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Tribunal de contas: O que são? Quais as funções?

CURSO DE DIREITO FINANCEIRO BRASILEIRO

TRIBUNAL DE CONTAS

Marcus Abraham

Marcus Abraham

22/01/2025

Relevante papel no controle do orçamento brasileiro tem o Tribunal de Contas de cada ente federativo, que atua no controle externo, auxiliando o Poder Legislativo nesta atividade. Assim, fazem parte do sistema de controle externo do orçamento o Tribunal de Contas da União (TCU), os Tribunais de Contas dos Estados e os Tribunais de Contas dos Municípios ou Conselho de Contas. A estrutura e o funcionamento desses órgãos são similares e decorrem das normas constitucionais que tratam da matéria.

Segundo Luiz Henrique Lima,1

“os Tribunais de Contas exercem uma função essencial à democracia, que é o controle externo da Administração Pública. Além de guardiões da responsabilidade fiscal e da probidade e eficiência administrativas, os Tribunais de Contas devem atuar como impulsionadores da transparência na gestão pública, da qualidade na execução de políticas públicas e da criação e aperfeiçoamento de mecanismos de participação da cidadania, inclusive mediante o uso das novas tecnologias de comunicação e informação.”

A existência e o funcionamento desse órgão de fiscalização e controle não é uma exclusividade brasileira. Na Itália existe a Corte dei Conti, para controlar e julgar os gastos e as contas públicas. Na França há a Cours des Comptes, criada por Napoleão I para julgar todos os obrigados a prestar contas.2 Na Inglaterra existe o Committee of Public Accounts, formado por integrantes da Câmara dos Comuns, para verificar as contas, controlar o orçamento e através de uma comissão fiscalizadora chamada de General Accounting Office, que dispõe de poderes para se opor à ação administrativa, apreciando o mérito e a legalidade da despesa a ser efetuada.3

Cabe ao Tribunal de Contas atuar na fiscalização contábil, financeira orçamentária, operacional e patrimonial do Estado, incluindo aí os seus Poderes e as respectivas entidades de administração direta ou indireta, alcançando os administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos, além das pessoas físicas ou jurídicas, que, mediante convênios, acordos, ajustes ou outros instrumentos, apliquem auxílios, subvenções ou recursos repassados pelo Poder Público.

A propósito, Emerson Cesar Gomes4 denomina de responsabilidade financeira a espécie de responsabilidade jurídica de natureza subjetiva, presente nos Estados que adotam o Sistema de Tribunal de Contas com função de julgamento das contas dos responsáveis pela gestão de recursos públicos, tendo por funções a reintegratória (reparatória ou compensatória), a sancionatória (punitiva) e a preventiva (educativa), aplicável a todos aqueles ‒ agentes públicos e privados ‒ que lidam com bens e recursos estatais, tendo como finalidade a proteção ao Erário e a regularidade na gestão, e encontrando sua fundamentação no art. 71, VIII, da Constituição.

A Constituição Federal dedica dispositivos específicos para tratar do Tribunal de Contas da União, ressalvando que essas normas aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados (TCEs) e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios (art. 75), configurando, assim, um parâmetro para a criação e o funcionamento de todos os Tribunais de Contas brasileiros. Registre-se que – em face da vedação constitucional à criação de novas Cortes de Contas municipais – somente os Municípios do Rio de Janeiro e de São Paulo5 possuem um Tribunal de Contas Municipal próprio.6 Nos demais Estados, em regra, os seus respectivos TCEs atuam tanto na fiscalização da administração estadual como das administrações municipais. Já os Estados da Bahia, Goiás e Pará possuem dois tribunais estaduais de contas: um Tribunal de Contas Municipais para fiscalizar todos os seus municípios, e um outro Tribunal de Contas do Estado, apenas para fiscalizar as contas do Estado-membro.7 (…)

Pode-se dizer que o Tribunal de Contas da União detém as seguintes funções:8 a) função fiscalizadora, relativa à fiscalização de atos de admissão de pessoal e de aposentadorias, de convênios com Estados, Municípios e Distrito Federal, de bens e rendas de autoridades públicas, de subvenções, de renúncias de receitas, de entrega de cotas do FPE, FPM, do IPI­-exportações e da Cide-Combustíveis, de contas nacionais de empresas supranacionais, de operações de desestatização, de avaliação de programas, de recursos repassados ao Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e ao Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPB), das despesas com pessoal, do endividamento público e receita, do alcance de metas da Lei de Diretrizes Orçamentárias, dos limites e condições de operações de crédito, dos recursos de alienação de ativos e dos Relatórios de Gestão Fiscal e Relatório Resumido de Execução Orçamentária – RREO (CF/1988: art. 71, IV, V, VI e XI); b) função opinativa, ao apresentar parecer prévio sobre as contas do Presidente da República (CF/1988: art. 71, I), embora o julgamento de suas contas seja feito pelo Poder Legislativo;9 c) função julgadora, ao proceder aos julgamentos sobre as contas dos administradores (excluídas do julgamento pelo TCU as contas do chefe do Executivo)1029 e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos, por prejuízos ao Erário e por infrações decorrentes da não publicação do Relatório de Gestão Fiscal, da elaboração de anteprojeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias sem metas fiscais, da inobservância de limitação de empenho ou da falta de medidas para redução das despe­sas de pessoal (CF/1988: art. 71, II, III); d) função sancionadora, na aplicação de multas, na declaração de inidoneidade para licitar ou na inabilitação para exercício de função comis­sionada, na decretação da indisponibilidade de bens etc. (CF/1988: art. 71, VIII); e) função corretiva, na emissão de determinações e recomendações aos órgãos jurisdicionados, na fixação de prazo para adoção de providências, na sustação de atos irregulares e na adoção de medidas cautelares (CF/1988: art. 71, IX e X); f) função consultiva, na emissão de pare­ceres sobre a regularidade de despesas por solicitação da Comissão Mista do Orçamento ou quando da resposta a consulta sobre assuntos de sua competência (Lei Orgânica do TCU: art. 1º, XVII); g) função informativa, no fornecimento de informações acerca de trabalhos realizados, cálculos e dados consolidados, elementos e documentos a que tenha tido acesso (CF/1988: art. 71, VII); h) função ouvidora, no recebimento e processamento de denúncias feitas por cidadão, partido político, associação civil ou sindicato, ou por representação feita pelo controle interno sobre irregularidades em licitação ou contrato administrativo (CF/1988: art. 74, § 2º); i) função normativa, de expedir atos e instruções normativas (Lei Orgânica do TCU: art. 3º).1130

A função fiscalizadora do TCU é exercida através dos seguintes instrumentos: levantamento, auditoria, inspeção, acompanhamento e monitoramento.

A abrangência do controle dos Tribunais de Contas vem prevista no parágrafo único do art. 70 da Constituição, o qual estabelece que qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária, tem o dever de prestar contas ao TCU.12

Portanto, em regra, submetem-se à fiscalização e controle dos Tribunais de Contas todas as entidades da Administração Direta ou Indireta, fundos constitucionais de investimento ou de gestão, Entidades Fechadas de Previdência Privada – EFPP,32 Organizações sociais de interesse público (OSCIP), Conselhos de regulamentação profissional (CREA, CRM, CRO etc.), Serviços sociais autônomos (Sebrae, Sesi, Sesc, Senai, Senat etc.), beneficiários de bolsas de estudo e projetos de pesquisa e beneficiários de renúncias de receitas ou de incentivos fiscais. Na maior parte dos casos, não surge dúvida a respeito da abrangência da competên­cia dos Tribunais de Contas. Entretanto, nas situações que envolvem algumas entidades da Administração Indireta, a controvérsia se demonstra viva.

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LEIA TAMBÉM

NOTAS

1 LIMA, Luiz Henrique. O Controle da Responsabilidade Fiscal e os Desafios para os Tribunais de Contas em Tempos de Crise. In: LIMA, Luiz Henrique; OLIVEIRA, Weder de; CAMARGO, João Batista (Coord.). Contas Governamentais e Responsabilidade Fiscal: desafios para o controle externo. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 107.

2 No direito administrativo e financeiro francês, há duas figuras que lidam com as contas públicas: 1. o ordonnateur (o ordenador); 2. o comptable publique (contador público). O ordonnateur não possui compe­tência para lidar diretamente com os recursos públicos, razão pela qual a Corte de Contas francesa julga pessoalmente o comptable publique, podendo inclusive aplicar-lhe multa, mas não julga o ordonnateur (julga apenas as contas deste).

3 DEODATO, Alberto. Op. cit. p. 371-375.

4 GOMES, Emerson Cesar da Silva. Responsabilidade Financeira: uma teoria sobre a responsabilidade no âmbito dos tribunais de contas. Porto Alegre: Núria Fabris, 2012. p. 334.

5 STF. ADIs 346 e 4.776, Rel. Min. Gilmar Mendes, Pleno, julg. 03/06/2020, DJe 02/10/2020: “3. Disposição referente ao Tribunal de Contas do Município de São Paulo. 4. Razoabilidade da fixação em 5 Conselheiros para Tribunal de Contas de Município, nos termos da Constituição Estadual e Lei Orgânica Municipal. Inexistência de ofensa ao princípio da simetria, que não exige identidade com a Constituição Federal. 5. Art. 151 da Constituição do Estado de São Paulo não incorre em vício de inconstitucionalidade, desde que interpretado de forma a respeitar a competência do Município de São Paulo para a fixação dos subsídios dos Conselheiros do Tribunal de Contas municipal, sendo inconstitucional qualquer interpretação que leve à vinculação dos vencimentos dos Conselheiros do TCM/SP aos dos Conselheiros do TCE/SP ou aos dos Desembargadores do TJ/SP”.

6 STF. ADPF 272, Rel. Min. Cármen Lúcia, Pleno, julg. 25/03/2021, DJe 12/04/2021: “1. O Tribunal de Contas do Município de São Paulo é órgão autônomo e independente, com atuação circunscrita à esfera municipal, composto por servidores municipais, com a função de auxiliar a Câmara Municipal no controle externo da fiscalização financeira e orçamentária do respectivo Município. 2. O preceito veiculado pelo art. 75 da Constituição da República aplica-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribu­nais de Contas dos Estados e do Distrito Federal e dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios, excetuando-se ao princípio da simetria os Tribunais de Contas do Município. Precedentes. 3. O incremento de novo órgão na esfera da competência municipal, sem que se demonstre real necessidade de sua criação, compromete os gastos públicos de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal e atenta contra a eficiência da Administração Pública. 4. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente

7 Constituição Federal – art. 31, § 4º – É vedada a criação de Tribunais, Conselhos ou órgãos de Contas Mu­nicipais. Vide STF. ADI 687: “MUNICÍPIOS E TRIBUNAIS DE CONTAS. – A Constituição da República impede que os Municípios criem os seus próprios Tribunais, Conselhos ou órgãos de contas municipais (CF, art. 31, § 4º), mas permite que os Estados-membros, mediante autônoma deliberação, instituam órgão estadual denominado Conselho ou Tribunal de Contas dos Municípios (RTJ 135/457, Rel. Min. Octavio Gallotti – ADI 445/DF, Rel. Min. Néri da Silveira), incumbido de auxiliar as Câmaras Municipais no exer­cício de seu poder de controle externo (CF, art. 31, § 1º). – Esses Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios – embora qualificados como órgãos estaduais (CF, art. 31, § 1º) – atuam, onde tenham sido instituídos, como órgãos auxiliares e de cooperação técnica das Câmaras de Vereadores. – A prestação de contas desses Tribunais de Contas dos Municípios, que são órgãos estaduais (CF, art. 31, § 1º), há de se fazer, por isso mesmo, perante o Tribunal de Contas do próprio Estado, e não perante a Assembleia Legislativa do Estado-membro. Prevalência, na espécie, da competência genérica do Tribunal de Contas do Estado (CF, art. 71, II, c/c o art. 75).”

8 A “PEC do Pacto Federativo” (PEC nº 188/2019), em tramitação no Congresso Nacional, prevê uma nova função para o TCU: a função uniformizadora. Caso seja aprovada, o TCU passa a poder editar orientações normativas vinculantes para todos os Tribunais e Conselhos de Contas do país, de modo a uniformizar a interpretação de conceitos constantes na legislação orçamentário-financeira.

9 Os chefes do Poder Executivo, por força do art. 71, I, da Constituição, não têm suas prestações de contas julgadas pelos Tribunais de Contas, mas meramente apreciadas pelas Cortes de Contas, mediante parecer prévio que será encaminhado ao Poder Legislativo. Será o Poder Legislativo de cada ente a realizar o jul­gamento das contas apresentadas pelos respectivos chefes do Executivo. Cf. STF. RE 848.826 (repercussão geral), Rel. Min. Roberto Barroso, Rel. p/ Acórdão Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, julg. 10/08/2016, DJe 24-08-2017: “RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL. PARECER PRÉVIO DO TRIBUNAL DE CONTAS. EFICÁCIA SUJEITA AO CRIVO PARLAMENTAR. COMPETÊNCIA DA CÂMARA MUNICIPAL PARA O JULGAMENTO DAS CONTAS DE GOVERNO E DE GESTÃO. LEI COMPLEMENTAR 64/1990, ALTERADA PELA LEI COMPLEMENTAR 135/2010. INELEGIBILIDADE. DECISÃO IRRECORRÍVEL. ATRIBUIÇÃO DO LEGISLATIVO LOCAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO. I – Compete à Câmara Municipal o julgamento das contas do chefe do Poder Executivo municipal, com o auxílio dos Tribunais de Contas, que emitirão parecer prévio, cuja eficácia impositiva subsiste e somente deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da casa legislativa (CF, art. 31, § 2º). II – O Constituinte de 1988 optou por atribuir, indistintamente, o julgamento de todas as contas de responsabilidade dos prefeitos municipais aos vereadores, em respeito à relação de equilíbrio que deve existir entre os Poderes da República (‘checks and balances’). III – A Constituição Federal revela que o órgão competente para lavrar a decisão irrecorrível a que faz referência o art. 1°, I, g, da LC 64/1990, dada pela LC 135/2010, é a Câmara Municipal, e não o Tribunal de Contas”.

10 Com exclusão dos chefes do Poder Executivo, os chefes dos demais Poderes e órgãos autônomos, por não estarem abarcados pela exceção prevista no art. 71, I, CF/1988, têm suas contas julgadas pelos Tribunais de Contas, nos termos do art. 71, II, CF/1988. A esse respeito: “Constituição do Estado do Tocantins. EC 16/2006, que criou a possibilidade de recurso, dotado de efeito suspensivo, para o Plenário da Assembleia Legislativa, das decisões tomadas pelo Tribunal de Contas do Estado com base em sua competência de julgamento de contas […].No âmbito das competências institucionais do Tribunal de Contas, o STF tem reconhecido a clara distinção entre: a competência para apreciar e emitir parecer prévio sobre as contas prestadas anualmente pelo chefe do Poder Executivo, especificada no art. 71, I, CF/1988; e a competência para julgar as contas dos demais administradores e responsáveis, definida no art. 71, II, CF/1988. […] Na segunda hipótese, o exercício da competência de julgamento pelo Tribunal de Contas não fica subordinado ao crivo posterior do Poder Legislativo. […] Ação julgada procedente”. (STF. ADI 3.715, Rel. Min. Gilmar Mendes, Pleno, julg. 21/08/2014, DJe 30/10/2014).

No mesmo sentido: “Tribunal de contas dos Estados: competência: observância compulsória do modelo federal: inconstitucionalidade de subtração ao tribunal de contas da competência do julgamento das contas da mesa da assembleia legislativa – compreendidas na previsão do art. 71, II, da CF, para submetê-las ao regime do art. 71, c/c o art. 49, IX, que é exclusivo da prestação de contas do chefe do Poder Executivo”. (STF. ADI 849, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Pleno, julg. 11/02/1999, DJ 23/04/1999).

11 LIMA, Luiz Henrique. Controle externo: teoria, jurisprudência e mais 500 questões. 4. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. p. 111-115.

12 Regulamentado no art. 5º da Lei Orgânica do TCU, Lei nº 8.443/1992.

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