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Com diploma e sem português
GEN Jurídico
18/04/2013
Prova do Enade expõe a falta de domínio da escrita e de regras básicas da língua portuguesa por parte dos universitários
Não é apenas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) que os estudantes cometem erros absurdos de ortografia. No Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), alunos que estão se formando no ensino superior cometem desvios tão ou mais graves como “egnorancia”, “precarea” e “bule” (bullying).
Esses e outros exemplos foram repassados por uma corretora do Enade 2012, que avaliou concluintes de cursos como Direito, Comunicação Social, Administração, Ciências Econômicas, Relações Internacionais e Psicologia. O material foi entregue pessoalmente, mas, por ter assinado contrato de sigilo com o Ministério da Educação (MEC), a professora não pode ser identificada.
Em dez respostas a uma questão discursiva sobre violência, há erros, sobretudo, de estrutura frasal, imprecisão vocabular e fragmentação de sentido. O enunciado pedia que, a partir da análise de charges e da definição de violência formulada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o candidato redigisse um texto sobre a violência atual, contemplando três aspectos: tecnologia e violência; causas e consequências da violência na escola; e proposta de solução para a violência na escola.
Um formando escreveu: “A violencia e causada muitas vezes pela falta de cultura e pela egnorancia dos seres humanos, cuja a tecnologia sao duas grandes preocupação para a sociedade, causando violencia nas escolas”. Outro estudante respondeu: “As escolas tem que orienta e ajuda estas crianças que são violêntas e pratica o bule por enquanto são crianças por que só assim elas terão chacer de melhora e ser uma pessoa melhor e mas calma”.
“Os critérios são benevolentes, mandam não pesar a mão para manter média 5. Precisa se dar à opinião pública a ideia de que o ensino está melhorando. Mas não está. As faculdades formam profissionais analfabetos funcionais. Esse é o final do filme”, diz a corretora.
Avaliação
Em nota, o Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anisio Teixeira (Inep) rebate com veemência as críticas, afirmando que “são completamente infundadas as suspeições levantadas pela suposta corretora de que ocorreu orientação para ‘aliviar’ nas correções”. De acordo com o órgão, responsável pela aplicação da prova, “isso não acontece, nem aconteceu, no Enade, Enem, ou em qualquer outro exame sob responsabilidade do Inep/MEC”. O comunicado esclarece ainda que quaisquer erros tão grosseiros como os citados nesta reportagem certamente teriam “baixíssima avaliação”.
Segundo o Inep, as correções do Enade 2012 são feitas por bancas constituídas de um professor doutor como presidente e membros com titulação de doutorado ou mestrado vinculados há, pelo menos, cinco anos em instituições de ensino superior.
Falha linguística tem origem na educação básica
Enquanto a nota do Enem é usada como forma de verificar o aprendizado nas escolas e classificar estudantes para o ingresso em universidades públicas, o Enade analisa o rendimento dos alunos de graduação, ingressantes e concluintes, em relação aos conteúdos programáticos dos seus cursos. A prova, porém, não é classificatória nem eliminatória. Mesmo quem tirar zero ou deixar o exame em branco não será impedido de colar grau. Isso ocorre apenas se o estudante não comparecer ao exame.
A partir do desempenho na prova, o Inep elabora a avaliação de cada curso, levando em consideração também a infraestrutura da faculdade e o corpo docente. No Conceito Preliminar de Curso (CPC), por exemplo, a faculdade precisa ter, ao menos, nota 3 para ser considerada satisfatória. A escala vai de 1 a 5. Todo ano, diferentes faculdades são avaliadas.
Para os cursos com conceito insatisfatório, o MEC estabelece medidas obrigatórias, como ingressos interrompidos, redução de vagas e assinatura de compromisso e plano de melhorias detalhado.
Medida paliativa
Pós-doutor em Linguística Aplicada e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Jerônimo Rodrigues de Moraes Neto considera gravíssimo o exercício de qualquer profissão sem o conhecimento da língua portuguesa.
Uma pesquisa do Núcleo Brasileiro de Estágios mostrou que erros de português são o principal motivo de reprovação em processos seletivos de estágio. No estudo, que avaliou 7.219 alunos de níveis superior e médio, 28,8% perderam oportunidades por isso. Para corrigir as deficiências, universidades oferecem cursos de reforço.
Para a professora Cibele Yahn de Andrade, do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas da Unicamp, nivelar o ensino superior é necessário. Mas, para ela, o centro do problema está nos ensinos fundamental e médio. “Não é possível superar essas deficiências acumuladas, de modo satisfatório, em curto prazo. São habilidades que deveriam ser adquiridas ao longo da vida escolar, na sequência de atividades de leitura e escrita diversificadas e com desafios crescentes.”
Fonte: Gazeta do Povo
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