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O novo regramento das ações de indignidade (Lei 14.661/2023) impacta o direito previdenciário?
Marco Aurélio Serau Junior
29/08/2023
Em 23/8/2023 foi publicada a Lei 14.661, que alterou parcialmente o regramento das ações de indignidade previsto no Código Civil de 2002, introduzindo neste diploma legal o art. 1.815-A, adiante transcrito:
Art. 1.815-A. Em qualquer dos casos de indignidade previstos no art. 1.814, o trânsito em julgado da sentença penal condenatória acarretará a imediata exclusão do herdeiro ou legatário indigno, independentemente da sentença prevista no caput do art. 1.815 deste Código.
A previsão a respeito dos denominados herdeiros “indignos”, que são excluídos da sucessão, se encontra no art. 1.814 do Código Civil de 2002:
Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I – que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
II – que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III – que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.
Os termos para a ação judicial voltada à declaração da indignidade estão previstos no art. 1.815 do Código Civil:
Art. 1.815. A exclusão do herdeiro ou legatário, em qualquer desses casos de indignidade, será declarada por sentença.
§ 1º O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro anos, contados da abertura da sucessão.
§ 2º Na hipótese do inciso I do art. 1.814, o Ministério Público tem legitimidade para demandar a exclusão do herdeiro ou legatário.
Teor da mudança operada pelo art. 1.815-A
Neste sentido, qual o teor da mudança operada pelo art. 1.815-A, recém introduzido no Código Civil de 2002?
O que se percebe é que o referido artigo não alterou o rol de dependentes indignos, tampouco alterou o formato para propositura da ação de indignidade tratada no art. 1.815 do Código Civil.
Porém, tornou a ação de indignidade “desnecessária” quando ocorrer a condenação criminal transitada em julgado e que venha a reconhecer a indignidade (art. 1.814, do Código Civil) mediante a ocorrência de homicídio doloso (inciso I), calúnia (inciso II) ou violência contra o autor da herança (inciso III).
Nesta hipótese, a própria sentença penal transitada em julgado terá como efeito próprio a exclusão do dependente ou legatário indigno do rol de beneficiados pela sucessão.
O sistema processual brasileiro é caracterizado pela independência das instâncias judiciais (penal, cível e administrativa); todavia, as instâncias judiciais, apesar de independentes, são relacionadas, isto é, produzem efeitos umas nas outras, especialmente da esfera penal na esfera cível.
Como se viu pela dicção do art. 1.815-A, recém inserido no Código Civil, a condenação criminal que retrate indignidade dos sucessores e legatários operará efeitos imediatos de exclusão desse rol, independentemente de sentença cível específica, que é permitida nos termos do art. 1.815 do mesmo diploma legislativo.
Impactos da Lei 14.661/2023 no Direito Previdenciário
Isto posto, passaremos a refletir se essa alteração legislativa de alguma forma impacta o Direito Previdenciário, onde existe a figura dos dependentes indignos, e se há também algum impacto nas ações judiciais previdenciárias – que são objeto de nosso livro Processo Previdenciário Judicial.
Ora, a nossa ver é nítido que a alteração trazida pela Lei 14.661/2023 reforça a sistemática de exclusão do dependente indigno já encampada pela legislação previdenciária.
Ressalve-se que a legislação previdenciária só admite a indignidade do dependente previdenciário no caso do crime de homicídio doloso, não incorporando as outras hipóteses do art. 1.814, do Código Civil.
A perda da condição de dependente está prevista no art. 16, § 7º, da Lei 8.213/1991 – Lei de Benefícios da Previdência Social:
Art. 16. (…)
§ 7º Será excluído definitivamente da condição de dependente quem tiver sido condenado criminalmente por sentença com trânsito em julgado, como autor, coautor ou partícipe de homicídio doloso, ou de tentativa desse crime, cometido contra a pessoa do segurado, ressalvados os absolutamente incapazes e os inimputáveis.
O art. 74, § 1º, da mesma Lei 8.213/1991, trata da cessação do direito ao benefício de pensão por morte:
Art. 74. (…)
§ 1º Perde o direito à pensão por morte o condenado criminalmente por sentença com trânsito em julgado, como autor, coautor ou partícipe de homicídio doloso, ou de tentativa desse crime, cometido contra a pessoa do segurado, ressalvados os absolutamente incapazes e os inimputáveis.
Por fim, deve-se registrar uma medida interessante que se encontra prevista no art. 77, § 7º, igualmente da Lei 8.213/1991, que permite a suspensão cautelar do benefício de pensão por morte mesmo antes da sentença penal condenatória transitada em julgado, des que existam indícios do crime de homicídio doloso contra o segurado:
Art. 77. (…)
§ 7º Se houver fundados indícios de autoria, coautoria ou participação de dependente, ressalvados os absolutamente incapazes e os inimputáveis, em homicídio, ou em tentativa desse crime, cometido contra a pessoa do segurado, será possível a suspensão provisória de sua parte no benefício de pensão por morte, mediante processo administrativo próprio, respeitados a ampla defesa e o contraditório, e serão devidas, em caso de absolvição, todas as parcelas corrigidas desde a data da suspensão, bem como a reativação imediata do benefício.
As hipóteses de cessação do benefício e suspensão cautelar do benefício de pensão por morte poderão ser discutidas judicialmente pelos pensionistas eventualmente prejudicados, caso os requisitos legais para tanto, bem como o princípio do devido processo legal, não tenham sido adequadamente observados.
O questionamento judicial deste tópicos ocorrerá através de ações previdenciárias, que seguirão as características que tratamos em nossa já mencionada obra Processo Previdenciário Judicial.
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