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Contrato de leasing de veículos: verdades e mentiras sobre o valor residual garantido (VRG)

ANTECIPAÇÃO

ARRENDAMENTO MERCANTIL

COBRANÇA

CONCEITO

CONTRAPRESTAÇÃO

CONTRATO

ESTRUTURA DO PREÇO PAGO

FASES

FORMA DE CONTRATAÇÃO

LEASING

Paulo Maximilian

Paulo Maximilian

26/10/2015

Por Paulo Gustavo Rebello Horta[1] e Paulo Maximilian

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Resumo: O contrato de leasing (arrendamento mercantil) se tornou uma das formas mais comuns de contratação de financiamento de veículos, pois, de um lado, para o arrendante apresenta a segurança, vez que o bem permanece registrado em seu nome e, de outro, para o arrendatário, a sedução se dá com a oferta de menores taxas de juros (fruto da mencionada segurança). Ocorre que, um dos mecanismos utilizados para a consecução do negócio, a cobrança antecipada do valor residual garantido (VRG) sempre foi mal compreendido pela jurisprudência. Num primeiro momento se entendeu que tal cobrança desconfiguraria o contrato de leasing, transformando-o em “compra e venda parcelada”. Ultrapassada essa questão (Súmula 263 do STJ cancelada com a edição da Súmula 293 do mesmo tribunal), a problemática se voltou para a equiparação do VRG à opção de compra, relegando sua verdadeira função de garantia. O artigo analisa o VRG e seu tratamento pela doutrina e jurisprudência.

Palavras-chave: Leasing – Arrendamento mercantil – Valor residual – Valor residual garantido – Cobrança – Antecipação

Sumário:

1.Introdução – 2.Histórico – 3.Conceito e natureza jurídica do contrato – 4.Forma de contratação, fases e requisitos necessários – 5.Tríplice opção ao término do contrato – 6.Estrutura do preço pago (contraprestação, VRG e VR) – 7.Questões polêmicas. As verdades e as mentiras – 8.Síntese e proposições – 9.Conclusão

1. Introdução

O leasing[2], como se perceberá doravante, aperfeiçoa-se através de um mix de contratos[3], motivo pelo qual suscita enormes controvérsias tanto no campo prático como no teórico. Passando de forma rápida por questões históricas e conceituais, o presente artigo tem como foco analisar as polêmicas questões referentes ao valor residual garantido, apresentando o debate e as posições doutrinárias e jurisprudenciais sobre cada assunto.

2. Histórico

Embora haja divergências doutrinárias sobre a criação do contrato de leasing[4], fato é que o mesmo se proliferou a partir do famoso Lend and Lease Act (aprovado pelo Congresso norte-americano em 11.03.1941 e publicado durante a 2.ª Guerra Mundial), através do qual o presidente Franklin Delano Roosevelt determinou um empréstimo de armamentos e outros materiais bélicos para os países aliados, com a (até então inédita) condição de que, terminada a guerra, os mesmos deveriam devolver ou adquirir o material emprestado.

No gancho da prática utilizada pelo governo durante a guerra, o californiano D. P. Boothe Junior, comerciante do ramo de condicionamento de alimentos, que tinha com o governo um contrato com volumosa encomenda, viu-se impossibilitado de cumprir com sua obrigação por falta de maquinário e, não possuindo o capital necessário para que adquirisse tais equipamentos, optou pelo aluguel. Percebeu, então, que havia uma perspectiva maior para os financiadores, fazendo surgir um novo “nicho” comercial a ser explorado se os mesmos passassem a comprar equipamentos e, com isso, alugassem os mesmos aos clientes. Assim, como se verifica no citado artigo de Arnoldo Wald[5], colhendo informações da Revista Fortune, em 1952, D. P. Boothe Junior e alguns de seus amigos criaram a United States Leasing que, com um capital inicial de US$ 20.000,00, passou, já no ano de 1954 a realizar operações no valor de US$ 3.000.000,00. Em 1961, a outra empresa criada pelo pioneiro, a Boothe Leasing Corporation que, partira de um capital inicial de US$ 400.000,00, alcança a marca de impressionantes 2.700 clientes, movimentando US$ 66.000.000,00 e aumentando o seu capital para US$ 8.000.000,00, ou seja, 20 vezes o valor inicialmente aplicado.

Posteriormente, as empresas de leasing foram se multiplicando e, assim como ocorrera com as empresas de cartões de crédito, a atividade foi “encampada”, direta ou indiretamente, pelas instituições financeiras.

Caio Mário da Silva Pereira, de forma apertada, expõe a evolução e a adoção da matéria no Brasil. Ensina ter a prática sido adotada pela primeira vez no ano de 1967, com a empresa Rent-a-Maq, tendo permanecido em caráter experimental até meados dos anos 70[6]. Todavia, mesmo tendo alcançado uma enorme evolução[7], a prática do leasing seguia ao desamparo de qualquer legislação, ao passo que, em 1974, buscando estabelecer obrigações tributárias para o contrato em questão, foi editada a Lei 6.099/1974, que, definia o leasing[8], renomeando-o como arrendamento mercantil.

Com a edição da mencionada legislação[9], 8 o leasing ganhou o mercado e passou a ser oferecido à sociedade, tornando-se excelente opção para os que buscavam iniciar ou expandir seus negócios, sem, no entanto, comprometer o capital a ser investido.

3. Conceito e natureza jurídica do contrato

Em que pese certa inconformação por parte da doutrina com a denominação adotada no direito positivo (arrendamento)[10][11], no que tange à conceituação, não há grande dissonância. De forma completa, Roberto Ruozi[12], citado por Álvaro Antônio S. B. de Aquino[13], ensina que “Oleasing é uma operação de financiamento a médio ou a longo prazo, calçada em um contrato de locação de bens móveis ou imóveis. Integra essa operação um intermediário financeiro que intervém entre o produtor do bem objeto do contrato e a empresa que dele necessita, adquirindo do primeiro o referido bem e cedendo-o em locação à segunda, o qual se obriga, irretratavelmente, a pagar ao intermediário financeiro um determinado número de prestações periódicas, por conta de uma importância global superior ao custo dos bens, cuja propriedade, ao término do contrato, pode ser transferida a título oneroso, do intermediário financeiro à empresa locatária, por iniciativa desta última.”

Já no que concerne à natureza jurídica do contrato[14], sem prejuízo das respeitadas opiniões transcritas no rodapé, esclarece-se que o contrato não é de locação, pois neste, ao contrário do que ocorre no leasing, o risco de perecimento corre por conta do proprietário (locador). Não é de reserva de domínio, pois existe a tríplice opção (renovar, devolver ou adquirir). E tampouco é de mútuo, já que não ocorre a transferência de propriedade. Conclui-se, então, tratar-se de contrato mercantil típico[15], bilateral, oneroso, sinalagmático (obrigações recíprocas), comutativo (obrigações equilibradas), em princípio intuitu personae (transferência só com o consentimento da outra parte) e misto ou híbrido.

4. Forma de contratação, fases e requisitos necessários

Atualmente, a operação se encontra bastante facilitada uma vez que, na busca de novos mercados, as instituições financeiras passaram a não mais aguardar de forma passiva o comparecimento dos consumidores com solicitações de financiamento mas, ao revés, começaram a se fazer presentes (através de prepostos ou convênios operacionais) em todas as grandes revendedoras e agências de automóveis, firmas de informática e mobiliário nas quais o cliente já preenche o contrato de leasing, apresentando documentação e ficando, apenas, no aguardo da confirmação de liberação de seu crédito com a instituição.

Entendendo se desdobrar a operação em cinco fases, assim explica Waldírio Bulgarelli:

“1. A preparatória, ou seja, a proposta do arrendatário à empresa deleasing ou vice versa; 2. Essencial, constituída pelo acordo de vontades entre ambas; 3. Complementar, em que a empresa de leasing compra o bem ou equipamento ajustado com o arrendatário; 4. Também essencial, que é o arrendamento propriamente dito, entregando a empresa de leasing ao arrendatário o bem ou equipamento; 5. A tríplice opção do usuário, ou seja, ao termo do contrato de arrendamento, continuar o arrendamento, dá-lo por terminado, ou adquirir o objeto do arrendamento, compensando as parcelas pagas a título de arrendamento e feita a depreciação.”[16]

Como bem expõe Caio Mário[17], o art. 5.º da Lei 6.099/1974 fixou os seguintes requisitos para o contrato de leasing: (a) prazo; (b) valor de cada contraprestação por períodos determinados, não superiores a um semestre; (c) opção de compra ou faculdade de renovação reconhecida ao arrendatário; (d) preço para opção de compra ou critério para sua fixação.

5. Tríplice opção ao término do contrato

A grande característica distintiva doleasing se dá ao término do prazo fixado, quando diferentemente dos demais contratos (financiamento, alienação fiduciária etc.), o arrendatário terá uma tríplice opção: renovar, devolver ou adquirir. Como menciona Marco Antônio Ibrahim: “(…) a cláusula potestativa que confere tríplice opção ao arrendatário é a verdadeira essentialia negotii por isso que fundamental para a higidez jurídica do contrato deleasing, dada sua tipicidade legal”.[18]

6. Estrutura do preço pago (contraprestação, VRG e VR)

Ensina José F. L. Miranda Leão[19], citado por Arnoldo Wald: “(…) o preço do arrendamento mercantil não se sujeita ao valor do bem arrendado, mas decorre de uma equação financeira em que são considerados o valor de aquisição do bem, o custo do capital investido e o lucro esperado pelo arrendador. Esta somatória deve ser equivalente à soma das contraprestações devidas pelo arrendatário com o valor residual do bem”.

Verifica-se, então, que, na composição do preço, são levados em consideração os seguintes aspectos: (a) valor de aquisição do bem; (b) custos de captação desses recursos; (c) despesas inerentes à operação; (d) depreciação do bem; (e) lucro da operação e (f) riscos do contrato.

Desta forma, visando cobrir o investimento e ainda proporcionar lucro, dividia-se o valor pago pelo arrendatário em (1) contraprestação e (2) valor residual (VR), sendo aquela referente à locação do veículo e este ao valor a ser efetivamente gasto, ao término do contrato, caso haja a opção de adquirir o bem.

Ocorre que, em razão da alta depreciação sofrida pelos veículos, passaram as instituições arrendadoras a não mais recuperar o valor investido (pago antecipadamente à revendedora) na operação, quando os arrendatários não ficavam com o bem, o que acontecia pelo exercício da opção ao término ou quando houvesse inadimplência durante o cumprimento do contrato.

Consertando tal situação, foram editadas as Portarias MF 564/1978 e 184/1984, seguidas pela Res. 980/1984 e, por fim, a Res. Bacen 2.309/1996[20], que estabeleciam uma nova espécie de valor residual, o chamado valor residual de garantia (adiante denominado apenas VRG), justamente para esses casos em que o arrendatário não ficasse com o bem.[21]

O que se estabeleceu, em verdade, foi uma nova função[22] para o VR que passou a ser tanto o preço contratualmente estipulado para exercício da opção de compra (VR), quanto o valor contratualmente garantido pelo arrendatário, como mínimo que será recebido pela arrendadora na venda a terceiros do bem arrendado, na hipótese de não ser exercida a opção de compra (VRG)[23]. Nesse caso, após a alienação (a um terceiro), o arrendatário pode ser chamado a “completar” o valor percebido na venda, até o montante garantido (VRG).

A distinção entre o VR e o VRG é óbvia na estrutura do contrato de leasing, já tendo, há bastante tempo, sido objeto de julgados proferidos por iterativa jurisprudência:

“(…) No contrato de leasing, o valor residual é o preço contratual estipulado para o exercício da opção de compra, enquanto o valor residual garantido é obrigação assumida pelo arrendatário, quando da contratação do arrendamento mercantil, no sentido de garantir que o arrendador receba, ao final do contrato, a quantia mínima final de liquidação do negócio, em caso de o arrendatário optar por não exercer seu direito de compra e, também, não desejar que o contrato seja prorrogado (…)” (STJ, REsp 249.340/SP, 4.ª T., j. 18.05.2000, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira).[24]

Também apontando a diferenciação assim escreveram Marco Antônio Ibrahim e Sergio Cavalieri Filho:

“Enquanto o valor residual vinculado ao preço pela opção de compra se destina a complementar o retorno do capital investido pela arrendadora na hipótese de opção pela compra, o VRG, ao revés, é resíduo exigível quando a opção não for pela compra, mas pela extinção do contrato. Isto é, ao fim da locação.”[25]

“(…) o VRG não se confunde com a opção de compra. Como se vê da sua própria definição normativa (Portaria MF 564/1978), trata-se de uma forma de o arrendatário garantir ao arrendador uma quantia mínima de amortização do valor residual do bem, caso, no final do contrato, não renove o arrendamento nem exerça a opção de compra.”[26]

E, ainda na mesma direção, a lição de Judith Martins-Costa:

“Se o arrendatário opta por adquirir o bem, esse ‘resíduo’ servirá para liquidar o valor da opção de compra, marcando, assim, a extinção da relação de leasing e o início da relação de compra e venda. Portanto, atua, nessa medida, não como garantia, mas como ‘o preço contratual estipulado para o exercício da opção de compra’ (conforme Portaria MF 564/1978), já que, feita essa opção, o arrendatário paga a diferença entre o que já amortizou e aquilo que o contrato estabelece como parâmetro, podendo este ser o saldo não depreciado ou o preço do bem.

Se, diversamente, o arrendatário opta por devolver o bem, a arrendadora deverá vendê-lo. A venda do veículo a terceiros não cobrirá, normalmente, o desgaste no bem, já que os bens – ainda que de consumo durável – se desgastam pelo uso, podendo esse desgaste levar inclusive à sua “extinção” do ponto de vista econômico. Se for um automóvel, por exemplo, haverá, ainda, despesas com a guarda do veículo, seu conserto, o anúncio da venda e toda a atividade correlata à pretendida alienação. Consequentemente, a função do VRG será a de atuar como uma garantia de preço mínimo, ou caução em dinheiro, instituída em prol do arrendador em vista dos riscos da obsolescência, risco esse que é do arrendatário, bem como os derivados de eventual inadimplência e, ainda, os referentes às despesas correlatas à guarda e conservação, assegurando igualmente o lucro, móvel de toda e qualquer atividade mercantil, de modo que o arrendador receba, por fim, valor equivalente ao capital empregado para a obtenção do bem junto ao fornecedor, acrescido dos interesses financeiros correspondentes.”[27]

Assim, verifica-se, com facilidade, a diferença existente entre opção de compra (VR) e a garantia de retorno do investimento (VRG), podendo-se concluir – ante a utilização de denominação comum – que há um valor residual com, no entanto, duas funções distintas.

7. Questões polêmicas. As verdades e as mentiras

7.1 Cobrança antecipada do valor residual – Solução final do E. STJ

De acordo com o que se acha estabelecido no art. 7.º da Res. CMN 2.309/1996[28], não haveria qualquer vedação em se antecipar, total ou parcialmente os valores estipulados a título de VR.

Todavia, voltando ao que foi afirmado quando da análise da natureza jurídica, pelo fato de a grande característica do contrato se fundar na possibilidade da tríplice escolha pelo arrendatário[29], parte da doutrina passou a entender que o pagamento antecipado do VR, terminaria por descaracterizar o contrato de leasing, vez que fustigava sua causa e principal razão de existência.

Defendendo a possibilidade da antecipação, posicionaram-se Ives Gandra da Silva Martins[30], Itamar Dutra[31], Athos Gusmão Carneiro[32], Rodolfo de Camargo Mancuso[33] e Neide Aparecida de Fátima Resende[34].

Em março de 1999, a SDE/MJ[35] editou a Portaria 3/1999 que, em aditamento ao rol enunciativo dos incisos do art. 51 do CDC (LGL\1990\40), dispunha, em seu item 15, sobre a nulidade das cláusulas que: “Estabeleçam, em contrato de arrendamento mercantil (leasing) a exigência do pagamento antecipado do Valor Residual Garantido (VRG), sem previsão de devolução desse montante, corrigido monetariamente, se não exercida a opção de compra do bem”.

Com isso, restou aumentada a tendência jurisprudencial de não admitir a antecipação sem que com isso se demudasse o contrato para compra e venda parcelada. No STJ, à época, apenas os Ministros Carlos Alberto Direito[36] e Ari Pargendler[37] (ambos da 3.ª T.) seguiam com posição dissonante, tendo sido, então, pacificada a questão no julgamento dos EDiv no REsp 230.239/RS[38], que serviu, inclusive, como precedente para edição, em maio de 2002, da Súmula 263:

“A cobrança antecipada do valor residual (VRG) descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil, transformando-o em compra e venda à prestação.”[39]

Tal posicionamento, adotado pelo STJ, que obviamente se proliferou através das decisões dos Tribunais locais, fez com que o número de contratos sofresse uma queda vertiginosa (vide gráficos abaixo)[40], o que levou as Instituições à interposição de centenas de recursos buscando a revisão do entendimento.

E, então, a discussão sobre a cobrança antecipada do VRG voltou à tona em maio de 2003, por ocasião do julgamento dos EDiv no REsp 213.828/RS[41], no qual a Corte Especial do STJ afastou o uso da Súmula 263, tendo sido a mesma cancelada pela 2.ª Seção em agosto daquele ano, quando do julgamento dos Recursos Especiais de n. 443.143/GO e 470.632/SP. Assim, em maio de 2004, uma nova súmula, a de n. 293, foi editada, com o seguinte teor: “A cobrança antecipada do valor residual garantido (VRG) não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil”.[42]

Atualmente, não há mais campo para essa polêmica, já existindo, inclusive Enunciados de Tribunais Estaduais[43] sobre o tema.

7.2 Impossibilidade de devolução do VRG antes da entrega do veículo

Já se verificou que, em alguns casos, os arrendatários manifestaram no curso do contrato a vontade de devolver o veículo ao término do período, isto é, antecipando o exercício de uma das escolhas possíveis e, com isso (mesmo na posse do veículo), pretendendo suspender o pagamento das parcelas vincendas do VRG e receber de volta aquelas anteriormente pagas.

Tal prática não está em conformidade com o pactuado e, muito menos, prevista na legislação de referência. Tendo se concluído pela licitude de ajuste contratual com cobrança de forma adiantada do VRG (o que se dá, normalmente, através de entrada e diluição do restante no mesmo número de parcelas da locação), a alteração em exame certamente violaria o princípio de que as partes devem respeitar in totum o pactuado, sem considerar que, por ter aceitado efetuar o adiantamento do VRG, o arrendatário acabou por negociar taxas de juros em patamares diferenciados[44].

Ponha-se em relevo que a questão não é tão simples. Mesmo antecipando o consumidor sua decisão de não ficar (no futuro) com o veículo, qual a garantia existente de que cumprirá seu dever de devolver o bem? Existe, além de sua vontade, o fator imprevisível e, nesse lapso temporal, o veículo pode se envolver em acidente (deterioração) ou ser alvo de furto/roubo.

Nesse sentido tem sido as decisões do STJ:

“Agravo no recurso especial. Ação de restituição de valores de contrato de arrendamento mercantil. Devolução do VRG. – É possível a devolução do VRG, pago antecipadamente, após a resolução do contrato de arrendamento mercantil e desde que restituído o bem na posse da arrendante. Precedentes. Agravo não provido” (STJ, AgRg no REsp 960.532/RJ, 3.ª T., j. 14.11.2007, rel. Min. Nancy Andrighi).[45]

“(…) Não tem amparo legal algum, determinar, na ação de reintegração de posse, que seja feita a devolução antecipada do VRG, sendo certo que, reintegrada a arrendadora na posse do bem, deve ela providenciar a venda do mesmo no mercado. A partir daí é que se vai cuidar da devolução do VRG, tudo na dependência do saldo. A devolução determinada no curso da ação de reintegração, sem mais nem menos, contamina a própria estrutura do contrato de arrendamento mercantil (…)” (STJ, REsp 294.779, 3.ª T., j. 04.02.2002, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito).

Conclui-se, então, que o ponto de partida para se tratar de eventual restituição de valores antecipados de VRG é a devolução do veículo à empresa arrendante.

7.3. Quando o VRG pode/deve ser devolvido

Estabelecida no item 6 supra a premissa de que o VRG não se confunde com opção de compra, passa-se a explicar em que momento e condições se torna possível a devolução dos valores adiantados pelo consumidor. Para tanto, faz-se necessária uma divisão de acordo com a situação do contrato, cumprido ou não cumprido (adimplente ou inadimplente), esclarecendo-se que o termo “cumprido” se refere ao prazo estipulado para o término do contrato.

7.3.1 Contrato cumprido com todas as parcelas adimplidas

Terminado o contrato, deve o arrendatário, em caso de não optar por ficar com o bem, devolvê-lo à arrendadora e esta, na forma do contrato e da lei regente, alienar o veículo em leilão, com vistas a obter o maior valor possível. Feito isso, deve realizar-se o encontro das contas. De um lado o valor estipulado pelas partes como valor mínimo de garantia (que é o próprio VRG) e de outro a soma dos valores antecipados com o produto da venda do bem.

Sobre a questão, assim ensina Antônio Flavio Leite Galvão:

“O raciocínio acerca da devolução do VRG antecipado não pode ser desenvolvido da maneira simplista, a exemplo de que vem sendo feito por alguns operadores de direito que assim pensam: o arrendatário, em razão da reintegração de posse, não adquiriu o bem, logo a empresa de leasing deve lhe devolver referido VRG.

A esse raciocínio falta uma premissa: a operação de leasing, não é de mero arrendamento, mas, sim, de arrendamento mercantil financeiro.

Isso significa que a empresa de leasing deve recuperar, no mínimo, o valor (atualizado) que despendeu (capital aplicado) para adquirir o bem indicado pelo arrendatário, acrescido das contraprestações mensais não pagas e, ainda, ser ressarcida das despesas, antes de a ele fazer a devolução de qualquer numerário, a que título for. (…)

Somente na hipótese em que a soma dos valores recebidos pela empresa de leasing ultrapasse o montante dos valores por ela suportados para a realização da operação e sua posterior rescisão, é que deverá haver a devolução ao arrendatário da quantia que vier a sobejar.”[46]

Neste exato diapasão, a lição de Marco Antônio Ibrahim:

“Assim, se ao final do contrato a arrendatária optar pela devolução do bem arrendado, deverá aguardar que a empresa efetive a venda do bem. Se o valor da venda for inferior ao valor residual garantido (VRG) estipulado, a arrendatária ficará obrigada pela diferença entre este e o valor da venda, haja vista que é da essência do leasing financeiro a recuperação, pelo arrendador, da totalidade do capital empregado na aquisição do bem arrendado durante o prazo contratual da operação, e adicionalmente, obtenha um retorno sobre os recursos investidos (art. 5.º, I, do Anexo à Res. Bacen 2.309/1996).”[47]

Entendimento este que encontrou aceitação em julgamentos do STJ[48] e também nas Câmaras Cíveis do TJRJ:

“(…) Nem se diga que o arrendatário, na hipótese de adiantamento do VRG, sofra prejuízo irreparável. Ao final do contrato, mesmo que não seja efetuado o referido adiantamento, deverá pagar à arrendadora a diferença entre o VRG e o valor obtido da venda do bem a terceiros, quando este for inferior àquele . Optando, entretanto, pela compra, já terá quitado a importância necessária, não precisando desembolsar qualquer valor” (STJ, REsp 213.828/RS, 3.ª T., j. 16.11.2000, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito).

“(…) só caberá devolução do valor residual garantido e consequente compensação se a quantia obtida com a venda do bem a terceiro for superior ao valor pago antecipadamente pelo arrendante” (STJ, REsp 373.674/PR, 3.ª T., j. 29.06.2004, voto-vista da Min. Nancy Andrighi).

“Apelação cível. Rito sumário. Ação de reintegração de posse. Contrato de arrendamento mercantil. Rescisão do negócio jurídico. Pagamento antecipado do valor residual garantido. Sentença que determinou a devolução do VRG pago antecipadamente pela demandada. Insurgência da arrendante neste tocante. Acolhimento de sua irresignação diante das vicissitudes do contrato de arrendamento mercantil. Pagamento antecipado do valor residual garantido que possui efeito de garantia de ressarcimento ao arrendante do valor despendido para a aquisição do bem, para que ao final do contrato receba a quantia mínima final de liquidação do negócio. De tal forma, impõe-se a devolução do valor residual garantido no que sobejar da venda do objeto do contrato. Recurso a que se dá provimento” (TJRJ, Ap 0006202-22.2009.8.19.0212, 8.ª Câm. Civ., j. 08.02.2011, rel. Des. Luiz Felipe Francisco).

“Apelação cível. Reintegração de posse. Arrendamento mercantil. Pedido contraposto . Devolução do VRG em razão da rescisão do contrato. Possibilidade. Necessidade de reforma parcial da sentença. (…) 4. O contrato de leasing confere ao arrendatário três possibilidades ao final do ajuste: a devolução do bem, extinguindo-se a relação contratual, sua compra ou a sua renovação. 5. O valor residual garantido é para assegurar a importância que o bem deverá ter no fim do contrato, já previamente estabelecido pelas partes, a fim de perfazer o preço final de aquisição do mesmo, pago de forma acoplada e diluída às prestações periódicas. 6. Tendo em vista que com a rescisão do contrato, extirpa-se do arrendatário seu direito a uma manifestação futura de intenção de compra do bem, deve ser devolvido o valor pago a título de VRG. Precedentes do STJ. 7. Necessidade de se ressalvar o entendimento adotado pelo voto vencedor proferido pelo e. Min. Edson Vidigal quando do julgamento do REsp 213.828, pela Corte Especial, no sentido de que somente será possível a devolução do VRG quando o valor obtido com a venda do bem a terceiro for igual ou superior a quantia paga antecipadamente pelo arrendatário. 8. Desprovimento do recurso” (TJRJ, Ap 0002742-77.2008.8.19.0045, 8.ª Câm. Civ., j. 29.03.2011, rel. Des. Monica Di Piero).

“Apelação. Arrendamento mercantil. Rescisão do contrato. Devolução do VRG pago antecipadamente. Impossibilidade. Sendo o VRG uma garantia de renda mínima dada ao arrendante pelo arrendatário, caso não ocorra a opção da compra, somente após a venda do bem a terceiros é que se poderá aferir a existência de eventual crédito ou débito em favor ou em prejuízo do arrendatário” (TJRJ, Ap 2003.001.36649, 13.ª Câm., j. 18.02.2004, rel. Des. José de Samuel Marques)[49].

Nos casos em que o contrato é cumprido até o seu final, terá o arrendatário pago, invariavelmente, todo o valor estipulado como garantia (VRG) e, portanto, receberá como devolução o valor auferido com a alienação do veículo. Essa é a forma prescrita no contrato e deverá ser respeitada. Entender de maneira diversa, ou seja, devolver ao consumidor o valor total antecipado e deixar a empresa arrendante com o produto da alienação seria por demais perverso, vez que, lembre-se, a empresa investiu (pagando à vendedora do veículo) o valor do bem na data do início do contrato e, por isso, não poderia recebê-lo, muitos meses depois, totalmente depreciado (pelo tempo).

Explica-se a questão através do seguinte exemplo (com valores reais retirados da Tabela Fipe)[50]: 49 Em abril de 2006, Caio celebrou contrato de leasing com o Banco XYZ, tendo como objeto um veículo Volkswagen Gol City, Mi, TotalFlex, zero Km. Para tanto, o Banco pagou à loja de veículos o preço do bem, R$ 26.180,00 e o arrendatário comprometeu-se a pagar 60 parcelas mensais acompanhadas da antecipação do VRG (60 vezes 1/60 do valor do veículo, ou seja, R$ 436,33). Caio cumpriu o contrato e, ao longo dos cinco anos, pagou todas as parcelas mas, ao término do contrato, em abril de 2011, optou por devolver o veículo à empresa e receber de volta todos os valores pagos pela antecipação do VRG. Ocorre que, em abril de 2011 o veículo não vale mais o valor pago pela arrendante e sim R$ 18.476,00. Some-se a isso o fato (notório) de que nos leilões os veículos sofrem depreciação de 20 a 40%. Assim, utilizando-se uma perda média de 30%, o valor auferido na venda seria de R$ 12.933,20, ou seja, bem distante do investimento inicial.

InvestimentoRecuperados
Valor do veículo (valor do VRG)R$ 26.180,00
VRG pago durante o contratoR$ 26.180,00 (60 x R$ 436,33)
Valor recuperado (leilão do carro)R$ 12.933,20
Resultado da operação(-) R$ 13.246,80

E, por fim, não se diga que tal depreciação é calculada como custo do investimento e inserida no valor das parcelas da locação pois, como se sabe, além do baixo custo (talvez uma das operações com menores taxas do mercado) aquelas remuneram, tão somente, o custo (financeiro) do empréstimo, vez que se trata de leasing financeiro.[51]

7.3.2 Contrato resolvido antes do prazo estipulado

Por vezes, o arrendatário não consegue cumprir sua obrigação contratual até o fim, tornando-se inadimplente ou, mesmo estando em dia com as parcelas, decide encerrar o contrato e devolver o veículo ao arrendador antes do prazo.

Quando isso ocorre, na mesma forma do que foi exposto no item anterior, o bem é reintegrado ao arrendante, que deverá vendê-lo a quem oferecer o melhor preço (leilão) e, então, após a transformação do bem recuperado em dinheiro, passa-se à fase da “prestação das contas” com o intuito de averiguar-se a existência de crédito ou dívida do arrendatário.

“(…) Não tem amparo legal algum, determinar, na ação de reintegração de posse, que seja feita a devolução antecipada do VRG, sendo certo que, reintegrada a arrendadora na posse do bem, deve ela providenciar a venda do mesmo no mercado. A partir daí é que se vai cuidar da devolução do VRG, tudo na dependência do saldo. A devolução determinada no curso da ação de reintegração, sem mais nem menos, contamina a própria estrutura do contrato de arrendamento mercantil (…)” (STJ, REsp 294.779, 3.ª T., j. 04.02.2002, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito).

Nesse caso, considerado o aspecto econômico, se de um lado o veículo ainda possui valor maior do que o previsto ao término do contrato (pelo menor interregno entre aquisição e devolução), de outro, o valor do VRG não terá sido quitado, justamente por existir parcelas em aberto. Surgem, então, situações absurdas a justificar a máxima cautela na análise da questão.

Utilize-se, como exemplo, precedente proveniente de ação tramitada no XXVII Juizado Especial Cível da Comarca da Capital do Rio de Janeiro[52], em que o autor celebrara, em 16.03.2010, um contrato de leasing de um veículo avaliado em R$ 33.300,00[53] (valor pago à loja) cujo preço foi parcelado da seguinte forma: (a) R$ 8.000,00 de adiantamento do VRG; (b) 60 parcelas mensais de R$ 491,83 e (c) 60 parcelas mensais de R$ 421,66 a título de adiantamento do VRG. Nesse caso, o VRG, semelhante ao valor do veículo, foi fixado em R$ 33.300,00 (soma dos itens a e c). Alegando problemas particulares, o consumidor pagou apenas a primeira parcela e somente veio a devolver o veículo em janeiro de 2011, tendo o mesmo sido leiloado e, em razão do estado no qual se encontrava[54], alcançou apenas o valor de R$ 16.971,91[55].

A conta, simplificada pela ausência das atualizações monetárias, é a seguinte:

InvestimentoRecuperados
Valor do Veículo = VRG R$ 33.300,00
VRG pago à vista (vide contrato)R$ 8.000,00
VRG pago durante o contratoR$ 421,66 (1 x R$ 421,66)
Parcela paga durante o contratoR$ 491,83 (1 x R$ 491,83)
Valor recuperado com leilão do carroR$ 16.971,91
Resultado da operação (-) R$ 7.414,60

Mas, assim como se verifica usualmente nas ações promovidas em face das empresas arrendantes, o arrendatário pretendia desmontar a estrutura do contrato assinado e receber de volta os valores pagos a título de adiantamento do VRG. Nesse caso a conta seria a seguinte:

InvestimentoRecuperados
Valor do veículo = R$ 33.300,00
Parcela paga durante o contratoR$ 491,83 (1 x R$ 491,83)
Valor recuperado com leilão do carroR$ 16.971,91
Resultado da operação (-) R$ 15.836,26

E, como o valor recuperado no leilão do carro foi pago pelo novo adquirente, forçosamente se conclui que, caso fosse adotada a absurda tese de devolução do VRG, pelo simples fato do não exercício da opção de compra, o consumidor teria pago a bagatela de R$ 491,83 para ficar no uso e posse do veículo durante longos 10 meses, equivalente a menos de R$ 50,00 mensais como despesa pelo uso do carro.

Talvez, pela frieza dos números se consiga demonstrar que, conforme já reconhecido de modo expresso pelo E. STJ[56], a natureza do VRG não é exclusivamente de antecipação da opção de compra do bem, ostentando – de acordo com a destinação do veículo – natureza diversa, de garantia de recebimento de um valor mínimo para evitar significativo prejuízo da arrendadora com a operação.

7.4 O VRG como forma de pagamento (compensação) do saldo devedor

Se de um lado há enorme controvérsia e dificuldade para se entender e aceitar que o VRG possui função garantidora, de outro, não há qualquer dúvida em classificá-lo como forma de pagamento, lembrando-se que para a maioria dos operadores do direito, o VRG seria sinônimo de opção de compra (numa clara confusão conceitual com o VR – valor residual).[57]

Assim, quando o contrato não chega ao seu fim em razão de descumprimento da obrigação pelo arrendatário, gerando débitos referentes às parcelas mensais, tal valor (crédito da empresa arrendadora) deve ser abatido do montante arrecadado a título de VRG.

Tal entendimento encontra amparo em pacificada jurisprudência do STJ:

“Civil e processual. Recurso especial. Agravo. Arrendamento mercantil. Resolução do contrato. VRG. Devolução ou compensação. Possibilidade. Precedentes . Improvimento. I. Com a resolução do contrato e a reintegração do bem na posse da arrendadora, possível a devolução dos valores pagos a título de VRG à arrendatária ou sua compensação com o débito remanescente. Precedentes. II. Agravo improvido” ( AgRg no REsp 601.175/SP, 4.ª T., j. 29.06.2006, rel. Min. Aldir Passarinho Junior, p. 274).[58]

7.5 Argumentação equivocada de ocorrer enriquecimento sem causa dos arrendantes nos casos de retenção do VRG

É muito comum encontrar decisões que determinam a devolução do VRG escoradas na seguinte fundamentação:

“(…) se o consumidor pagava o VRG de modo adiantado e, independentemente da motivação, não vai ficar com o veículo, que foi devolvido ao Banco, nada mais natural que o recebimento desses valores, sob pena de enriquecimento sem causa da instituição financeira (…).”

Esta, talvez, seja a maior de todas as falácias. O argumento é simplista e não se sustenta diante da análise técnica do contrato e da correta configuração da função do VRG.

Como já se demonstrou, o VRG não possui a exclusiva função de “antecipação da opção de compra”, devendo ser, também, entendido como garantia de valor mínimo a ser recebido caso o arrendatário não fique com o veículo.[59]

As conclusões do parágrafo acima, somadas aos exemplos descritos nos itens 7.3.2 e 7.3.3, já servem para demonstrar que o enriquecimento seria do arrendatário, uma vez que o mencionado argumento, em verdade, incentiva o descumprimento do contrato, tendo em vista que, após a retomada do bem, será, ainda, ao arrendatário restituído o valor do VRG. Evidente, pois, que, durante o período de uso e gozo do bem, terá pago apenas a parcela relativa à contraprestação, o que tornaria o leasing um contrato de aluguel sem prazo determinado e de custo bastante inferior ao praticado por outro modo de financiamento.

E, sobre a demonstração de que não ocorre tal “lucro indevido”, assim leciona Antonio Flávio Leite Galvão:

“Apesar de não ser do gosto dos advogados e de, até mesmo, parecer não ser de boa técnica processual, não há como deixar de se fazer essa demonstração em Juízo, caso a caso, sob pena do arrendamento mercantil financeiro ser visto como uma autêntica “caixa preta” que, intencionalmente, não é aberta para encobrir indevido lucro da empresa de leasing que, duplamente, se beneficia da anormal situação de rescisão contratual, ou seja, com a reintegração de posse (retomando o bem) e com a apropriação do VRG antecipado (não o devolvendo), quando, no mais das vezes, inexiste, na realidade, tal lucro, havendo sim, prejuízo com o inadimplemento do contrato, eis que, sequer o valor de custo/aquisição do bem, acrescido das contraprestações mensais não pagas até a data da reintegração de posse e das despesas, é recuperado.”

Outro argumento bastante explorado pelos arrendatários é o de que o veículo “voltou ao patrimônio do arrendador”. Este, com o devido respeito àqueles que o utilizam, não resiste a um singelo raciocínio, pois, a uma, o veículo nunca saíra do patrimônio da instituição financeira, que figurava como proprietária-locadora e, a duas, o veículo obrigatoriamente deixará o patrimônio da arrendadora por causa da obrigatoriedade de levá-lo à leilão, para posterior “prestação de contas”.

O que não pode ser desconsiderado – sob pena de equivocada inversão de papéis – é o fato de que a instituição financeira cumpre com sua obrigação, de forma integral, no início do contrato, quando adquire (pagando o preço à revendedora) o veículo escolhido pelo arrendatário e, que o problema referente ao VRG somente se dá quando este rompe o acordado e deixa de cumprir a sua única obrigação: pagar as parcelas do contrato até o seu término.

8. Síntese e proposições

Tendo passado pelas questões históricas, conceito, natureza jurídica, formas de efetuação, fases, estrutura de preço e, ainda, analisado as questões mais polêmicas acerca do VRG, finaliza-se o presente artigo com a proposição das seguintes verdades e mentiras:

Mentiras:

– A antecipação do pagamento de VRG desconfigura o contrato e o transforma em simples compra a prazo.

– A restituição dos valores adiantados a título de VRG é consequência lógica da devolução do veículo à empresa arrendante.

– A empresa arrendante enriquece imotivadamente quando recebe de volta o veículo e não retorna os valores percebidos como VRG adiantado.

Verdades:

– O VRG não se confunde com a opção de compra.[60]

– O VRG possui a natureza de garantia de retorno e se constitui em elemento ínsito ao equilíbrio do contrato, pois, se de um lado assegura ao arrendador o recebimento de um valor previamente ajustado com o arrendatário, de outro dá a este último a garantia de que nada mais lhe será cobrado, ao final do contrato, acaso opte pela aquisição do bem

Eventual devolução de VRG somente poderá ser paga após alienação e “acerto de contas”.

– São nulas as cláusulas que estipulam a “perda” dos valores pagos a título de VRG, devendo as referidas quantias servir como parte do pagamento do preço em caso de escolha (do arrendatário) pela aquisição do bem, ou, serem utilizadas no “acerto de contas”;

– É possível a compensação dos valores pagos a título de VRG com o débito remanescente do contrato.[61]

9. Conclusão

Ante o exposto e, diante das complexidades e peculiaridades do assunto, fica a certeza de que o mesmo vem sendo incorretamente analisado por grande parte da jurisprudência pátria que insiste em considerar o VRG unicamente como opção de compra, olvidando-se de que o arrendamento mercantil é financeiro e, justamente por isso, o VRG desempenha, também, função de garantia de retorno.


[1] Desembargador aposentado do TJRJ. Consultor jurídico
[2] “Leasing, do inglês norte-americano, é composto do sufixo ing, que exprime ação verbal, e do verbo to lease, traduzido como ato de alugar ou arrendar. O locador é o lessor, e o locatário o lessee. No Brasil, chamado de arrendamento mercantil, as partes são o arrendante, ou arrendador, e o arrendatário. Numa tentativa de aportuguesar, Bulgarelli sugere lísingue. Em termos de tradução, sugiro lísin, com todo o respeito ao mestre. Mas parece que devemos ficar mesmo é com o original leasing, inclusive em termos de marketing (Irineu Mariani. Leasing em Tópicos. Revista da Ajuris. vol. 26. n. 79. p. 125-147. Porto Alegre: Ajuris, set. 2000). No presente texto, a denominação leasing foi adotada como correta.
[3] Fábio Konder Comparato. Contrato de Leasing. Revista dos Tribunais 389/10 . São Paulo: Ed. RT, 1968.
[4] Arnoldo Wald, em interessantíssimo artigo denominado “Histórico e desenvolvimento doleasing“ ( Revista Forense. vol. 250. ano 71. p. 14-26. Rio de Janeiro: Forense, 1975) aponta que, para os autores que consideram o referido contrato como forma peculiar de locação, a origem do instituto remonta à antiguidade”. Outros, como por exemplo Ivo Teixeira Gico Júnior (Elementos do contrato de arrendamento mercantil e a propriedade do arrendatário, texto colhido da internet, do site Jus Navigandi. [http://jus.com.br/revista/texto/627/elementos-do-contrato-de-arrendamento-mercantil-leasing-e-a-propriedade-do-arre afirmam que tais posições estão equivocadas pois o leasing teria surgido recentemente como forma de equacionar o problema de algumas empresas que necessitavam de financiamento sem, no entanto, desmobilizar seu capital. Para Irineu Mariani (op. cit., p. 125): “No Direito contemporâneo, surgiu na década de 1890, na Inglaterra, a hire-purchase (locação-compra), contrato praticado com máquinas de costura pela Singer, e também pelas fábricas de vagões de locomotivas. Merecedora de maior crédito é a corrente que aponta o renting, surgido no Estados Unidos na década de 20 como verdadeiro antecessor do leasing. No renting os deveres do locador haviam sido ampliados, uma vez que neste também havia a garantia de assistência técnica, revisões, consertos etc.
[5] Arnoldo Wald. Op. cit., p. 15.
[6] Em 25.09.1970 foi fundada a Abel – Associação Brasileira das Empresas de Leasing, que tinha (como continua tendo), entre seus objetivos, justamente explicar, difundir a prática e estabelecer o aperfeiçoamento da legislação sobre a matéria.
[7] Segundo noticia Caio Mário da Silva Pereira em seu excelente artigo Leasing (arrendamento mercantil), publicado na Revista Forense 287. Rio de Janeiro: Forense, 1984: “Para se ter a ideia do desenvolvimento desta atividade, basta lembrar que, em 1973 tínhamos 620 milhões em leasing; em 1974, passamos à casa de um bilhão; e já em 1975 marchávamos para três bilhões; em 1978, vencíamos a barreira de 11 bilhões. Já tendo dados à mão, posso dizer a quanto orça o movimento atual, um bilhão e quinhentos milhões de dólares”.
[8] Lei 6.099/1974, redação anterior: Art. 1.º: “O tratamento tributário das operações de arrendamento mercantil reger-se-á pelas disposições desta Lei. Parágrafo único. Considera-se arrendamento mercantil a operação realizada entre pessoas jurídicas, que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos a terceiros pela arrendadora, para fins de uso próprio da arrendatária e que atendam às especificações desta”.
[9] Ressalte-se a importância da Lei 7.132/1983 que alterou o conceito da legislação anterior, vindo a permitir a celebração do contrato de arrendamento entre uma instituição financeira e uma pessoa física, o que antes era impossível. Dispõe o artigo da Lei nova: “Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta Lei, o negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária, e para uso próprio desta”.
[10] Colhe-se do site do Banco Central – Bacen [www.bcb.gov.br/?LEASINGFAQ] a seguinte explicação: “Oleasing é um contrato denominado na legislação brasileira como ‘arrendamento mercantil’. As partes desse contrato são denominadas ‘arrendador’ e ‘arrendatário’, conforme sejam, de um lado, um banco ou sociedade de arrendamento mercantil e, de outro, o cliente. O objeto do contrato é a aquisição, por parte do arrendador, de bem escolhido pelo arrendatário para sua utilização. O arrendador é, portanto, o proprietário do bem, sendo que a posse e o usufruto, durante a vigência do contrato, são do arrendatário. O contrato de arrendamento mercantil pode prever ou não a opção de compra, pelo arrendatário, do bem de propriedade do arrendador.”
[11] “Envolvendo uma operação financeira, forçoso é ressaltar que onomen iuris – arrendamento mercantil – não é adequado. Melhor seria designá-lo de arrendamento financeiro” (Álvaro Antônio Sagulo Borges de Aquino. Leasing – Responsabilidade civil. Revista Forense 324/5. Rio de Janeiro: Forense, 1993); “No seminário realizado pelo Idort em São Paulo, Ary Oswaldo Mattos Filho exclamava: ‘de maneira arbitrária o leasing para mim é arrendamento. Aqueles que encontrarem uma palavra melhor para batizar esse cristão não batizado ainda, estejam à vontade’” (Waldírio Bulgarelli. Contratos mercantis. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1986).
[12] Roberto Ruozi. Il leasing (p. 23) apud Álvaro Antônio Sagulo Borges de Aquino, op. cit.
[13] Álvaro Antônio Sagulo Borges de Aquino, op. cit., p. 6.
[14] Ivo Teixeira Gico Junior no já comentado artigo Elementos do contrato de arrendamento mercantil e a propriedade do arrendatário (texto colhido da Internet do site Jus Navigandi [http://jus.com.br/revista/texto/627/elementos-do-contrato-de-arrendamento-mercantil-leasing-e-a-propriedade-do-arre sintetiza brilhantemente várias outras posições: “J. A Penalva Santos (Revista Forense. vol. 250. Ano 71. p. 47. Rio de Janeiro: Forense, abr.-jun. 1975) seguindo transição civilista, caracterizou-o como sendo complexo, sinalagmático, composto de um financiamento e arrendamento de bens, com cláusula de opção tríplice; Waldírio Bulgarelli (Contratos mercantis. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 375) entende que é “um contrato consensual, bilateral, oneroso, e de execução sucessiva, e firmado intuitu personae“; Arnaldo Rizzardo (Leasing –Arrendamento mercantil no direito brasileiro. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 1997, p. 147) o vê como “um contrato de natureza econômica e financeira, pelo qual a empresa cede em locação a outrem um bem móvel ou imóvel, mediante o pagamento de determinado preço”; Caio Mário (Instituições de direito civil . 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, vol. 3, p. 147) é “uma espécie de ‘locação-venda’ (locatio mixta cum vendiotione)”; Paulo Roberto Tavares Paes ( Leasing. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1993, p. 21) admite a natureza “complexa, abrangendo uma locação, uma compra e venda (que não é essencial do leasing, pois existe sem essa opção, eventualmente um mandato; Arnoldo Wald (A introdução do leasing no Brasil. Revista dos Tribunais 415/10. São Paulo: Ed. RT, 1970) diz que “Trata-se, na realidade, de uma fórmula intermediária entre a compra e venda e a locação, exercendo função parecida com a venda com reserva de domínio e com a alienação fiduciária, embora oferecendo ao utilizador do bem, maior leque de alternativas no caso de não querer ficar com a propriedade do equipamento após um primeiro prazo de utilização. Em caminho um pouco diverso, Orlando Gomes (Contratos. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 569-570), apesar de reconhecer tratar-se de “uma operação financeira destinada a proporcionar aos empresários o acesso aos bens de produção”, o caracteriza como um contrato “mais próximo da locação, cujas regras se lhe aplicam se não há próprias, sendo a distinção entre ambos fundamentalmente causal, mas sendo ambos conteúdo semelhante”. Outra posição interessante é a dos que defendem ser um contrato complexo por conter elementos de outros contratos típicos como locação, a promessa de compra e venda, a compra e venda a prestação e o financiamento, todos coligados (Carlos Antônio Farias de Souza. Contratos de Leasing. Revista Informatizada Data Venia. n. 21. ano IV. p. 2, jan. 1999.). Há posições ainda mais curiosas e isoladas, mas não menos importantes, como a de Washington Luiz da Trindade (Leasing: negócio jurídico fiduciário, 1974, p. 67), que exalta exageradamente a garantia real que representa o contrato de modo a resumi-lo em um dito aspecto fiduciário. Para ele o leasing, pela sua visível base fiduciária, distingui-se de outros negócios complexos, não precisamente pela locação, mas pela administração e utilidade produtiva de coisa alheia, em proveito do instituidor ou de uma entidade financiadora, e de cuja administração o contrato retira o seu benefício ou vantagem, inclusive pela cláusula de opção de venda, fazendo-a e movimentando-a juridicamente, para ter a livre disposição da coisa inicialmente locada.”
[15] Embora não conte com disciplina específica no regramento civil, possui norma tratando de seu enquadramento tributário ( Lei 6.099/1974 com a redação alterada pela Lei 7.132/1983), além de diversas resoluções do Conselho Monetário Nacional ( Res. CMN 2.309/1996, 2.465/1998, 2.595/1999, 2.659/1999 e 3.175/2004) e portarias do Ministério da Fazenda (Portarias MF 564/1978 e 140/1984)
[16] Waldírio Bulgarelli. Op. cit., 4. ed., p. 353.
[17] Caio Mário da Silva Pereira. Leasing (arrendamento mercantil) cit., p. 9.
[18] Marco Antônio Ibrahim. A diferença entre VRG e preço da opção de compra no contrato de leasing e sua descaracterização pela antecipação do valor residual. Revista de Direito, vol. 50, p. 64, 2002.
[19] José F. L. Miranda Leão. Leasing financeiro. Publicado no site: [www.direitobancario.com.br]. Acesso em: dez. 2001.
[20] Res. Bacen 2.309/1996: “Art. 7.º Os contratos de arrendamento mercantil devem ser formalizados por instrumento público ou particular, contendo, no mínimo, as especificações abaixo relacionadas: (…) VII – as despesas e os encargos adicionais, inclusive despesas de assistência técnica, manutenção e serviços inerentes a operacionalidade dos bens arrendados, admitindo-se, ainda, para o arrendamento mercantil financeiro: a) a previsão de a arrendatária pagar valor residual garantido em qualquer momento durante a vigência do contrato, não caracterizando o pagamento do valor residual garantido o exercício da opção de compra; b) o reajuste do preço estabelecido para a opção de compra e o valor residual garantido”.
[21] Sobre o assunto, recomenda-se a leitura de excelente artigo publicado na Revista de Direito do TJRJ 50/63-70, de autoria do Magistrado Marco Antônio Ibrahim (A diferença entre VRG e preço da opção de compra no contrato de leasing e sua descaracterização pela antecipação do valor residual).
[22] Adotando essa posição, Athos Gusmão Carneiro (O contrato de leasing financeiro e as ações revisionais. Revista de Direito Bancário e Mercado de Capitais 2/11. São Paulo: Ed. RT, maio 1998, item 32) e Judith Martins-Costa (Os contratos de leasing financeiro, a qualificação jurídica da parcela denominada valor residual garantido – VRG e a sua dupla função: complementação de preço e garantia, Revista de Direito Bancário e Mercado de Capitais 49/134. São Paulo: Ed. RT, jul. 2010).
[23] “Encontra-se, assim, no valor residual, uma dupla função, pois a figura se biparte funcionalmente, só se podendo especificar qual delas será atuada quando do exercício, pelo arrendatário, do direito formativo de escolha entre as alternativas ‘comprar o bem’ ou ‘devolver o bem’” (Judith Martins-Costa, op. cit., p. 134).
[24] Consta do Voto: “Assim,opção de compra é o direito potestativo do arrendatário de, ao final do contrato, consolidar em si o domínio e a posse indireta do bem, enquantovalor residual é o preço contratual estipulado para o exercício da opção de compra, que deve constar expressamente do contrato (ou o critério para sua fixação), conforme prevê o art. 5.º, d, da Lei 6.099/1974”.
[25] Marco Antônio Ibrahim. Op. cit., p. 65.
[26] Sergio Cavalieri Filho. Programa de direito do consumidor. São Paulo: Atlas, 2008. p. 191.
[27] Judith Martins-Costa. Op. cit., p. 133.
[28] Vide nota de rodapé 19.
[29] “Fábio Konder Comparato, expondo entendimento diverso daquele que apresentara por ocasião de seu pioneiro estudo ( RT 389/7 , publicado em 1968 e, portanto, antes da promulgação da Lei 6.099/1974) destaca que a verdadeira causa, o escopo permanente do negócio, em todos os casos é justamente essa alternativa deixada à escolha do arrendatário. É ela, como elemento in obligatione – e não apenas in executione – que diferencia substancialmente o leasing de todos os demais negócios jurídicos típicos” (Ibrahim, Marco Antônio. Op. cit., p. 64).
[30] Ives Gandra da Silva Martins. As operações de arrendamento mercantil e a natureza jurídica do instituto à luz do Direito tributário – Parecer. Revista LTr 59/312. São Paulo: Ed. LTr, sem data.
[31] Itamar Dutra. Leasing – Perdas e danos. São Paulo: Solivros, 1997. p. 21.
[32] Athos Gusmão Carneiro. Op. cit., p. 30.
[33] Rodolfo de Camargo Mancuso. Leasing. RT 199/155 . São Paulo: Ed. RT, 1952.
[34] Neide Aparecida de Fátima Resende. O leasing financeiro no Código de Defesa do Consumidor (LGL\1990\40). São Paulo: Saraiva, 2001. p. 60.
[35] Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça.
[36] “1. A jurisprudência das Turmas que compõem a 2.ª Seção, ressalvada a minha posição, firmou-se no sentido de que a cobrança antecipada do valor residual garantido (VRG) desqualifica o contrato de leasing para compra e venda, o que inviabiliza não só o deferimento de liminar, mas, também, a própria ação de reintegração de posse. 2. A descaracterização do contrato de leasing para compra e venda, tema devidamente prequestionado, conduz ao julgamento de extinção do processo por impossibilidade jurídica do pedido reintegratório, presente o art. 267, VI, § 3.º, do CPC (LGL\1973\5). 3. Recurso especial conhecido e provido” (STJ, REsp 302.448/SP, 3.ª T., j. 26.06.2001, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito).
[37] “Contrato deleasing. Valor residual de garantia. A cobrança antecipada do VRG não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil para compra e venda. Juros. Limitação. Nulidade. A disposição do Dec. 22.626/1933, limitativa da taxa de juros, não se aplica às instituições financeiras, podendo aquela ser restringida por determinação do Conselho Monetário Nacional. Incidência da Súmula 596 (MIX\2010\2319) do STF. Interpretação da Lei 4.595/1964” (STJ, REsp 164.918/RS, 3.ª T., j. 03.08.2000, rel. p/ acórdão Min. Ari Pargendler).
[38] “Embargos de divergência. Processo civil e civil. Arrendamento mercantil . Leasing financeiro. Ação de revisão contratual. Demudação do contrato pelo pagamento antecipado do ‘valor residual garantido‘. Compra e venda a prestações. Art. 11, § 1.º, da Lei 6.099/1974. Item 15 da Portaria n. 3, de 19.03.1999, da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Arts. 6.º, I, e 10 da Res. Bacen 2.309, de 28.08.1996. Ausência de limitação de juros de 12% a.a. Legalidade dos juros contratuais pactuados. Súmula 168 (MIX\2010\1421) do STJ. – Pacificada a tese de que a obrigação contratual de antecipação do VRG – ou o adiantamento ‘da parcela paga a título de preço de aquisição’ – faz infletir sobre o contrato o disposto no § 1.º do art. 11 da Lei 6.099/1974, operando demudação, ope legis, no contrato de arrendamento mercantil para uma operação de compra e venda a prestação, com financiamento, cabe o indeferimento liminar de embargos de divergência, pela Súmula 168 (MIX\2010\1421) do STJ. – Há o desaparecimento da figura da promessa unilateral de venda e da respectiva opção, porque imposta a obrigação de compra desde o início da execução do contrato ao arrendatário” (STJ, AgRg nos EDiv no REsp 230.239/RS, 2.ª Seção, j. 23.05.2001, rel. Min. Nancy Andrighi).
[39] São os seguintes os outros precedentes da Súmula 263 (MIX\2010\1513) do STJ: REsp 172.432/RS, j. 16.11.1999, rel. Min. César Asfor Rocha; REsp 181.095/RS, j. 18.03.1999, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar; STJ, REsp 196.209/RS, 3.ª T., j. 09.11.1999, rel. Min. Waldemar Zveiter; STJ, REsp 196.873/RS, 4.ª T., j. 19.10.2000, rel. Min. Aldir Passarinho.
[40] Dados fornecidos pela Abel – Associacão Brasileira das Empresas de Leasing.
[41] “Arrendamento mercantil. Leasing. Antecipação do pagamento do valor residual garantido . Descaracterização da natureza contratual para compra e venda à prestação. Art. 11, § 1.º, da Lei 6.099/1994, não ocorrência. Afastamento da Súmula 263 (MIX\2010\1513) do STJ. 1. O pagamento adiantado do valor residual garantido – VRG não implica necessariamente antecipação da opção de compra, posto subsistirem as opções de devolução do bem ou prorrogação do contrato. Pelo que não descaracteriza o contrato de leasing para compra e venda à prestação. 2. Como as normas de regência não proíbem a antecipação do pagamento da VRG que, inclusive, pode ser de efetivo interesse do arrendatário, deve prevalecer o princípio da livre convenção entre as partes. 3. Afastamento da aplicação da Súmula 263 (MIX\2010\1513) do STJ. 4. Embargos de divergência acolhidos” (STJ, EDiv no REsp 213.828/RS, Corte Especial, j. 07.05.2003, rel. Min. Edson Vidigal).
[42] Precedentes:REsp 163.845/RS, 3.ª T., j. 15.06.1999, rel. Min. Waldemar Zveiter; REsp 164.918/RS, 3.ª T., j. 03.08.2000, rel. p/ acórdão Min. Ari Pargendler; REsp 280.833/RO, 4.ª T., j. 26.08.2003, rel. Min. Fernando Gonçalves.
[43] Enunciado 67 do TJRJ: “A cobrança antecipada do valor residual (VRG) pelo arrendador, não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil ( leasing) (…)”.
[44] “Considere-se, ainda (e isso pode ser comprovado por todos que tenham experiência própria em adquirir bens, por exemplo automóveis, pelo sistema de leasing), que os custos operacionais mais baratos desse tipo de operação financeira são benéficos ao consumidor, que acaba tendo acesso a um crédito mais favorável do que as operações de financiamento normais. E é de tal monta essa vantagem que as prestações pagas pelos arrendatários, incluída a parcela do VRG, são menores que as parcelas de um simples financiamento bancário de mesmo valor e idêntico prazo” (STJ, EDiv no REsp 213.828, Corte Especial, rel. Min. Salvio de Figueiredo Teixeira).
[45] No mesmo sentido: STJ, REsp 470.512/DF, 3.ª T., j. 29.10.2003, rel. Min. Castro Filho; STJ, AgRg no Ag 732.639/RS, 4.ª T., j. 14.03.2006, rel. Min. Aldir Passarinho Junior; TJRJ, Ap 0020584-75.2008.8.19.0205, 5.ª Câm. Civ., j. 20.04.2010, rel. Des. Katya Monnerat; TJRJ, Ap 0009727-76.2008.8.19.0202, 16.ª Câm. Civ., j. 24.01.2011, rel. Des. Lindolpho Morais Marinho.
[46] Antônio Flávio Leite Galvão. Leasing financeiro – VRG antecipado e sua devolução ao arrendatário no caso de reintegração de posse. Revista de Direito Bancário e Mercado de Capitais 29/346. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2005.
[47] Marco Antônio Ibrahim. Op. cit., p. 65.
[48] Ainda sobre o ponto, confira-se trecho do voto proferido pela Min. Nancy Andrighi no julgamento do REsp 373.674/PR: “Com efeito, observando o voto vencedor proferido pelo e. Min. Edson Vidigal no julgamento do REsp 213.828, pela Corte Especial, verifica-se que a eventual devolução da quantia paga, antecipadamente, a título de valor residual garantido dependerá do valor obtido com a venda do bem.”
[49] Constando do voto a seguinte fundamentação: “O VRG (valor residual de garantia), como o próprio nome diz, tem por finalidade garantir ao arrendante, ao final do contrato, caso não seja exercida a opção de compra, que este aufira uma quantia mínima, resguardando-se de eventuais prejuízos. Como é sabido, os bens arrendados sofrem o desgaste natural do uso e a depreciação pelo decurso do tempo, os quais, tratando-se de automóvel, são por demais acentuados. No presente caso, a sentença determinou, de plano, a devolução do VRG ao arrendatário diante da rescisão do contrato, entendimento este que não pode prosperar sem agredir à própria natureza do instituto, o qual visa, repita-se, garantir ao arrendante uma quantia mínima por eventual desvalorização ou desgaste do bem. (…) Conforme se vê, somente com a venda efetiva do veículo a terceiros, por preço superior ao VRG pactuado, é que poderá auferir o arrendatário algum crédito pela soma paga, antecipadamente, a título de VRG.”
[50] Para dados atuais consulte: [www.fipe.org.br/web/index.asp?aspx=/web/indices/veiculos/introducao.aspx].
[51] Nesse sentido, vide o RE 592.905/SC, Pleno, j. 02.12.2009, rel. Min. Eros Grau.
[52] Processo n. 0083449-62.2011.8.19.0001.
[53] Pela Tabela Fipe o veículo valia, na época, R$ 32.577,00.
[54] Amassado na porta e com arranhões no para-choque.
[55] Pela Tabela Fipe o veículo valia, na época, R$ 30.814,00. Com a usual desvalorização de 40% chega-se ao valor de R$ 18.488,40.
[56] “Após o término do pagamento das parcelas, tem o arrendatário a opção de comprar o bem, tendo que pagar o valor residual previamente estabelecido. Se ele não quiser optar pela compra, nem renovar o contrato, deve devolver o bem ao arrendador, que terá como uma garantia mínima por parte do arrendatário o valor residual garantido, na venda do bem a um terceiro . Assim, se o bem for vendido por um preço equivalente ao VRG, nada se tem a acertar; caso vendido por um valor inferior, deverá o arrendatário pagar a diferença à arrendadora. (…) A antecipação do pagamento do valor residual não implica necessariamente na opção de compra, haja vista que, se no término do contrato, o arrendatário não se interessar pela compra, por se encontrar o bem com tecnologia superada ou por qualquer outro motivo, terá a quantia devolvida ou não, de acordo com o preço que o bem for vendido a um terceiro. Caso vendido pelo mesmo valor do VRG ou por preço superior, será totalmente devolvido ao arrendatário o valor do VRG por ele antecipado; caso vendido por valor inferior, receberá o arrendatário apenas a diferença” (STJ, EDiv no REsp 245.704/RS, rel. p/ acórdão Min. Edson Vidigal).
[57] “Grande parte das dúvidas relativas ao VRG advém da confusão entre as hipóteses de ‘depósito de valor residual’ e ‘opção de compra’. Trata-se, contudo, de figuras diversas, havendo, por igual, distinção funcional ‘interna’ à figura denominada ‘valor residual’, distinção que opera caso o arrendatário opte pela aquisição do bem ou por sua devolução” (Judith Martins-Costa. Op. cit., p. 132).
[58] Neste mesmo sentido: TJRJ, Ap 0004631-73.2008.8.19-0075, 3.ª Câm., j. 03.12.2010, rel. Des. Mario Assis Gonçalves; TJRJ, Ap 0001570-96.2006.8.19.0069, 4.ª Câm., j. 13.10.2009, rel. Des. Monica Tolledo; TJRJ, Ap 0056405-30.2006.8.19.0038, 9.ª Câm, j. 06.11.2009, rel. Des. Roberto Abreu; TJRJ, Ap 0002627-29.2009.8.19.0075, 17.ª Câm., j. 13.05.2010, rel. Des. Marcia Alvarenga; TJRJ, Ap 0015847-20.2008.8.19.0208, 18.ª Câm., j. 08.09.2010, rel. Des. Leila Albuquerque; TJRJ, Ap 0010024-74.2008.8.19.0205, 19.ª Câm., j. 31.08.2009, rel. Des. Denise Levy Tredler.
[59] “O Valor Residual Garantido – VRG não se confunde com Opção de Compra, ao contrário: pelo fato de a compra ao final do contrato ter caráter opcional para o arrendatário, sendo portanto um evento incerto, o VRG é uma forma de o arrendatário garantir ao arrendante que este, caso não seja exercida a referida opção, auferirá certa quantia mínima” (Jorge R. G. Cardoso. Aspectos controvertidos do arrendamento mercantil. Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas . n. 5. p. 76. São Paulo: Ed. RT, out.-dez. 1993).
[60] A Res. 2.309/1996 do Bacen, em seu art. 5.º, I, define o arrendamento mercantil financeiro como aquele em que “as contraprestações e demais pagamentos previstos no contrato, devidos pela arrendatária, sejam normalmente suficientes para que a arrendadora recupere o custo do bem arrendado durante o prazo contratual da operação e, adicionalmente, obtenha um retorno sobre os recursos investidos”. O inc. III do mesmo artigo estabelece que “o preço para o exercício da opção de compra seja livremente pactuado, podendo ser, inclusive, o valor de mercado do bem arrendado”. Já o art. 7.º, VII, a, do mesmo normativo deixa claro que é possível estabelecer “a previsão de a arrendatária pagar valor residual garantido em qualquer momento durante a vigência do contrato, não caracterizando o pagamento do valor residual garantido o exercício da opção de compra”. Por fim, a Portaria MF 564/1978, estabelece o valor residual garantido como “preço contratualmente estipulado para exercício da opção de compra, ou valor contratualmente garantido pela arrendatária como mínimo que será recebido pela arrendadora na venda a terceiros do bem arrendado, na hipótese de não ser exercida a opção de compra”.
[61] AgRg no AgIn 960.513/RJ, 4.ª T., j. 25.11.2008, rel. Min. Fernando Gonçalves.

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