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Recursos Eleitorais: admissibilidade e mérito recursal
José Jairo Gomes
04/03/2021
A apreciação de um recurso envolve a realização de dois juízos sucessivos: um acerca de sua admissão e outro a respeito de seu mérito. Tais juízos realizam-se em etapas distintas do iter recursal. O juízo de admissibilidade é sempre preliminar e condicionante da apreciação do mérito ou pedido formulado no recurso, de sorte que este só é julgado se o recurso for admitido.
De modo geral, o juízo de admissibilidade é feito em dois momentos. O primeiro ocorre por ocasião da interposição do recurso, sendo ultimado pelo órgão judicial cuja decisão se impugna, o chamado juízo a quo ou recorrido. O segundo se dá perante o órgão competente para julgá-lo, i.e., o órgão ad quem. Consoante salienta Freitas Câmara (2012, p. 67), já com a interposição do recurso
[…] inicia-se a sua apreciação, o que se faz com a realização do juízo de admissibilidade. Esse pode ser definido como a fase do julgamento do recurso em que se verifica a presença ou não dos requisitos de admissibilidade do mesmo, revelando-se como preliminar do juízo de mérito.
Uma vez apresentado, o órgão recorrido analisará os pressupostos de cabimento do recurso, podendo ou não admiti-lo (recebê-lo, conhecê-lo). Admitindo-o, deverá determinar a intimação da contraparte para apresentação de contrarrazões. Sob à luz destas, a admissibilidade do recurso poderá ser reapreciada.
Sendo o recurso admitido ou recebido, é enviado ao órgão competente para julgá-lo, em que sua admissibilidade submete-se a novo crivo.
Nessa esfera, o recurso é distribuído a um relator. A este foram atribuídos vários poderes, podendo exercê-los singularmente, ou seja, independentemente do órgão colegiado a que pertence.
O relator sorteado poderá não conhecer e, pois, negar seguimento a “recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida” (CPC/2015, art. 932, III). Mas, antes de considerar o recurso inadmissível, o relator tem de conceder “o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível” (CPC/2015, art. 932, parágrafo único).
Vale registrar que o juízo negativo de admissibilidade impede que o mérito recursal seja apreciado pelo órgão colegiado.
Por outro lado, admitido o recurso pelo relator, este poderá, em decisão singular, desde logo apreciar o seu mérito. Deverá, então:
i) “negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência” (CPC/2015, art. 932, IV).
ii) “depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência” (CPC/2015, art. 932, V).
Nesses dois casos, portanto, é o próprio relator quem decide o mérito do recurso.
Fora dessas hipóteses, o relator deverá admitir e dar seguimento ao recurso para que seja julgado pelo órgão colegiado a que pertence.
Frise-se que o órgão ad quem somente aprecia o mérito recursal (i. e., o pedido formulado no recurso) após vencida a fase anterior, atinente à admissão. A admissibilidade constitui matéria preliminar.
Dispõe o caput do art. 938 do atual CPC: “A questão preliminar suscitada no julgamento será decidida antes do mérito, deste não se conhecendo caso seja incompatível com a decisão […].” E também o art. 939: “Se a preliminar for rejeitada ou se a apreciação do mérito for com ela compatível, seguir-se-ão a discussão e o julgamento da matéria principal, sobre a qual deverão se pronunciar os juízes vencidos na preliminar.”
Não se deve, pois, confundir o mérito do recurso com o mérito da causa. Esse último é determinado na petição inicial pelo autor da demanda e envolve sempre questão de direito material. Já no recurso o mérito consiste no que se impugna na decisão recorrida. Aqui o que se postula é um novo julgamento para reformar, anular, integrar ou aperfeiçoar a decisão de que se recorre; esse pedido constitui o mérito recursal e pode ou não se referir a uma questão de direito material. Assim, o mérito do recurso pode ser mais restrito que o mérito da causa, podendo até mesmo ser diverso, como ocorre na hipótese em que o objeto recursal é constituído por questão processual. Para exemplificar, pense-se na hipótese em que o pedido formulado no recurso consiste na invalidação da sentença, ou no reconhecimento de ausência de pressuposto processual ou condição da ação. Nesses exemplos, é óbvio que a pretensão recursal é diferente do objeto da ação, ou seja, do pedido formulado na petição inicial. Conforme ensina Theodoro Júnior (2012, p. 595):
Às vezes a pretensão de invalidação da sentença, formulada pelo recorrente, envolverá questão puramente processual. Seu julgamento, porém, não será de preliminar, mas de mérito, mérito não da causa e sim do recurso. Preliminares do recurso são apenas as questões que antecedem a apreciação do pedido contido no próprio recurso, são as que se localizam no juízo de admissibilidade.
Deveras, as questões preliminares do recurso ligam-se ao juízo de admissibilidade, identificando-se com os pressupostos recursais. Como afirmam Wambier et al. (2015, p. 1.335): “As preliminares do recurso são, fundamentalmente, as matérias atinentes à sua admissibilidade, tempestividade, legitimidade para recorrer, adequação do recurso, interesse (existência de sucumbência, salvo no caso de embargos de declaração) etc.”
Havendo mais de uma questão preliminar a ser apreciada, impõe-se ordená-las logicamente, de tal sorte que se conheçam e julguem antes as que sejam prejudiciais às outras.
O mérito recursal pode conter argumentos de caráter formal-processual e/ou de direito material. Se houver vários argumentos, também aqui há mister colocá-los em ordem lógica. Nesse diapasão, o mérito do recurso pode conter questões: (a) exclusivamente de caráter formal-processual, (b) exclusivamente de direito material e (c) desses dois tipos, isto é, formal-processual e material. A análise e enfrentamento dos argumentos de natureza formal-processual deve sempre preceder a dos materiais. Havendo mais de um argumento, devem-se conhecer e solucionar primeiro aqueles cuja afirmação prejudique o conhecimento e julgamento dos demais; portanto, os argumentos “prejudiciais” devem ser analisados logo no início.
A esse respeito, figure-se recurso em que se apresentem os seguintes argumentos: 1) intempestividade em sua interposição; 2) falta de capacidade postulatória do recorrente; 3) carência de ação por ilegitimidade ativa; 4) decadência do direito de ação; 5) afirmação do direito “x”; 6) negação do direito “x”. Em que ordem devem eles ser enfrentados? Os argumentos 1 e 2 configuram preliminares do recurso, porque referem-se à sua admissão; logo, devem ser analisados em primeiro lugar; entre eles, o de número 2 deve ser apreciado antes, porque se a parte não detém capacidade postulatória seu recurso é inexistente e, nesse caso, sequer se pode cogitar de sua tempestividade. Deveras, se o ato sequer existe juridicamente, não se coloca a questão atinente à sua regularidade. Já os argumentos 3, 4, 5 e 6 compõem o mérito recursal, de maneira que só serão analisados se as preliminares 1 e 2 forem rejeitadas.
Se isso ocorrer, cumpre examinar ab initio os argumentos de números 3 e 4, para só depois – caso sejam rejeitados – ingressar na análise do direito material.
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Tudo sobre os recursos eleitorais. Com uma linguagem direta e de acordo com a Lei nº 13.105/2015, que deu origem ao novo Código de Processo Civil (CPC), José Jairo Gomes apresenta os meios impugnativos existentes no âmbito do Direito Processual Eleitoral.
Com destaque para os principais assuntos da matéria, Recursos Eleitorais oferece um estudo fundamentado em pesquisa interdisciplinar, voltado para o pensamento atual e para a ideia de que os institutos e as disciplinas jurídicas não são realidades isoladas, mas intercomunicantes. O autor também analisa variadas fontes doutrinárias e numerosa jurisprudência dos tribunais superiores, além de fornecer súmulas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Os temas explorados são pouco tratados na doutrina, o que faz deste livro uma importante ferramenta de estudo para todos os públicos da área jurídica: do estudante ao profissional, passando pelos candidatos a concursos públicos.
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