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Pela Mão de Benjamin e Bergson: forma artística do fascismo e a Modernidade

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Pela mão de Benjamin e Bergson: forma artística do fascismo e a Modernidade

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WALTER BENJAMIN

José Manuel de Sacadura Rocha

José Manuel de Sacadura Rocha

23/08/2019

Um exame de WALTER BENJAMIN nos leva a pensar a arte em sua metamorfose comunicativa e questionar o seu papel a partir da Modernidade. Antes a arte era para ver e inteirar-se sem a tocar, é a distância que inspira, importa a presença teológica (que paira!). A arte clássica tem áurea como um culto. Essa áurea se perde com a reprodutividade técnica. Deixa de ser valor cultual e sim valor de exposição.

Não existe mais culto e sim propagação de imagem. No cinema (treinamento!) a distância se vai. Serve para excitar e o espaço é um sistema de venda da imagem. (“Supermercado do visível” em Peter Senje). O cinema pode alterar, manipular a imagem e mudar a percepção, pode recompor a imagem e entrar na mente do espectador. Por este motivo cineastas procuraram fugir às manipulações (Tarkovski, Antonioni, Goudard). Isto não pode acontecer com o pintor (mas é possível com o mágico – e a mágica que manipula a atenção e os sentidos é arte? (Ricardo Harada)). Ao mesmo tempo Benjamin acreditava que a reprodutividade técnica, como o cinema, podia levar cultura às massas operárias devido a seu barateamento, durabilidade e portabilidade expansiva.

Hoje o digital ampliou essa realidade. Mas o comercial vira entretenimento (Debord). Semelhante ao Dadaísmo (Duchamp) que queria provocar o choque mesmo em suas limitações plásticas. Mas o cinema pode ser um projétil. A obra passa a ter uma qualidade tátil e não contemplativa. Não vemos como isso entra pelo olho e impregna o cérebro. A arte, moderna e contemporânea, em suas realizações visuais táteis do tipo digital acompanha seu tempo quanto à reprodutividade técnica. Não importa se o espectador “faz acontecer algo”, ele não tem tempo para ver e cultuar. Isto pode ser propositado, maquinado para consumo. Isto se faz por uma percepção tátil como a arquitetura, uma instalação. Seguindo-se Benjamin pode-se colocar aqui o cinema e todas as imagens reprodutivas.

O visual assim se subordina modernamente ao tátil – o cinema pode não ser propriamente arte, mas uma forma de parar a contemplação para a distração e treinamento das massas. O cultuar ganha outras dimensões: projetar, arrebatar, treinar, naturalizar como o fascismo e o nazismo bem o sabem. Seriados são táteis. Leilões são táteis. Murais, grafites, “memes”, intervenções precisam ser apreciadas com cuidado.

Para HENRI BERGSON existe a percepção superficial e outro tipo em profundidade. A subjetividade se divide em dois Eu. Superfície e um Eu das profundezas. Neste se aprofunda o sentido do real. Em Benjamin caminhamos para o automatismo superficial. Em Bergson mergulhamos pra chegar a algo mais profundo. Mas as dimensões do Eu se comunicam, duas partes de um só entendimento. O mais profundo leva a uma transcendência divina (Spinoza).

Até a Modernidade há que se perceber a beleza formal da invenção, dos espaços, superfícies, cores, excluindo o que não tem relação intrínseca com as coisas. A reflexão se dirige às formas. Mas agora o Kitsch é mercadológico, é entretenimento, comercial. No Kitsch o conteúdo já está na obra, quando não o espectador se funde ao autor e/ou curador [kitsch pós-moderno]. Na obra de arte moderna a reflexão do espectador deve extrair esse conteúdo – e/ou criá-lo. Ele não é suspenso para cultuar ou convidado ao profundis, mas a ser o criador – o que cria já contém em termos o entendimento profundo.

O popular e o erudito devem eclipsar-se, ambos capazes de efetuar essa leitura – portanto, não existe a necessidade da suspensão que deve ser recriada profundamente. O real é então minimalista… A essência do objeto é mostrada… A tragédia, e o seu final apoteótico, devem ser escancarados. Eis a armadilha: a manipulação técnica faz provar do conteúdo já projetado, as massas se sentem felizes, elas podem entender a obra, se sentem partícipes de seu destino, é a verdade revelada que leva [de fato não!] da superfície à profundidade. Na obra artística clássica se exige o distanciamento, na obra moderna o contato, lá a renúncia, agora a cumplicidade. E esse é o perigo, o perigo da reprodutividade, não apenas da obra, mas das formas ideais, das formas sociais. A obra revela-se, dirige para o conteúdo que todos podem verificar.

Algo se dirige contra a ideia que a pintura poderia representar o mundo?! Mas precisamente no caso da pintura, a pintura modernista pode desvencilhar-se do primado das formas, da harmonia e das cores, sem possibilidades de reprodutividade, sem definir o real e o papel de seu resgate ideal. É o caso do Fauvismo (Rouault), Expressionismo (Munch), Abstracionismo (Kandinsky), do Surrealismo (Dali) ou do Cubismo (Picasso). Assim os regimes fascistas da primeira metade do século XX foram ambivalentes e expuseram pela arte toda a sua paranoia inverossímil: usaram a panfletagem, a fotografia e o cinema para a reprodutividade dos conteúdos, o teatro e as artes plásticas “realistas” como modelos construtivistas mercadológicos e de entretenimento, ao mesmo tempo em que perseguiram os artistas de vanguarda e suas obras, pois estas poderiam levar o público à contemplação e ao estado reflexivo onde todas as possibilidades de conteúdo podiam estar presentes. Ao mesmo tempo as obras clássicas eram lidas como símbolos de grandes civilizações a serem reconstruídas, enquanto era vedada a experiência da sensibilização e da facticidade histórica que os produziu. (As civilizações Grega e Romana tiveram momentos gloriosos de democracia e abomináveis de imperialismo e dominação).

O pós-moderno é popular. Possibilidades morrem e novas aparecem dinamicamente. Existe uma melancolia… A melancolia trata-se de uma crítica sem tempo. Algo dura ou não na mesma velocidade, até aparecer algo a suplantar. Já existe uma saturação do tátil, das imagens que nos subjugam. Nem se pode mais entender o que subentende e o que faz subsumir. O fim está em permanente fim e recomeço. Não existe o passado e só o presente importa: isso é pós-moderno. Ele é ausência de futuro, vem depois da ideia de futuro. As pessoas não param para contemplar, fotografam e passam, elas circulam. Consomem a obra de arte circulando! E pagam para isso! Inversamente, contemplar [pausar!] é [era!] então estar no presente, e isto possibilita o pós-alguma-coisa-no-futuro, nos faz viajar para trás e para frente, de um ponto a outro.

Contemplar é ser contemporâneo da obra de arte, ela não morre e vive em nós quando a vimos. Ela nos faz suspender no tempo e com isso se “suspende” a si mesma. Isto que faz o presente ser eternidade: a obra que se contempla(rá) sobrevive ao seu tempo. O contemporâneo pós-moderno não quer ser contemporâneo. Mas a arte insiste em querer ser contemplada, a nos chamar para a possibilidade de ver algo além do que vivemos de imediato, consumindo. Deve existir algo especial na obra de arte, intempestivo nas possibilidades de vir a ser. Uma atmosfera fora de seu tempo. Não parece profícuo, nem justo, que aquilo que interessa é apenas o que vai vir. Contudo, como contra o tempo, para trás e para frente, ele virá. Mesmo o fruto precisou um dia ser a semente da árvore, assim como o fruto queimará na terra a sua semente.

Fonte: Núcleo de Ética Jurídica

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[1] A partir de um seminário de David Lapoujade, Instituto Tomie Ohtake, São Paulo, 21 de maio de 2019.


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