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O que acontece com o devedor de condomínio no Novo CPC?

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O que acontece com o devedor de condomínio no Novo CPC?

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Luiz Dellore
Luiz Dellore

31/10/2016

Há algumas colunas, tratei de uma das novidades que o Novo CPC trouxe a quem reside ou trabalha em condomínio: a possibilidade de recebimento da carta de citação pelo porteiro[1]. Hoje trato de outro ponto relevante: o que acontece, no NCPC, com o devedor de condomínio?

Da execução do débito condominial (desnecessidade de prévio processo de conhecimento)

No Código anterior, diante da falta de pagamento de cota condominial, o condomínio tinha de ingressar em juízo com processo de conhecimento, que tramitava pelo procedimento comum, rito sumário.

Ou seja, o réu era citado para comparecer a uma audiência e apresentar defesa, sob pena de revelia. Ao final do processo de conhecimento, seria proferida uma sentença, da qual ainda caberia recurso de apelação antes de haver o trânsito em julgado e consequente formação do título executivo.

Caso não houvesse defesa, haveria revelia e, depois, a sentença e aí a possibilidade de cumprimento de sentença. Era um longo caminho para se chegar até a constrição de algum bem do devedor.

No Novo Código, houve importante mudança: o débito condominial passou a ser título executivo. Ou seja, o condômino devedor será citado não mais para se defender, como antes, mas para pagar. E, caso não haja pagamento, já haverá a penhora – e não mais a revelia, como antes.

Claro que o executado poderá se defender, via embargos, mas o processo de execução, exatamente pelo exposto no parágrafo acima, é muito mais ágil que o processo de conhecimento.

A novidade vem prevista no art. 784 do Novo CPC:

Art. 784.  São títulos executivos extrajudiciais: (…)

X – o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas;

Para que seja possível a execução, é necessário que se observem alguns requisitos, devidamente previstos no Código:

(i) a despesa condominial deve ter sido prevista na convenção ou em assembleia geral;

(ii) é necessária prova documental de que a despesa foi aprovada em convenção ou assembleia;

(iii) deve existir prova documental de que houve a cobrança do condomínio (por boleto ou outro meio), devidamente entregue ao condômino (entrega pelo correio ou e-mail, com aviso de recebimento ou por recibo, quando da entrega do boleto pelo porteiro)

Assim, despesas não previstas em assembleia não poderão ser cobradas; despesas eventualmente mencionadas na assembleia, mas que não constam da ata assemblear, não poderão ser cobradas; e se o boleto de condomínio não for entregue ao condomínio, não poderá haver a execução.

Mas, além disso, existem algumas dúvidas que terão de ser respondidas pela jurisprudência.

Por exemplo: é possível que débitos de condomínio anteriores à vigência do NCPC sejam executados? Ou somente débitos surgidos após a vigência do Novo Código, em março de 2016, poderão ser executados?

Considerando que a lei processual aplica-se imediatamente (art. 1.046)[2], parece-me ser possível a execução de débitos condomínios vencidos antes mesmo da vigência do Código.

Além disso, pela mesma razão, parece ser viável até mesmo se requerer a desistência de processos de conhecimento ajuizados, para que se dê início a processo de execução. O que não é possível é a conversão de processos de conhecimento já ajuizados em processos de execução, considerando a grande distinção entre execução e conhecimento.

Porém, é certo que há um risco ao assim se proceder, pois pode haver entendimento que o título executivo somente surge apenas após a vigência do Código[3], pois o tema seria de direito material e não processual.

Assim, para se valer da inovação em relação a débitos condominiais anteriores à vigência do NCPC, o advogado deve alertar a parte (o condomínio, na pessoa do síndico) dos riscos, especialmente a sucumbência caso a execução não prospere, e o maior tempo que isso acarretará para o recebimento do crédito, com o novo ajuizamento de um processo de conhecimento.

De qualquer forma, trata-se de uma questão que logo deixará de ter relevância – já que já estamos com 7 meses de vigência do NCPC.

Uma dúvida que persistirá por mais tempo é se o débito condominial é título executivo em qualquer hipótese. A questão se coloca pois o inciso X do art. 784 faz menção a condomínio edilício. A expressão se refere também a condomínios de casas ou somente a condomínios de apartamentos (prédio, edifício)?

O NCPC, no art. 238, § 4º, ao se referir à citação recebida pelo porteiro[4], expressamente menciona “condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso”. Nesse caso, não há dúvidas: são prédios e casas.

A partir desse dispositivo, pode-se entender, por uma interpretação sistemática, que o título executivo apenas se refere aos condomínios de apartamentos. A reforçar esse entendimento, a previsão do Código Civil em relação ao condomínio edilício[5].

De qualquer forma, com uma interpretação finalística (princípios da efetividade e razoável duração do processo), seria possível interpretar o artigo legal também para englobar também a existência de título em relação a condomínio de casas[6].

Quanto ao ponto, resta verificar como ficará a jurisprudência.

Da possibilidade de medidas atípicas (como vedar o uso à área de lazer)

Em recente decisão, proferida à luz do Código anterior, o STJ reafirmou seu entendimento de não ser possível que o condomínio vede o acesso a determinadas áreas comuns (como de lazer) para o condômino inadimplente. A decisão constou do informativo 588/STJ[7].

E no NCPC, ainda seriam vedadas medidas como esta?

Entendo que o Novo Código permite outras medidas, não somente a execução e penhora[8], dentre as quais merece destaque a vedação do uso de área de lazer por parte do devedor de condomínio. A questão deve ser analisada sob dois enfoques: o que pode ser feito extrajudicialmente e o que pode ser feito em juízo.

Comecemos pelo tema mais simples, que é o que pode ser feito no âmbito do processo judicial. No NCPC o art. 139, IV traz a atipicidade das medidas executivas – tema já antes tratado nesta coluna[9].

Ora, se o novo sistema prevê medidas atípicas para a observância de débito judicial, como a apreensão de passaporte, carteira de motorista e cancelamento de cartões de crédito, é certo que a proibição do uso de área de lazer ou salão de festas (ou outra medida adequada para o caso concreto) pode ser determinada pelo juízo no âmbito de uma execução de débito condominial.

Essa previsão, inclusive, pode ser expressamente estipulada entre condomínio e condôminos, na assembleia de condomínio, ao se prever um negócio jurídico processual (NJP, art. 190 do NCPC) que preveja as medidas atípicas no momento da execução.

Mas e antes do processo, ainda no âmbito extrajudicial, é possível que o condomínio assim proceda? No sistema anterior, como se viu do julgado mencionado em nota de rodapé, o STJ assim não admitia.

Contudo, se à luz do NCPC as partes podem estipular o procedimento em juízo, porque não podem estipular o que acontece extrajudicialmente? Se há maior liberdade para as partes em um processo presidido pelo juiz, deve haver maior liberdade na própria negociação entre elas.

Sendo assim, se o regimento interno do condomínio ou assembleia condominial assim estipularem, parece-me possível medidas coercitivas também antes do ingresso em juízo.

Mas temos de aguardar para verificar qual será a resposta dos tribunais quanto ao tema, se haverá mudança ou não – e isso ainda levará algum tempo.

O fato é que o NCPC traz uma nova realidade para quem vive ou trabalha em condomínio. E não só para os profissionais da área jurídica.


[1] O tema foi tratado na seguinte coluna: O Novo CPC permite que a citação do condômino seja recebida pelo porteiro?

[2] Art. 1.046.  Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

[3] Entre os autores que participam da coluna, há grande divergência.

[4] Tema enfrentado na coluna mencionada na nota 1.

[5] O assunto é tratado no CC a partir do art. 1.331, sendo que o § 2º desse artigo deixa claro que o condomínio edilício é aquele em que há um prédio e apartamentos (§ 2º O solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração centrais, e as demais partes comuns, inclusive o acesso ao logradouro público, são utilizados em comum pelos condôminos, não podendo ser alienados separadamente, ou divididos.).

[6] Outra possibilidade a cogitar seria a elaboração de negócio jurídico processual para, na assembleia condominial, decidir que o boleto condominial seria título executivo extrajudicial.

[7] DIREITO CIVIL. ILICITUDE DA PROIBIÇÃO DE USO DE ÁREAS COMUNS PELO CONDÔMINO INADIMPLENTE. O condomínio, independentemente de previsão em regimento interno, não pode proibir, em razão de inadimplência, condômino e seus familiares de usar áreas comuns, ainda que destinadas apenas a lazer. Isso porque a adoção de tal medida, a um só tempo, desnatura o instituto do condomínio, a comprometer o direito de propriedade afeto à própria unidade imobiliária, refoge das consequências legais especificamente previstas para a hipótese de inadimplemento das despesas condominiais e, em última análise, impõe ilegítimo constrangimento ao condômino (em mora) e aos seus familiares, em manifesto descompasso com o princípio da dignidade da pessoa humana. (…) Assim, segundo dispõe o art. 1.337, caput e parágrafo único, do CC, a descrita reiteração do descumprimento do dever de contribuição das despesas condominiais, poderá ensejar, primeiro, uma imposição de multa pecuniária correspondente ao quíntuplo do valor da respectiva cota condominial (500%) e, caso o comportamento do devedor contumaz evidencie, de fato, uma postura transgressora das regras impostas àquela coletividade (condômino antissocial), podendo, inclusive, comprometer a própria solvência financeira do condomínio, será possível impor-lhe, segundo o mencionado quórum, a multa pecuniária correspondente de até o décuplo do valor da correlata cota condominial (1.000%). (…) Aliás, é de se indagar qual seria o efeito prático da medida imposta (restrição de acesso às áreas comuns), senão o de expor o condômino inadimplente e seus familiares a uma situação vexatória perante o meio social em que residem. Além das penalidades pecuniárias, é de se destacar, também, que a lei adjetiva civil, atenta à essencialidade do cumprimento do dever de contribuir com as despesas condominiais, estabelece a favor do condomínio efetivas condições de obter a satisfação de seu crédito, inclusive por meio de procedimento que privilegia a celeridade. Efetivamente, a Lei n. 8.009/1990 confere ao condomínio uma importante garantia à satisfação dos débitos condominiais: a própria unidade condominial pode ser objeto de constrição judicial, não sendo dado ao condômino devedor deduzir, como matéria de defesa, a impenhorabilidade do bem como sendo de família. E, em reconhecimento à premência da satisfação do crédito relativo às despesas condominiais, o CPC/1973 estabelecia o rito mais célere, o sumário, para a respectiva ação de cobrança. Na sistemática do novo CPC, as cotas condominiais passaram a ter natureza de título executivo extrajudicial (art. 784, VIII), a viabilizar, por conseguinte, o manejo de ação executiva, tornando ainda mais célere a satisfação do débito por meio da incursão no patrimônio do devedor (possivelmente sobre a própria unidade imobiliária). Ademais, além de refugir dos gravosos instrumentos postos à disposição do condomínio para a específica hipótese de inadimplemento das despesas condominiais, a vedação de acesso e de utilização de qualquer área comum pelo condômino e seus familiares, com o único e ilegítimo propósito de expor ostensivamente a condição de inadimplência perante o meio social em que residem, desborda dos ditames do princípio da dignidade humana. REsp 1.564.030-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 9/8/2016, DJe 19/8/2016.

[8] Vale lembrar que, no caso de débito condominial, o bem imóvel que dá origem ao débito pode ser penhorado – mesmo que seja bem de família (L. 8.009/90, art. 3º, IV).

[9] Gajardoni tratou do tema na coluna em 2 oportunidades: aqui e aqui. Além disso, no Jota, também Rodovalho tratou do tema: aqui.


VEJA AQUI OUTROS TEXTOS DA SÉRIE CPC 2015

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