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Nelson Rosenvald

Nelson Rosenvald

20/10/2015

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Saúdo os vizinhos argentinos pela entrada em vigor do novo Código Civil em 1/8/2015. A lei n. 26.994 foi promulgada em 18/12/2014. Ao lado da constituição, trata-se da espinha dorsal do sistema jurídico de qualquer país, ostentando a nobre missão de regular as múltiplas relações que as pessoas estabelecem em suas esferas existencial e patrimonial, inserindo-se aí os vínculos familiares, empresariais e, o mais importante: a edificação e proteção de projetos de vida, com tutela diferenciada em prol dos que se encontrem em situação e vulnerabilidade ou desigualdade estrutural.

O civilista brasileiro tem enorme interesse no porvir argentino, não apenas pela proximidade geográfica com o oitavo maior país do mundo em área territorial e o maior entre as nações de língua espanhola, mas pela admirável tradição privatista sempre intercambiada. Com efeito, há mais de 140 anos, Vélez Sarsfield redigiu o projeto de Código Civil argentino e sua obra encontra profunda inspiração no portentoso Esboço do Baiano Teixeira de Freitas. Doravante, voltaremos os olhos para a regulação consubstanciada nos 2.671 artigos que integram o renovado corpo normativo argentino, aberto para séculos de evolução da cultura jurídica ocidental.

Ao contrário do que se deu quando sancionado o Código Civil de 1871- que monopolizava o direito privado em um processo de retroalimentação, tal e qual uma ilha infensa ao restante do ordenamento jurídico -, o pluricultural Código Civil capitaneado por Ricardo Lorenzetti adapta os seus postulados à hermenêutica Constitucional e aos tratados internacionais de direitos humanos internalizados pela República Argentina, com uma linguagem clara e direta, acessível ao cidadão comum.

Em seu art. 1º, humildemente, declara-se apenas parte de um sistema jurídico que respeitará princípios e direitos contidos em instrumentos jurídicos de maior hierarquia. Portanto, leva em consideração a complexidade da realidade socioeconômica e intensifica a tutela da autonomia, seja para desvelar liberdades existenciais como para tutelar o ser humano atomizado nas relações de mercado.

O Código Civil de 2014 é fracionado em um Título Preliminar, seguido de uma Parte Geral e dos seguintes livros específicos: a) Livro Segundo — Relações de Família; b) Livro Terceiro — Direitos Pessoais, versando sobre Obrigações, Teoria Geral dos Contratos, Contratos em espécie, Responsabilidade Civil, Atos Unilaterais e Títulos de Crédito; c) Livro Quarto – Direitos Reais; d) Livro Quinto — Transmissão de Direitos por causa da morte; e) Livro Sexto — Disposições comuns aos Direitos Pessoais e aos Direitos Reais, que trata dos seguintes modelos: a)prescrição e decadência; b)usucapião, c)privilégios e preferências; d)direito de retenção; e)disposições de Direito Internacional Privado.

Além da explícita opção metodológica pela constitucionalização do direito privado, podemos destacar como pontos nevrálgicos do novo Código Civil: a)destaque aos direitos privados de incidência coletiva, com mediação entre situações individuais e metaindividuais, diante da irrecusável imersão do ser humano na vida social; b) apelo ao diálogo de fontes, mediante a interlocução de um código civil essencialmente poroso, com o arcabouço jurídico, sempre na busca pela interpretação que, à luz da regra da proporcionalidade, melhor priorize direitos fundamentais; c) admissão da centralidade do Código Civil, mas valorizando a coordenação com a lateralidade dos microssistemas; d)incorporação das normas consumeristas ao Código Civil, com a preservação de especificidades contratuais e normas protetivas, que introduzem pautas de interpretação favoráveis aos consumidores, mediante dever de tratamento digno e não discriminatório, afastando-se práticas abusivas por parte de quem exerça posição dominante no mercado; e)ampla tutela existencial à pessoa humana em adequação a um contexto de mercado, com valorização dos direitos da personalidade (intimidade, honra, imagem e outros) e explícita opção pela teoria concepcionista; f) incorporação da boa-fé e do abuso do direito dentro do Título Preliminar, de maneira expressa e precisa, com a merecida centralidade no direito privado contemporâneo; g) valorização da capacidade civil como direito fundamental e imposição de denso ônus argumentativo para as hipóteses de limitação ao exercício do autogoverno, com instituição de um sistema de apoios que torna a incapacidade uma última e drástica opção, conforme diretrizes da Convenção de Direitos das Pessoas com Deficiência; h) legitimação da pluralidade de entidades familiares e vedação a normas discriminatórias, com consagração de um conceito de “projeto de vida em comum”, tributária de um matrimônio igualitário.

Em termos de modelos jurídicos e regras inovadoras, podemos destacar os seguintes aspectos: a)incorpora-se a figura da “união convivencial”- a par dos sexos – bem como pactos de convivência, em que a autonomia do casal decidirá não apenas questões patrimoniais, mas a fixação de diversas responsabilidades; b) inclusão de um regime especial para a proteção da moradia que substitui a noção de bem de família, já que o mínimo existencial se reserva à tutela da dignidade independente da pessoa estar ou não situada em uma entidade familiar; c) simplificação do processo de divórcio, mediante livre petição de um dos cônjuges, sem requisitos temporais, com possibilidade de autorregulação dos efeitos que derivam da dissolução; d) incorporação de técnicas de reprodução humana assistida, como terceira fonte de filiação – lateralmente à natural e adotiva-, regulando-se expressamente o consentimento prévio; e) simplifica-se o regime jurídico da adoção, com prevalência do interesse das crianças sobre os adultos, incorporando-se a “adoção por integração”, referida ao filho do cônjuge ou convivente; f) crianças e adolescentes terão o direito “a ser ouvidos”, valorizando-se o seu paulatino consentimento, conforme o grau de amadurecimento; g) robustecimento da responsabilidade, agora designada “autoridade parental” em conformidade com as tarefas de cuidado pessoal que serão assumidas pelos progenitores; h) incorpora-se modernas formas de contratação: arbitragem, agência, franquia, leasing e contratos celebrados na bolsa de valores ou mercado de capitais; i) previsão das sociedades de apenas um sócio, através da figura da Sociedade Anônima Unipessoal; j) a propriedade horizontal é constituída como direito real.

Enfim, surge um elegante corpo normativo, de design inovador, que facilitará a conversão do sujeito em protagonista de sua trajetória, com a exata consideração pelos direitos alheios e a tutela de interesses sociais e difusos dignos de merecimento. Se nas palavras de Edmund Burke, “a lei tem dois e apenas dois fundamentos: a equidade e a utilidade“, parece-nos que o Código Civil da Argentina aspira tenazmente preencher o binômio.


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