”.
Ademais, em uma interpretação jurídico penal do fato, não há que se proceder à nenhuma espécie de indiciamento ou falar-se na possibilidade de mover-se ação penal contra ais ou responsáveis que não tenham nenhuma vinculação subjetiva com o fato, pois estar-se-ia violando o princípio da responsabilidade penal subjetiva.
O que “salta aos olhos”, entretanto, não se refere apenas aos aspectos jurídicos do fato, mas a perspectiva política criminal da ação do governador, que ressalta e corrobora uma política de repressão como forma de combate à criminalidade, tradicional nos discursos políticos da atualidade, e que serve como um instrumento de legitimação de políticas públicas ineficientes e omissas.
Deve-se perguntar: Porque este menor foi encontrado com uma metralhadora em suas mãos, quais foram as políticas públicas de inserção social e educacional em que ele e sua família foram inseridos? Responder à estas perguntas certamente é muito mais difícil para o governador do que “determinar” o indiciamento de pais ou responsáveis, invadindo uma esfera de atribuições que não é sua e corroborando um discurso antidemocrático e que em nada contribui para a cessação da criminalidade violenta em nosso pais!
Que fique pontuado neste momento nossa crítica e a certeza de que não podemos fechar os olhos à estes discursos e práticas que não possibilitem a inclusão da pessoa no centro de nosso sistema jurídicos e do respeito ao ser humano em todas as suas dimensões, sendo nossa obrigação alertar e difundir que a democracia real só poderá ser alcançada com a inclusão em todos os seus aspectos e afastando-se esta forma de fazer política criminal.
[1] COELHO, Yuri Carneiro, As teorias da conduta no Direito Penal: O conceito de conduta e sua importância para um Direito Penal de garantia: in https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/9025/1/YURI%20CARNEIRO%20CO%C3%8ALHO%20-%20TESE.pdf, p.12.
[2]https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1702016086686458&set=a.1403040829917320.1073741832.100006342491180&type=3&theater
Veja também:
- A Lei 12.971/14 e o conflito entre os arts. 302, §2º e 308, §2º do CTB: As incoerências legislativas tradicionais
- Teoria da Cegueira Deliberada
- Informativo de Legislação Federal: resumo diário das principais movimentações legislativas
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