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PROCESSO CIVIL
O Processo Cautelar Autônomo está morto e cremado, mas a Tutela em si continua firme e forte no Novo CPC
Elpídio Donizetti
09/11/2016
- Das tutelas idôneas para asseguração do direito
O processo cautelar, como instituto autônomo não consta do novo CPC, o mesmo ocorreu com a tipificação das medidas cautelares. O fato de ter suprimido a autonomia do processo cautelar e não mais ter repetido as hipóteses de cabimento em nada interfere na tutela cautelar. Todas as tutelas antes tipificadas (nominadas) no CPC/73 podem ser concedidas com base no poder geral de cautela.
A existência da tutela de urgência de natureza cautelar se justifica pela natural demora na atuação e satisfação do direito por meio do processo de conhecimento, seguido do cumprimento da sentença, ou por meio do processo de execução. Essa demora, natural porque a atuação da jurisdição se embasa em análises definitivas, pode conduzir à ineficácia da prestação jurisdicional. Surgem então as medidas cautelares como forma de garantir a efetividade da tutela pleiteada, mediante averiguação superficial e provisória da probabilidade do direito do requerente e da possibilidade de ocorrência de dano de difícil reparação ou ocorrência de risco ao resultado útil do processo.
Se no curso do processo de conhecimento, no qual se discute a propriedade de um automóvel, ou mesmo antes da instauração do processo, houver fundado receio de que o réu venha a danificá-lo, pode o autor pleitear o sequestro do bem. A medida que decreta a apreensão do bem litigioso, por si só, não vai garantir o direito do autor, mas apenas a efetividade do processo se ele sair vencedor, o que em última análise significa proteção ou acautelamento do direito substancial. Embora um dos requisitos da tutela cautelar se refira ao perigo ao resultado útil do processo, a referibilidade sempre será o direito material afirmado pela parte requerente.
Com o mesmo objetivo, pode o credor de um título executivo requerer, antes ou no curso do processo de execução, o arresto de bens suficientes para garantir o seu crédito, caso tome conhecimento de que o devedor está dilapidando todo o patrimônio.
Como se vê, a tutela cautelar concedida em caráter incidental ou antecedente tem caráter instrumental, porquanto objetiva assegurar a utilidade do processo em qualquer de suas fases, afastando, assim, o risco de inocuidade da prestação jurisdicional.
As medidas provisórias de urgência de natureza cautelar podem ser efetivadas mediante qualquer uma das medidas nominadas nos arts. 812 e seguintes do CPC/73. Os nomes desapareceram do novo CPC, uma vez que não há requisito específico para esta ou aquela medida – todas serão concedidas com base no poder geral de cautela –, mas a tutela permanece. As medidas cautelares típicas (nominadas) não mais se encontram regulamentadas no novo CPC. Contudo, permite-se que o juiz, com base no poder geral de cautela, defira a tutela adequada para acautelar o direito a ser certificado no processo de conhecimento ou realizado por meio do processo de execução ou na fase do cumprimento da sentença. Em caráter exemplificativo, o art. 301 do novo Código elenca o arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação para assegurar o direito afirmado no processo, mas qualquer outra medida útil a tal finalidade pode ser concedida. A necessidade de acautelamento do direito posto em juízo determinará a natureza da tutela a ser deferida.
Arresto é a medida de apreensão de bens que tem por fim garantir futura execução por quantia certa. Ele incide sobre bens indeterminados e seu efeito principal é a afetação do bem apreendido enquanto a decisão não for modificada ou revogada. Se, por exemplo, um determinado credor perceber que seu devedor está ocultando ou dilapidando o patrimônio para fraudar eventual execução, pode pleitear a tutela de urgência através do arresto de tantos bens quanto bastem para garantir a futura execução por quantia certa. Vale lembrar que a medida também pode ser pleiteada no bojo da execução.
Por outro lado, o sequestro é medida que visa garantir execução para a entrega de coisa, ou seja, sua incidência é sobre bens determinados. Exemplo: autor e réu disputam a propriedade de um automóvel em ação reivindicatória. Qualquer uma das partes pode requerer o sequestro desse bem, a fim de garantir a completa realização do direito. Evidentemente que a parte que tem a posse do bem não vai se interessar por requerer o sequestro.
Para o deferimento da medida, que pode ser antecedente ou incidental, é necessário que o juiz se convença de que, sobre o bem objeto da ação (futura ou em trâmite) tenha-se estabelecido, direta ou indiretamente, uma relação de disputa entre as partes da demanda.
O arrolamento de bens, por sua vez, tem a finalidade de conservar bens sobre os quais incide o interesse do requerente da medida, como, por exemplo, do cônjuge para resguardar sua meação na partilha; do herdeiro em relação aos bens da herança; do sócio em relação aos bens sociais etc. Tal conservação se faz com o arrolamento, ou seja, com a “listagem” dos bens e seu depósito, que pode recair sobre a pessoa do possuidor.
Distingue-se o arrolamento das medidas de arresto e sequestro. No arresto, faz-se a constrição de bens indeterminados, bastantes para garantir futura execução por quantia certa. No sequestro, a constrição recai sobre bem determinado que esteja sendo objeto de disputa ou que venha a ser disputado. Já no arrolamento, a constrição incide sobre bens indeterminados, não litigiosos, com o exclusivo intuito de conservá-los, até a resolução de demanda que com eles se relaciona.
As três primeiras (arresto, sequestro e arrolamento) encontravam-se previstas no CPC/73 como espécies de medida cautelar. Com relação ao registro de protesto contra alienação, apesar de não haver dispositivo correspondente na legislação de 1973, já estava abarcado pelo poder geral de cautela do juiz previsto no art. 798 do CPC/73. A medida consiste na averbação, pelo oficial do registro de imóveis, na matrícula do imóvel, do protesto contra a alienação de bens, com a finalidade de tornar pública a discordância do credor quanto à alienação de bem do devedor.
O registro de protesto contra a alienação não impede o exercício do direito de dispor, que é inerente à condição de proprietário, mas permite que terceiros tomem ciência da pretensão do requerente. A publicidade dessa medida servirá para evitar futura alegação de boa-fé por parte do adquirente do imóvel objeto do protesto.
Para melhor compreensão acerca dessa medida que, ressalte-se, não é nova em nosso ordenamento, vejamos trecho do posicionamento do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº. 1.229.449/MG, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi:
“Processual Civil. Protesto contra alienação de bens. Limites. Requisitos. Legítimo interesse. Não-nocividade.
1 – O protesto contra alienação de bens não tem o condão de obstar o respectivo negócio tampouco de anulá-lo; apenas tornará inequívocas as ressalvas do protestante em relação ao negócio, bem como a alegação desse – simplesmente alegação – em ter direitos sobre o bem e/ou motivos para anular a alienação […]”.
O protesto contra alienação de bens é medida tipicamente cautelar. Como já dito, a exclusão do processo cautelar autônomo do nosso ordenamento jurídico não impede que providências cautelares sejam adotadas pelo juiz. A essência das medidas cautelares permanece presente em nosso ordenamento, não mais como medidas cautelares típicas ou nominadas, mas com base no poder geral de cautela, que permite ao magistrado conceder as medidas exemplificativamente citadas, bem como “qualquer outra medida idônea para asseguração do direito” (art. 301, parte final, CPC/2015).
* Nota do editor: Conheça a segunda edição do Novo CPC Comentado de Elpídio Donizetti apresentada pelo autor:
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