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(Vice)Presidente do Tribunal a quo e a correção dos recursos especiais e extraordinários

Zulmar Duarte

Zulmar Duarte

30/05/2017

Como todos os recursos, os recursos especiais e extraordinários passam por um juízo de admissibilidade, que consiste basicamente no exame das potencialidades do recurso levar o mérito recursal à apreciação dos tribunais de superposição (STJ e STF).

O juízo de admissibilidade mira precisamente na presença dos requisitos de admissibilidade recursais (cabimento, legitimação recursal, interesse recursal, tempestividade, regularidade formal, preparo e inexistência de fato impeditivo ou extintivo ao poder de recorrer).

No particular, os recursos especiais e extraordinários passam por juízo de admissibilidade em dois tempos (bifásico); primeiro perante o tribunal de origem, exercido pelo (vice)presidente respectivo (CPC, artigo 1.030); depois, secunda-se tal exame perante o relator do tribunal de superposição.

Surge então a questão da aplicação pelo (vice)presidente na origem do parágrafo único do artigo 932 do CPC, ou seja, a possibilidade do (vice)presidente implementar o comando aí contido, especificamente permitir a supressão e a correção dos vícios dos recursos especiais e extraordinários.

O parágrafo único do artigo 932 concretiza o viés da preponderância do mérito no âmbito recursal (primazia do mérito)[1]. É duro golpe contra a jurisprudência defensiva[2] erigida pelos tribunais, em que a ausência do preenchimento de requisitos formais impede o conhecimento de recursos, sem que se oportunize a parte a corrigenda do erro ou o suprimento da falta.

Alternativamente, poder-se-ia cogitar de que tal aplicação estaria interditada na origem, somente competindo ao relator do tribunal superior a corrigenda do vício recursal, em leitura canina dos artigos 932 e 1.030 do CPC. Nessa situação, o (vice)presidente negaria seguimento ao recurso, eis que o recurso foi mal formado e a competência para permitir sua correção seria exclusiva do relator do tribunal ad quem (artigos 1.030, § 1o, e 1.042 do CPC).

Entretanto, temos que o (vice)presidente deve acionar a regra do artigo 932, parágrafo único, do CPC, possibilitando a retificação do recurso, para posteriormente realizar o juízo de admissibilidade. Ainda que não seja o relator do recurso, remanesce no (vice)presidente competência funcional suficiente para o processamento e a análise do recurso interposto, inclusive com cognição sobre a pretensão recursal propriamente dita (artigo 1.030 do CPC). Tanto é assim, que o (vice)presidente detém competência para a análise do efeito suspensivo dos recursos especiais e extraordinários antes da realização do juízo de admissibilidade (artigo 1.029, § 5o, inciso VI).

Portanto, o enfeixamento de tal competência na figura do (vice)presidente abrange o dever/poder de determinar o saneamento dos vícios processais, na medida em que o (vice)presidente exerce típica atividade jurisdicional, nessa primeira fase de processamento dos recursos, pelo que investido dos deveres/poderes correspondentes (artigo 139, inciso IX).

Em tese, a decisão de correção pode ser revista, em momento posterior, pelo relator dos recursos especiais e extraordinários, decretando a inadmissibilidade do recurso, na medida em que considere incorreta a concessão de prazo para correção do vício recursal pelo (vice)presidente.

Mesmo porque, na solução diversa, o (vice)presidente negaria conhecimento ao recurso, pois mal formatado, sendo que na via do agravo o relator do tribunal de superposição permitira sua correção (artigo 1.042 do Código). Inútil desperdício de tempo e energia processual, com o fomento ainda a interposição de recursos.

Em contrapartida, a possibilidade de correção dos vícios recursais pelo (vice)presidente, juízo posteriormente submetido ao reexame pelo Tribunal ad quem, atende a economia e a celeridade processual, estando ainda ajustada aos postulados da preponderância do mérito e a deformalização processual[3] tão caros ao Código.

Consequentemente, também na situação do joeiramento da natureza da questão, constitucional ou infraconstitucional, e na sua recolocação na via própria (RE ou REsp), impõe-se ao (vice)presidente utilizar os comandos dos artigos 1.032 e 1.033 do CPC.

Não pensamos que os artigos 1.032 e 1.033 do CPC tratem de uma específica e especial aplicação da fungibilidade recursal. Na fungibilidade, mantém-se o processamento do recurso interposto (agravo, quando seria o caso de apelação), sem exigir sua transformação, pois se têm os recursos como fungíveis, logo qualquer deles seria apto ao enfrentamento da questão[4].

Porém, aplicando o artigo 1.032, não se admitirá o processamento do recurso como especial, a despeito do caso ser extraordinário, a par da fungibilidade. O recurso necessariamente será requalificado. O recurso especial será processado como extraordinário, com as retificações indispensáveis. Não se terá por indiferente ser situação de recurso extraordinário ou especial. O que ocorre é o reposicionamento do recurso erroneamente interposto. Ainda, em tal situação, não há dúvida sobre qual o recurso a ser interposto. Se o tema é constitucional, cabe recurso extraordinário, sendo o recurso especial predestinado ao debate infraconstitucional.

A bem da verdade, os dispositivos pressupõem o erro na interposição do recurso, na medida em que o recorrente deveria ter interposto o recurso extraordinário ao invés do recurso especial, o inverso ou interposto os dois recursos em conjunto.

Como na mecânica recursal a interposição desses recursos se dá na mesma oportunidade, contra idêntica decisão (acórdão), pode o recorrente dar de barato determinada questão como infraconstitucional, quando ela é tipicamente constitucional. Ao reverso, pode ter por constitucional questão destituída dessa gala. O imbricamento na fundamentação do acórdão pode ainda contribuir decisivamente para tal confusão.

Presente tal contexto, o Código autorizou que o relator desconsidere o erro, requalificando o recurso, com as adaptações eventualmente necessárias, atribuindo nova valência à preponderância do mérito no âmbito recursal (primazia do mérito).

Nessa temática, porque envolvida a correção de recurso, o (vice)presidente pode reposicionar na via própria o recurso, desconsiderando o erro da interposição e processando-o na via correta, bem como determinar as correções imprescindíveis à análise. Prestigia-se a economia, a celeridade processual, a preponderância do mérito e a deformalização processual.

Assim, no juízo de admissibilidade faseado (bifásico), em que se autoriza ao (vice)presidente na origem realizar o joeiramento prévio sobre a regularidade do recurso interposto, permite-se a ele o exercício de todos os poderes inerentes ao relator do tribunal superior, entre eles, determinar a retificação dos recursos especiais e extraordinários.


[1] DUARTE, Zulmar. Preponderância do Mérito no Novo CPC. Disponível: https://blog.grupogen.com.br/juridico/2015/01/23/preponderancia-do-merito-no-novo-cpc/ Acesso: 29-jan-17.
[2] DELLORE, Luiz; GAJARDONI, Fernando da Fonseca; OLIVEIRA JUNIOR, Zulmar Duarte de; ROQUE, André Vasconcelos. A jurisprudência defensiva ainda pulsa no novo CPC. Disponível: http://www.conjur.com.br/2013-set-06/jurisprudencia-defensiva-ainda-pulsa-codigo-processo-civil Acesso: 29-jan-17.
[3] GRINOVER, Ada Pellegrini. Deformalização do processo e deformalização das controvérsias. In______: Senado Federal. Revistas de Informação legislativa. Ano 25. n. 97. Jan/mar 1998. Brasília: Senado Federal, 1998. p. 195).
[4] Concordamos com MACHADO, no sentido de que a fungibilidade recursal, embora próxima, não se confunde com a aplicação da instrumentalidade das formas (MACHADO, Marcelo Pacheco. Incerteza e processo. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 171/173).

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