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Título de Crédito ou Contrato? A Natureza Jurídica da CPR – Cédula de Produto Rural
Marcus Vinícius de Carvalho Rezende Reis
02/01/2019
Muito se discute sobre a natureza jurídica da CPR que, apesar de à primeira vista denotar conceituação simplista, frente a olhos mais atentos e aguçados, tende à mudanças de rota em sua definição.
Antes de adentrarmos ao estudo quanto à natureza jurídica deste interessante instrumento, preliminarmente, vejo por necessária a distinção entre conceitual entre contratos e títulos de crédito:
Contrato é o acordo entre a manifestação de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial.
Sendo uma das fontes obrigacionais gerais (além das disposições legais propriamente ditas – fonte principal, de que todas as demais decorrem), os contratos são negócios jurídicos, de direito público ou privado, interno ou externo, por que os indivíduos amoldam seus interesses a algum vínculo jurídico determinado, criando, modificando ou extinguindo direitos disponíveis
Título de crédito, por sua vez, segundo Cesare Vivante,[1] “é o documento necessário para o exercício do direito, literal e autônomo, nele mencionado”.
João Eunápio Borges complementa como sendo “o documento no qual se materializa, se incorpora a promessa da prestação futura a ser realizada pelo devedor, em pagamento da prestação atual realizada pelo credor”.
Pois bem, o Art. 4º. da Lei 8.929/94, conceitua a CPR como título líquido e certo, exigível pela quantidade e qualidade de produto nela previsto.”
Trata-se portanto a CPR, de título crédito abstrato, pois não vinculado à sua origem ou causa.
Por outro lado, o parágrafo primeiro do artigo terceiro da Lei nº 8.929/94, ao permitir que “sem caráter de requisito essencial, a CPR poderá conter “outras cláusulas” lançadas em seu contexto […]”, trouxe uma novidade ao imprimir características tipicamente contratuais em um título de crédito abstrato por sua própria natureza.
Ora, cláusula é instrumento natural à formação de contratos regidos pela lei civil e cujas características fundamentais são ditadas pelo Código Civil de maneira geral.
E esta permissão legal típica de contratos bilaterais é hoje amplamente explorada pelo mercado que salpica toda a ordem de cláusulas e disposições próprias às partes “contratantes”, termo esse por vezes utilizado no corpo da própria CPR.
A CPR surgiu de estudos realizados pelo Banco do Brasil S.A., que ainda hoje mantém a simplicidade de forma utilizando-se em suas CPRs, do mínimo exigido pela lei em seu rol de requisitos essenciais de formação (Lei 8.929/94 – Art. 3o).
Dentre outras, uma das principais características diferenciadoras entre títulos e contratos é a bilateralidade de vontades na emissão dos contratos, contra a unilateralidade da vontade na emissão dos títulos.
Diante deste raciocínio, ouso discordar da maioria dos autores que discorrem sobre a natureza jurídica desse instrumento, na forma como o definem ou conceituam, caracterizando-o como típico título de crédito líquido e certo, exigível pela quantidade e qualidade de produto nele especificado.
Na realidade, portanto, a meu ver, trata-se a Cédula de Produto Rural de título de crédito híbrido, com características cambiariformes e de contrato civil, à ordem, líquido e certo, representativo de promessa de entrega de produtos rurais, com ou sem garantia cedularmente constituída.
Esta pois, salvo melhor juízo, é a natureza jurídica da CPR.
[1] VIVANTE, Cesare apud MARTINS, Fran. Títulos de Crédito. Vol. I, 13. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 5.
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