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Princípio do devido processo legal
Luiz Fux
06/09/2022
Neste trecho extraído do livro Curso de Direito Processual Civil, Luiz Fux explica o princípio do devido processo legal e faz diferenciações entre este conceito e o de devido procedimento. Leia!
Princípio do devido processo legal
É imagem assente a de que o processo que não segue o procedimento traçado padece do vício do descompasso com o dogma constitucional do devido processo legal. Em primeiro lugar, insta advertir que o devido processo não é o devido procedimento, pela distinção notória entre essas duas categorias. Ademais, o devido processo, a que se está sujeito antes da perda dos bens da vida mencionado na Constituição Federal, impede a “autotutela”; por isso, o legislador constitucional excluiu-a ao dispor sobre o necessário recurso ao Judiciário.7
Em segundo lugar, o devido processo é o adequado à luz da situação jurídico-material narrada. Assim, a execução é a devida diante do título executivo, a cognição ordinária adequada diante da incerteza e a tutela sumária e rápida é a devida e correspondente diante da “evidência do direito da parte”.
O princípio do devido processo legal tem como um de seus fundamentos o processo “justo”, que é aquele adequado às necessidades de definição e realização dos direitos lesados. O senso de justiça informa, inclusive o due process of law na sua dupla conotação, a saber: lei justa e processo judicial justo – substantive due process of law e judicial process.8
Destarte, o devido processo legal está encartado no direito ao processo como direito ao meio de prestação da jurisdição, que varia conforme a natureza da tutela de que se necessita. O direito à jurisdição não é senão o de obter uma justiça efetiva e adequada. Isso basta para que o juiz possa prover diante dessa regra in procedendo maior, ínsita na própria Constituição Federal, a despeito de sua irrepetição na legislação infraconstitucional. A previsão na Carta Maior revela a eminência desse poder-dever de judicar nos limites do imperioso. Satisfazer tardiamente o interesse da parte em face da sua pretensão significa violar o direito maior de acesso à justiça e, consectariamente, ao devido processo instrumental à jurisdição requerida.
A tutela imediata dos direitos líquidos e certos, bem como a justiça imediata frente ao periculum in mora, antes de infirmar o dogma do due process of law, confirma-o, por não postergar a satisfação daquele que demonstra em juízo, de plano, a existência da pretensão que deduz.
O acesso à justiça, para não se transformar em mera garantia formal, exige “efetividade”, que tem íntima vinculação com a questão temporal do processo. Uma indefinição do litígio pelo decurso excessivo do tempo não contempla à parte o devido processo legal, senão mesmo o “indevido” processo.9
A posição dos que impedem essa forma de tutela sob a alegada afronta aos princípios hoje constitucionalizados não nos parece correta. A própria tutela de evidência, mediante cognição sumária, utiliza-se dos conceitos e requisitos aqui sugeridos do “direito líquido e certo” que não sofre uma contestação séria, autorizando o juízo ao julgamento pela verossimilhança (art. 311, I e IV).10
Ademais, a crítica que se empreende é no sentido de que a tutela satisfativa não pode ser chancelada por mera cognição sumária. Efetivamente, não é isso que ocorre na tutela imediata dos direitos líquidos e certos, tanto mais que a própria evidência do direito propicia “cognição exauriente imediata”, a mesma que se empreenderia ao final de um processo onde fossem necessárias etapas de dissipação da incerteza quanto ao direito alegado.
Desta forma, afasta-se eventual alegação de infringência ao devido processo legal, que supõe cognição indevida.11
Considere-se, ainda, e por fim, que na origem anglo-saxônica do princípio está previsto o julgamento prima facie evidence, operando-se não só em prol do demandado mas também em favor do autor, para que obtenham justiça rápida.12
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NOTAS
7 Roberto Rosas. Devido Processo Legal, 2020; Humberto Bergmann Ávila. O que é “devido processo legal”? Revista de Processo, São Paulo, v. 33, n. 163, p. 50-59, set. 2008; Carlos Roberto Siqueira Castro. O Devido Processo Legal e os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade, 2006.
8 Hernando Devis Echandia, “El Derecho Procesal como Instrumento para la Tutela de la Dignidad y la Libertad Humana”, Estudios de Derecho Procesal, 1985, p. 171-172.
9 Não obstante os inúmeros pontos de contato entre as nossas afirmações e as do brilhante Marinoni, ele, após admitir em caso de evidência a cognição exauriente com deferimento de liminar, conclui da inadequação do mesmo, porque sumarizado, em confronto com o devido processo legal (Efetividade e Tutela de Urgência, 1994, p. 44). Atento a essas situações de urgência, as quais equiparamos à de evidência, pela busca de um procedimento formalmente sumarizado: a exegese do processo cautelar, no sistema brasileiro atual, há de ser feita “a partir dos pressupostos doutrinários que determinam o atual contexto legislativo, de modo que caibam nele, ao lado das demandas cautelares, um grupo diferenciado de processos sumários, de tipo injuncional, onde a tutela satisfativa seja prestada, sob o manto protetor do processo cautelar, empregando-se a estrutura da tutela de segurança para preencher a lacuna deixada pela inexistência, no Direito brasileiro, das inibitórias, pelas quais se atribua ao juiz o poder de sustar uma execução em curso; noutras vezes, devido à demanda interdital ou em processo injuncional, incluindo-se nele, mais ou menos disfarçadamente, uma liminar satisfativa, com vestes de cautelar, a qual, todavia, em seus efeitos práticos, acaba sendo mesmo uma provisional antecipatória da tutela ordinária” (Ovídio Baptista, Comentários, p. 97).
10 “Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
I – ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;
(…)
IV – a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. (…)”
11 Conforme Marinoni, Efetividade e Tutela de Urgência, cit., p. 124.
12 Ovídio Baptista, A Plenitude da Defesa no Processo Civil: Estudos em Homenagem a Frederico Marques, p. 148 e segs.