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Gestão da inovação jurídica

25/01/2025
O Direito não está isento de novidades. Mais do que isso, mesmo no âmbito do agir profissional jurídico, pode haver benefícios em fazer as coisas de um jeito diferente, o que justifica estar atento às oportunidades de ganhos por tal via. Não apenas leis novas ou interpretações novas, nomeadamente judiciárias, mas também outras posturas, estratégias, procedimentos. E os estudos e análises a esse respeito já se multiplicam. Há quem acredite que pode conseguir o que pretende batendo, martelando, forçando a barra; um agir advocatício de insistência que, não raro, termina em desistência, além de deixar marcas ruins na estrutura: tanto se bate que, alfim, está amassado, arranhado, quando não se tenha um resultado que, permeado de gambiarras, irá se arrebentar a qualquer momento e, com ele, o cliente. Infelizmente, isso só contribui para o descrédito da advocacia, esvaziando a banca.
Em escritórios de renomado empenho e eficácia, a clientela abunda. Afinal, não são poucos aqueles que estão dispostos a pagar pelo sossego de suas noites. Proporcionar sono bom deveria ser a meta de todo advogado: confiança, segurança. Para consegui-lo, entrementes, há que estudar. No Direito, a estrada para a Cidade das Esmeraldas, onde vive o grande Oz, não é feita de tijolos amarelos, mas de livros, com a licença de L. Frank Baum. Eis uma verdade elementar. Quer outra? Como abelhas nas flores de manjericão, juristas se encontram em meio a prateleiras de livros, atraídos e fascinado pela fertilidade de suas páginas. O resto é lero-lero e daí só partem voos de galinha; triste, mas verdadeiro, ainda que as postagens em redes sociais queiram afirmar o contrário.
Aqueles que dominam a teoria jurídica estarão aptos a ir adiante e, enfim, experimentar uma vivência segura da inovação. Dominam os caminhos já postos, já conhecidos; correm por eles com naturalidade. Para os de pouco estudo, florestas que assustam; mas florestas têm suas sendas e quem as domina caminha sem medo. Vão à sombra, como se diz por aí. Mais do que isso, seu piso são séculos de humus depositado: solo fértil para o que é novo. Em suma: saber o que é para propor o que pode ser. Pensar fora da caixa, expressão que se tornou um dos mantras da onda inovadora, pressupõe não ter a caixa como elemento de surpresa. Nem todo mundo nos adverte disso: é essencial dominar o pensamento na caixa para situar-se adequadamente fora dela, salvo quando há quebras absolutas de paradigmas, o que é raro e, obviamente, implica riscos, como bem demonstrou Thomas Kuhn em seu Estrutura das Revoluções Científicas.
De qualquer sorte, advogados empresarialistas experimentam esse desafio: o mercado em geral está procurando inovar. E, no mor das vezes, inovações empresariais tem lastros jurídicos inevitáveis. Projetos empresariais em descompasso com o Direito nascem fadados ao fracasso (ou, no mínimo, a reiterar problemas). O papel do advogado nesse ambiente criativo, caracterizado por uma ferrenha disputa por mais e melhores negócios, é vital. O jurista é um dos pilares dessa cadeia de alterações criativas, vale dizer, um dos vetores que permitem a administradores empresariais e investidores realizarem seus desejos de alterar suas atividades para experimentar avanços. Não é o único; mas é indispensável. Inovações empresariais devem caber no Direito vigente. A simples opção por passar a efetuar vendas on-line, por exemplo, tem grandes implicações jurídicas que precisam ser previamente pensadas.
Foi essa percepção que nos orientou na redação de Estruturação Jurídica de Empresas (Atlas, 2024): propor um método de ação advocatícia que atenda ao desafio proposto por investidores, administradores, gerentes empresariais: da arquitetura da pessoa jurídica à engenharia jurídica empresarial. Não apenas para a criação de empresas, mas para a sua reforma (reestruturação). Nesse cenário, deve-se atentar mais e mais para a gestão da inovação jurídica. As empresas devem buscar uma melhoria sistêmica que não se resuma a avanços tecnológicos materiais (máquinas, softwares etc.), mas que deve compreender todo o processo empresarial e, assim, a própria arquitetura do negócio. Esse movimento evolutivo implicará o recurso a profissionais diversos, entre os quais os advogados. Só um investidor, administrador ou gerente negligente ou imprudente, deixaria de sentar-se e ouvir uma análise jurídica para suas ideias e planos.
Num mercado em rota de expansão, investir no diálogo de múltiplas fontes não é mera medida de excelência, mas postura que permite uma compreensão mais segura sobre os movimentos possíveis e suas implicações, entre custos, desafios, eventuais resistências e obstáculos (e respostas possíveis), aprovações regulatórias, sustentabilidade, variações prováveis e seus efeitos, controles necessários. A partir de ângulos variados, melhor se define como a empresa pode responder às demandas e/ou oportunidades. Aliás, dando um passo atrás, a postura empresarial correta consulta especialistas já na fase de diagnóstico do problema, o que tende a ampliar a eficiência da estruturação de soluções, além de dar-lhe maior solidez. Isso se mostra ainda mais claro quando se procura desenvolver adaptações a mudanças sociais e mercadológicas; uma resposta equivocada pode afundar [ainda mais] a empresa em crise.
No âmbito específico da gestão da inovação jurídica, o sucesso dessas iniciativas está diretamente vinculado ao estabelecimento de uma avaliação precisa do que se tem e, já aí, do que eventualmente deva ser corrigido. Mais uma vez, a necessidade de dar um passo atrás, posicionando adequadamente o marco a partir do qual se deve avançar. Por isso, em Holding Familiar e suas Vantagens (17.ed. Atlas, 2025), destacamos o momento fundamental da sintomatologia jurídica. Primeiro deve-se fazer um levantamento dos sintomas que trazem o cliente ao especialista. Noutras palavras, o primeiro passo é perscrutar o que ele sente: o que o preocupa, o que o incomoda, o que lhe dói, o que almeja, o que sonha, o que pretende etc. Afinal, a sintomatologia é a disciplina que se ocupa do levantamento de sinais e sintomas, bem como de sua interpretação. E não se pode olvidar que sintoma é palavra de origem grega com que se forma a partir de duas ideias tómos (parte, pedaço) e sin (em conjunto, unido). Chega ao português a partir do latim: symptoma é a junção das partes, dos múltiplos sinais que, unidos, permitem aquilatar o que se passa e, de resto, qual a intervenção adequada.
O desafio é não termos essa cultura da auditoria (ou sintomatologia) jurídica, no que andamos mal. Obviamente, o advogado não é o único vetor de inovação; mas é um profissional indispensável para que a concretização de estratégias de reformulação se faça de forma juridicamente correta e sustentável. Sem planejamento jurídico adequado, esses movimentos podem se revelar catastróficos, reiteramos. Ainda que a atuação do jurista seja lateral, é parte componente do esforço. Não há como fugir à incidência dos parâmetros jurídicos. Mesmo a adoção de via digitais constituem inovações negociais e têm reflexos que devem ser corretamente posicionados, conforme parâmetros de excelência do Direito Obrigacional, Contratual, Empresarial etc.
Há mesmo casos em que a inovação jurídica está representada pela postura singela de amoldar a organização e sua atividade negocial ao Direito vigente. Registram-se diversas situações nas quais o esforço para respeitar princípios e normas do Direito Ambiental. E com ganhos indiretos, inclusive. Trabalhando para implementar níveis mais elevados de sustentabilidade da atividade produtiva, organizações a perceberem a existência de sinergias produtivas que, enfim, melhoraram os resultados empresariais, reduzindo custos, criando novas fontes de receita (como a venda do que, antes, era considerado resíduo), ampliando lucro operacional etc. No agronegócio de ponta, isso vem ocorrendo muito, a exemplo daqueles que percebem ganhos com a agricultura regenerativa, utilização de ciências biológicas para otimização de resultado, entre outros exemplos. Caminhos inovadores que exibiram suas virtudes a partir de uma postura de adequação legal, constituindo histórias que são, em si, fascinantes.
Do rescaldo morno das demandas sem ventura, onde a advocacia se amarga no destino das expectativas contrariadas, das teses que pareciam tão solidas e se frustram repetidamente nas mãos daqueles que manejam o poder de processar e julgar como afirmação de um alvedrio e não de um serviço público, saem mais e mais profissionais brilhantes que não mais suportam compreenderem-se como profissionais dessas causas. Alguns se permitem um ajuste saudável, uma mudança na clientela e na atuação que, se não finda a desolação, ao menos ameniza esse latejar reiterado. Os que migram não sentem sequer nostalgia dos anos tempestuosos de embates. Arrepiam aversão quando lhes assaltam a recordação. Estão realizados em utilizar o conhecimento jurídico de forma diversa, como pensamento proativo e não reativo e retórico, para dizer o mínimo.
Mas deixemos as dores [e as delícias?] alheias para lá: o contencioso para quem é de contenda; é um caminho nobre e necessário, ainda que o litígio para muitos seja a prova maior do fracasso do Direito: o dever-ser não foi e, daí, será preciso agir, processar, decidir. Não é o encontro das vontades (o sinalagma, o negócio, o contrato), mas a sentença, o acórdão, a [re]afirmação do poder coercitivo estatal. A razão das chaves em [re]afirmação? O poder estatal afirmado na norma e reafirmado na jurisdição, embora com a variante possível da arbitragem (compreensível como jurisdição privada). Voltemos nosso olhar para o outro agir advocatício: consulta, assessoria, planejamento, nomeadamente nos territórios do Direito Privado nos quais a garantia constitucional de livre iniciativa jurídica licencia-nos passear pela imaginação, pela criação, tudo cozinhado em fogo lento no caldo dos conhecimentos jurídicos. Sim, a gente cria (principalmente instrumentos de contrato). E é delicioso.
A estruturação e a administração das organizações e das atividades negociais é, por si só, um plano relevante para o estabelecimento e o aproveitamento de inovações jurídicas. Nem sempre o olhar que procura inovar dirige seus olhos para si mesmo, ou seja, para a própria estrutura corporativa. É usual que as bases e os mecanismos da arquitetura e da gestão empresarial só sejam repensados nos momentos de crise, a exemplo dos ambientes de estagnação mercantil ou dos contextos de maior dificuldade para a solvência das obrigações empresariais. As adversidades revelam-se defensoras convincentes da necessidade de mudar a condução das atividades produtivas e negociais para que se encontrem alternativas que permitam refazer os resultados e, assim, preservar sua existência empresarial (pagamento de fornecedores, trabalhadores, administradores etc.); mais do que isso, preservar a remuneração de seus sócios/investidores.
Quando se estabelece uma gestão jurídica da inovação, a postura e o esforço vão além das crises. É a opção de empresas exímias, sempre atentas às possibilidades de reduzir riscos, além de ampliar e melhorar resultados. Resolver gargalos logísticos geralmente passa por contratações; o mesmo com a contratação de tecnologia ou, havendo desenvolvimento doméstico de invenções e modelos de utilidade, seu registro adequado. Diga-se o mesmo quando a opção seja o comércio exterior (importar e/ou exportar), terceirizar, consorciar-se etc. Noutros casos, em se tratando de inovações corporativas, a exemplo de alterações na administração da sociedade e/ou na gestão de suas atividades produtivas e negociais, pode-se passar por operações jurídicas específicas, como a alteração do ato constitutivo, aprovação pela coletividade social em assembleia ou reunião de sócios, alteração de pactos parassociais eventualmente existentes, como acordos de quotistas ou acionistas, além do amplo espaço das plataformas normativas terciárias, ainda pouco explorado, como demonstramos em Estruturação Jurídica de Empresas (Atlas, 2024).
A reestruturação da empresa pelo estabelecimento de parcerias entre a corporação e outras sociedades, nomeadamente as chamadas startups, é uma outra possibilidade corrente. Eis um movimento essencialmente jurídico. Pode dar-se por meio de incorporação, por meio de aquisição de participação societária (controle ou não), contratação de parceria ou contratação da prestação de serviços e/ou fornecimento de bens. Detalhe: não é incomum que se opte por soluções intermediárias ou mistas, o que é juridicamente possível e, mais do que isso, pode se revelar mais estratégico na situação dada. Exemplo? Ter participação numa sociedade inovadora (startup) e contratá-la para a prestação de serviços ou fornecimento de bens que irão compor a linha de produção, criando um cenário que vai além da terceirização e, conforme as variantes presentes e a tática planejada, por levar a ampliação dos ganhos, como os decorrentes do fornecimento de produtos para outras empresas, valorização de mercado etc. Ilustramos: uma companhia que se interesse pela proposta de uma startup (modelos estatísticos para otimização da gestão de estoques): compra participação relevante e, simultaneamente, contrata a parceira para implantação do sistema, realização de testes e aprimoramento da ferramenta. Trabalha-se o desafio interno e, simultaneamente, busca-se um ganho em nova frente corporativa.
Há quem afirme que, na advocacia, as aflições são certas. Talvez, gente que considere o demoníaco festival de horrores que se pode assistir em alguns corredores judiciários, onde as esperanças se estrebucham em batalhas quase nunca gloriosas. Fazer diferente é possibilidade que, para muitos, deve ser compreendido como uma necessidade: inovar ou ser fulminado profissionalmente (ou na desilusão do exercício da profissão). É bom refletir sobre o próprio espaço. É justo procurar meios para experimentar aquele orgulho que ninguém tira. É razoável pretender por-se a salvo. A vida é curta e o mundo pode ser inaugurado por ação e esperança a qualquer minuto. O que não se pode deixar acontecer é a traição ao direito de lutar pelo próprio destino [inclusive profissional].

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