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O perigo invisível de ter reputação baixa fora do círculo interno

Maria Olivia Machado
16/09/2025
Areputação na advocacia não nasce de ruído. Ela nasce de sinais coerentes, repetidos até se tornarem lembrança.
Nada é mais cruel do que ser brilhante dentro do escritório e invisível fora dele.
Vejo esse padrão há anos em mentorias com advogados seniores ou recém-ingressos na sociedade: reconhecidos pelo time, elogiados pelos pares, respeitados pela precisão técnica… mas, ao olharem para fora, encontram um deserto. Poucos convites. Pouca lembrança. Pouca circulação de nome.
É um paradoxo difícil de enfrentar. Você é valioso onde todos já o conhecem, mas quase inexistente onde as decisões relevantes acontecem.
A princípio, parece injusto. Mas logo se torna claro: não é injustiça. É erro de arquitetura pessoal. Reputação na advocacia confinada é reputação ausente.
Quando a técnica deixa de ser suficiente?
O problema começa cedo, de modo quase invisível. A advocacia treina você para resolver questões complexas com rigor e disciplina. Isso é indispensável. Mas à medida que você cresce, a dinâmica de valor muda. O que antes era diferencial, seu domínio técnico, passa a ser apenas a senha de entrada.
De certo ponto em diante, o que mantém sua carreira em movimento não é a excelência jurídica, mas a capacidade de tornar sua competência visível, compreensível e desejada por quem não trabalha ao seu lado todos os dias: líderes de outras áreas, clientes, parceiros, imprensa especializada, gestores que jamais leram uma peça sua.
E não há como terceirizar isso. “Mas o meu sócio sabe que eu sou bom.”
Eu acredito.
O seu sócio enxerga o seu valor porque convive com ele. O erro é confundir reconhecimento de proximidade com reputação de mercado.
Proximidade cria memória curta. Mercado exige memória ampliada.
Dentro do círculo, você é avaliado pelo que entrega. Fora dele, você é julgado pelo que transborda: clareza ao explicar, segurança que irradia, consistência da presença, capacidade de transformar conhecimento em impacto tangível.
No círculo, basta o relatório impecável. No mercado, é o relatório mais a narrativa que o torna legível para quem não fala a sua língua.
Os sinais e as ilusões da reputação presa
Quase sempre, os sintomas estão à vista:
- Você é chamado para o trabalho duro, raramente para representações externas.
- Convites estratégicos chegam a colegas tecnicamente menos consistentes, mas mais inteligíveis.
- Seu nome não aparece quando alguém pede uma indicação fora do time.
- Nos eventos, você circula pouco. Online, sua presença é discreta ou inexistente.
- Quando perguntam “o que você faz?”, sua resposta começa por rótulos e termina em jargões.
Você falou certo. Mas ninguém ouviu.
Isso não é falta de mérito. É falta de circulação.
E a invisibilidade externa é reforçada por três ilusões perigosas:
- Ilusão da escala pelo esforço – acreditar que mais horas trarão, por si, mais oportunidades. Horas constroem entregas; reputação na advocacia exige circulação.
- Ilusão do patrocínio automático – supor que o gestor narrará seu valor para o mundo. Alguns fazem. A maioria não sabe, não se preocupa com isso ou não tem incentivo.
- Ilusão da presença sem tese – ir a eventos sem posicionamento, publicar sem linha editorial, marcar presença sem coesão.
Reputação não nasce de ruído. Reputação nasce de sinais coerentes repetidos até se tornarem lembrança.
O silêncio não é elegância
É duro aceitar, mas o mercado não funciona como tribunal. Não basta ser bom.
O mercado é um ecossistema de percepções, assimetrias de informação e tempo escasso. A pergunta nunca é “você é bom?”. A pergunta é “quão fácil é para o mundo perceber, lembrar e explicar o seu valor quando você não está na sala?”
A objeção clássica é: não tenho tempo!
Eu conheço a agenda. Eu sei como ela tritura. Mas tempo não é o obstáculo. O problema é energia mal alocada em atividades que não deixam vestígios.
Uma petição impecável que só três pessoas leem não constrói reputação externa. Um parecer decisivo esquecido no servidor não gera circulação de nome. Um projeto brilhante que termina em silêncio vira pó.
Seu trabalho precisa de traços públicos. Algo que possa ser citado. Algo que um executivo repita com segurança. Algo que eduque o mercado sem violar confidencialidade.
E aqui entra a distinção: reputação na advocacia não é autopromoção. É serviço. É tornar o seu trabalho legível para quem não tem tempo de aprender sua técnica.
Quando sua contribuição é útil, a lembrança vem sem esforço. Você deixa de ser o fulano do time do ciclano para ser a pessoa certa para esse tipo de decisão.
Como sair do aquário
A solução não é virar influenciador. É se tornar pronunciável.
Significa: quando o assunto é X, pelo menos três pessoas fora do seu time lembram, sem esforço, do seu nome e conseguem justificar essa lembrança com um exemplo concreto.
Para isso, não basta ter resultados. É preciso orquestrar como os resultados se contam.
- Escolher uma zona de competência onde você quer ser referência.
- Escolher uma cadência de publicação que possa sustentar.
- Escolher vocabulário que respeite a complexidade, mas entregue clareza.
- Estar onde as conversas relevantes acontecem, não apenas onde é confortável estar.
E para isso, sim, tecnologia ajuda! IA e automações não pensam por você, mas liberam energia para o que importa: pensar, decidir, narrar.
O ganho não é só produtividade. É amplitude. E voz, nesse mercado, é jurisdição não oficial. Ela delimita os temas nos quais o seu nome tem autoridade presumida.
Enquanto isso, há quem continue esperando. Esperando que terceiros citem, o momento ideal para publicar, a agenda abrir.
Enquanto você espera, alguém ocupa o espaço que você acreditava ser seu. O mercado não redistribui espaço que você não ocupa.
Do vidro ao oceano
Como romper esse confinamento sem cair no exibicionismo?
Com um ato de honestidade total: pergunte-se “fora do meu círculo, quem lembraria de mim amanhã e por qual razão específica?” Se o silêncio vier, há trabalho que precisa ser feito.
A partir daí:
- transforme projetos em sínteses replicáveis,
- escolha um eixo editorial e mantenha cadência,
- converta bastidores em aprendizados públicos,
- pratique patrocínio cruzado (cite outros com generosidade).
Reputação externa é uma construção entre mentes, não um espelho individual.
No fundo, a questão é simples: abandone a fantasia de que alguém vai quebrar o vidro do aquário para tirá-lo daí.
Saia com método, ética e uma tese. Aprenda a ser lembrado sem ser barulhento, claro sem ser raso, constante sem ser cansativo.
Muitos dos meus clientes chegam exatamente nesse ponto: respeitados internamente, mas parados diante da parede invisível da reputação externa. Querem ser sócios, ganhar mais, expandir mercado. Mas só mudam de patamar quando param de discutir se deveriam aparecer e começam a discutir como aparecer com consistência.
A transformação é rápida. Portas se abrem quando o mundo entende, de forma clara, o que você entrega e por que deveria confiar em você antes de precisar de você.
Eu escrevi longamente sobre isso no meu livro Marca Pessoal na Advocacia, não como promessa publicitária, mas como um manual de arquitetura de reputação na advocacia para transformar competência real em confiança percebida.
Talvez seja a hora de sair da bolha com método. Deixar de nadar em círculos no aquário. E finalmente aparecer no oceano, onde sua carreira pode, de fato, respirar.
O que você acha: sua reputação na advocacia hoje está confinada ao aquário ou já circula pelo oceano do mercado?

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