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Prequestionamento virtual no Novo CPC: quem, o quê, onde, como quando e por quê?

ART. 1.025

EMBARGOS DECLARATÓRIOS

FUNÇÃO NOMOFILÁCICA

PREQUESTIONAMENTO

PREQUESTIONAMENTO VIRTUAL

RECURSO DE REVISTA

RECURSO ESPECIAL

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

WRIT OF ERROR

Zulmar Duarte

Zulmar Duarte

04/04/2017

No presente texto, em estrutura informativa, pretendemos apresentar o tema do prequestionamento virtual no atual Código de Processo Civil, mecanismo destinado à superação de um dos graves problemas que se apresenta ao conhecimento dos recursos extraordinários, especiais e de revista.

Em traços bem gerais, o prequestionamento é requisito de admissibilidade dos recursos tendentes à uniformização do sentido e alcance do direito positivo, notadamente o recurso extraordinário, especial e de revista — recursos de superposição.

O prequestionamento, ligado historicamente à lei judiciária norte-americana de 24.9.1789 (writ of error — ERE 96.8002, relator Ministro Alfredo Buzaid, RTJ 109/299), não é explicitamente indicado como requisitos de tais recursos em nosso texto constitucional[1].

Ainda assim, a constitucionalidade do aludido requisito de admissibilidade recursal foi reconhecida inúmeras vezes pelo Supremo Tribunal Federal, que aplica reiteradamente os enunciados de súmula nos 282[2] e 356[3] de sua jurisprudência.

Em suma, o prequestionamento nada mais é do que a necessidade da prévia submissão da questão (infra)constitucional aos tribunais inferiores (previamente questionadas), a fim de que a mesma seja passível de conhecimento pelos Tribunais de Superposição (STF, STJ, TST e etc.), nas vias recursais especialíssimas do RE, REsp e Recurso de Revista (recursos de superposição).

A expressão prequestionamento (o signo linguístico) direciona o entendimento. Prequestionamento é a indispensabilidade da questão[4], a ser objeto de o recurso de superposição, ter sido discutida no acórdão recorrido[5], o que abre e possibilita o debate dialético da questão no recurso de superposição[6]. Como tais recursos estão fundados na discussão da violação da legislação (infra)constitucional, imprescindível que o recurso a ser interposto demonstre que o acórdão recorrido se deteve sobre tal tema. O prequestionamento é condição de possibilidade dos recursos que visam a uniformização do entendimento sobre o sentido e alcance do direito positivo — função nomofilácica[7].

Portanto, em uma primeira perspectiva, ter-se-á prequestionada a questão quando a mesma tenha sido resolvida no acórdão recorrido, ou seja, pela circunstância do acórdão demonstrar que, na dinâmica do recurso, os julgadores “questionaram-se” sobre a violação do preceptivo (infra)constitucional.

Na mecânica do processo, o prequestionamento se dá normalmente com a apresentação pelas partes da questão (infra)constitucional (artigo 141 do CPC[8]) , na medida em que demandam e exigem a análise do Tribunal para o tema (artigos 489, § 1o, inc. IV[9] e 1.013, §§ 1o e 2o do CPC[10]).

Porém, o problema ocorre quando o Tribunal, embora jungido à análise da questão (infra)constitucional apresentada, não lhe dá o devido enfrentamento, pois decide o tema por perspectiva diversa ou tem aquela questão apresentada pela parte por irrelevante.

Fica estabelecido o impasse.

A parte tem a questão (infra)constitucional como importante ao êxito de sua pretensão, mas não obtêm sua análise pelo Tribunal a quo, que lhe tem por desimportante. Contudo, a renitência do Tribunal transcende o acórdão, na medida em que também obstaculiza a parte de ressuscitar o debate da questão nos recursos de superposição pela ausência de prequestionamento.

Aliás, em casos limites, o enfrentamento do tema sob o viés, por exemplo, infraconstitucional, impede que a parte tenha seu recurso extraordinário conhecido, ainda que tivesse maiores chances na perspectiva do debate constitucional[11].

Nesse quadro, os embargos declaratórios se apresentavam como o instrumento para forçar o prequestionamento, na medida em que compeliam o Tribunal a examinar forçosamente a questão sobre a qual se pretendia prequestionar.

Todavia, não raras as vezes, ainda que interposto os embargos declaratórios, o Tribunal não realizava o enfrentamento específico do tema, pelo que se reavivava o questionamento: a matéria foi prequestionada?

O Supremo Tribunal Federal em diversas ocasiões tem a matéria por prequestionada em leitura, a contrario sensu, de sua súmula no 356 (supra transcrita), aceitando o que se convencionou designar por prequestionamento ficto. Isto é, interposto o embargo declaratório sobre o ponto omisso, prequestionada estará o tema constitucional.

Em sentido diametralmente oposto, o Superior Tribunal de Justiça rejeita via de regra o prequestionamento ficto, tendo por insuficiente a apresentação pela parte do embargo declaratório, pelo que indispensável o enfrentamento específico pelo tribunal da questão infraconstitucional, como deixa claro o seu enunciado de súmula 211: “Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal a quo.”.

Presente tal contexto, generalizou-se na prática a interposição de recurso especial apontando a violação do artigo 535 do CPC de 1973 (artigo 1.022 do CPC atual), a fim de que o Superior Tribunal de Justiça reconhecesse a omissão do Tribunal anterior em realizar o enfrentamento da questão suscitada e reeditada nos embargos declaratórios[12].

Ao propósito, o Código Processo Civil tomou partido na discussão, pelo que dispôs expressamente:

“Art. 1.025.  Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade.”.

Tem-se aí o prequestionamento virtual, decorrente de uma eficácia integrativa automática predisposta nos embargos declaratórios. Isso porque, nos termos do artigo 1.025, a interposição dos embargos declaratórios, com o fim de prequestionamento, importa na inclusão virtual dos argumentos suscitados pela parte no acórdão recorrido, possibilitando assim a interposição dos recursos de superposição pela presença do prequestionamento (virtual).

Claro, para tanto, o Tribunal Superior necessitará reconhecer previamente a existência de erro, omissão, contradição ou obscuridade do acórdão no enfrentamento da matéria apresentada. Tal necessidade visa afastar a tentativa do prequestionamento tardio, em que a parte apresenta embargos declaratórios com matéria até então estranha aos autos e que poderia ter sido previamente enfrentada, mas sobre a qual não se dedicou[13].

Agora, nas situações em que a parte trabalhe com a questão (infra)constitucional previamente, a apresentação dos embargos declaratórios contra o acórdão recorrido integrará o mesmo, prequestionando virtualmente aquela. Prestigia-se igualmente a celeridade e a economia processual, na medida em que não se faz necessário reenviar ao Tribunal de Origem o processo para reapreciação quando o Tribunal Superior reconhecer o erro, a omissão, a contradição ou a obscuridade no acórdão recorrido.

Das duas, uma: ou o Tribunal Superior entende que o acórdão já analisou a matéria excogitada nos declaratórios, pelo que ausentes tais vícios, e o prequestionamento estará presente e não mais virtualizado; ou reconhece o vício e tem a matéria prequestionada virtualmente.

Logo, é uma boa nova o prequestionamento virtual.


[1] A Constituição de 1891 mencionava questionar no art. 60, § 1, alínea a, enquanto a Constituição de 1934 era incisiva: ”em recurso extraordinário, as causas decididas pelas Justiças locais em única ou última instância: a) quando a decisão for contra literal disposição de tratado ou lei federal, sobre cuja aplicação se haja questionado;” (Art. 76, 2, III, a).
[2]“É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão
recorrida, a questão federal suscitada.”.
[3]“O ponto omisso da decisão, sôbre o qual não foram opostos embargos
declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o
requisito do prequestionamento.”.
[4]“Quando uma afirmação compreendida na razão (da pretensão ou  da discussão) possa engendrar dúvidas e, portanto, tenha de ser verificada, converte-se numa questão. A questão, pode-se definir, pois, como um ponto duvidoso, de fato ou de direito, e sua noção é correlativa da afirmação.” (CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil: composição do processo. Traduzido por Hiltomar Martins Oliveira. São Paulo: Classic Book, 2000. vol II, p. 39).
[5] MEDINA esclarece acertadamente: “(…) de acordo com as lições de Menestrina e Carnelutti, já citados neste trabalho, o termo questão não se aplica somente quando há constatação de ponto alegado por alguma das partes, mas também quando o próprio juiz tenha suscitado a dúvida sobre determinado ponto. Desse modo, haverá questão federal ou questão constitucional sempre que o juiz aplicar a lei federal ou a Constituição à hipótese, seja em decorrência de as partes terem controvertido acerca de determinado ponto, tornando-o questão a ser resolvida pelo órgão julgador, seja quando o próprio órgão julgador identificar o ponto, colocá-lo em dúvida e sobre ele resolver. Importa, sob esse prisma, que a questão tenha sido resolvida pelo juiz, seja ou não em virtude de provocação da parte.” (MEDINA, José Miguel Garcia. O prequestionamento dos recursos extraordinário e especial. 2. Ed. São Paulo: RT, 1999. p. 236. Nesse mesmo sentido, aponta GREGO: “O conceito de questão, a meu ver, deve ser bastante abrangente, ou seja, o de qualquer ponto de fato ou de direito sobre o qual deva o juiz pronunciar-se em caráter decisório” (GRECO, Leonardo. O saneamento do processo e o projeto de novo Código de Processo Civil. Revista Eletrônica de Direito Processual, v. VIII, jul./dez. 2011, p. 579. Disponível: http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/redp/article/view/20836 Acesso: 16-out-16).
[6] Com tais reparos, obvia-se a crítica de ARAKEN DE ASSIS: “Turvou a clareza do tema a deletéria influência da própria palavra “prequestionamento”. Formada a partir de derivação prefixial do termo “questionamento”, o contexto jurídico não lhe podou a natural relação de sentido, sugerindo a todos os espíritos que prequestionar é questionar antes. Essa semântica vulgar há que ceder passo às proposições normativas.” (ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. 2. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: RT, 2008. p. 702/703).
[7] CALAMANDREI, Piero. La cassazione civile. Milano: Fratelli Bocca, 1920. vol. 2, p. 104.
[8]“Art. 141.  O juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.”.
[9]“Art. 489.  São elementos essenciais da sentença: (…). § 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (…). IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; (…).”.
[10]“Art. 1.013.  A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. § 1o Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado. § 2o Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais.”.
[11] Não se pode olvidar que diversas matérias são tratadas tanto na Constituição quanto na legislação infraconstitucional, em verdadeiro imbricamento legislativo, donde resulta, em diversas oportunidades, decisões distintas a depender do enfoque e Tribunal respectivo.
[12] SIMARDI FERNANDES explica: “Ou seja, por meio desse recurso especial poderá o recorrente pleitear ao Superior Tribunal de Justiça que reconheça o desacerto da decisão do órgão a quo, por ter violado o art. 535, II, do estatuto processual, para que, provido o recurso especial, sejam os autos devolvidos ao órgão a quo, com a determinação de que se manifeste sobre as questões a respeito das quais se omitiu.” (FERNANDES, Luís Eduardo. Simardi. Embargos de declaração: efeitos infringentes, prequestionamento e outros aspectos polêmicos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2012. p. 271).
[13] Obviamente, tal difere da situação em que a violação à legislação (infra)constitucional ocorre, ex novo, no próprio acórdão recorrido.

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