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Reforma Previdenciária: Inconsistências do suposto déficit
Gustavo Filipe Barbosa Garcia
16/12/2016
São diversas as propostas de reforma previdenciária apresentadas pelo governo, tendo como traço comum tornar mais difícil o direito e o acesso às prestações previdenciárias.
A principal justificativa para tornar mais rigorosos os requisitos de recebimento dos benefícios previdenciários decorre da necessidade de equilíbrio financeiro da Previdência Social, objetivando reduzir o seu suposto déficit.
Na verdade, qualquer reforma da Previdência Social precisa considerar, primeiramente, a sua necessária inserção no âmbito mais amplo da Seguridade Social, como sistema que também abrange a Saúde e a Assistência Social, conforme determinação constitucional (art. 194)[1].
A manutenção da Previdência Social, assim, faz parte do custeio da Seguridade Social, o qual ocorre não só de forma direta, ou seja, por meio de contribuições sociais, mas também indireta, isto é, com a utilização de recursos dos orçamentos fiscais dos entes políticos (art. 195 da Constituição da República).
Nesse sentido, o princípio da diversidade da base de financiamento da Seguridade Social (art. 194, parágrafo único, inciso VI, da Constituição Federal de 1988) impõe que o seu custeio, inclusive quanto à esfera previdenciária, ocorra por meio de diversas formas, bases e sujeitos.
Portanto, as contribuições previdenciárias, destinadas exclusivamente ao pagamento de prestações do Regime Geral de Previdência Social (art. 195, incisos I, a, II e art. 167, inciso IX, da Constituição da República), não constituem a única fonte de custeio do sistema previdenciário. Além de diversas outras contribuições para a Seguridade Social, há previsão constitucional de seu financiamento por toda a sociedade.
As contribuições para a Seguridade Social do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada não se resumem àquela incidente sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados à pessoa física que lhe preste serviço (mesmo sem vínculo empregatício), mas também abrangem as contribuições sobre a receita ou o faturamento (Cofins), inclusive do PIS/PASEP (art. 239 da Constituição Federal de 1988), bem como sobre o lucro (CSLL).
Além disso, há contribuições para a Seguridade Social do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, bem como sobre a receita de concursos de prognósticos e do importador de bens ou serviços do exterior (ou de quem a lei a ele equiparar).
Justamente por isso, torna-se frágil a alegação de déficit da Previdência Social quando sabemos que esta faz parte da Seguridade Social, tendo contribuições sociais que deveriam ser vertidas ao orçamento próprio (art. 165, § 5º, inciso III, da Constituição Federal de 1988) e utilizadas apenas para o custeio das respectivas prestações.
Revela-se insustentável a suposta insuficiência de recursos da Seguridade Social se o que existe, na realidade, é a desvinculação de contribuições da Seguridade Social, fazendo com que parte de seus valores deixem de ser utilizados em suas finalidades específicas, relativas à concessão das prestações previdenciárias, de saúde e de assistência social.
Aliás, de modo manifestamente contraditório com o discurso de déficit da Previdência Social, a Emenda Constitucional 93, de 08 de setembro de 2016, ao modificar o art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, ampliou o percentual de desvinculação de recursos da União (DRU), passando a prever que são desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2023, 30% da arrecadação da União relativa às contribuições sociais.
Isso significa a existência de permissão ao poder público para utilizar recursos inerentes à Seguridade Social com finalidades diversas, tornando incongruente qualquer alegação de que o seu custeio atual da Previdência não é suficiente para manter o necessário equilíbrio financeiro.
Como se pode notar, a legitimidade da reforma previdenciária exige amplo debate com a sociedade, com a apresentação de dados reais e completos sobre os recursos públicos e a sua forma de utilização, sem se deixar levar por discursos inconsistentes e padronizados.
[1] Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito da seguridade social. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 13-14.
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