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Um alerta sobre a privacidade na internet: o que a regulamentação do Marco Civil tem a ver com o caso Apple vs FBI?
Bruno Bioni
07/03/2018
“Parem de espionar” diz a mensagem de uma manifestante em Nova York, em 23 de fevereiro, em apoio à Apple na disputa contra o FBI
Em 2013, as revelações de Edward Snowden abalaram, de certa forma, a confiança dos cidadãos nas instituições. Os documentos vazados pelo ex-analista da Agência Nacional de Segurança Americana indicam que o esquema de vigilância em massa contou com a “colaboração” entre um consórcio de países – os chamados Five Eyes (ou Cinco Olhos, de Austrália, Canadá, Estados Unidos, Nova Zelândia e Reino Unido) – e as corporações privadas. Cidadãos-consumidores sentiram-se traídos de todos os lados.
Por parte do setor privado, o que importava era garantir a audiência de seus consumidores. A solução foi adotar tecnologias de segurança de informação mais rígidas, como aparatos tecnológicos que, em tese, nem mesmo as próprias empresas fossem capazes de quebrar, eliminando-se a mera possibilidade de um solidarismo vigilante.
Era o reconhecimento de que na tecnologia se poderia confiar e essa seria a melhor esperança de combate à bisbilhotagem em massa. Não por outro motivo, a segurança dos dados e comunicações do usuário é uma das principais chamadas publicitárias de um serviço tecnológico hoje em dia.
É nesse contexto que deve ser analisado o embate atual entre a Apple e o FBI, a polícia federal dos EUA. Na visão das empresas de tecnologia, que se contrapõe ao entendimento dos órgãos de investigação, se for reconhecido que a gigante do vale do silício tem a obrigação de driblar o mecanismo de segurança que dá acesso às informações contidas no iPhone de um terrorista, será criado um precedente potencialmente perigoso à privacidade dos usuários.
Por meio dele, tais empresas (como a Apple) deveriam facilitar o acesso, ou até mesmo implementar “portas de acesso” a todos os dispositivos de seus consumidores para o atendimento de ulteriores pedidos similares, o que facilitaria, inclusive, a ação de cyber-criminosos. Esses métodos criados para contornar tais mecanismos de segurança são comumente chamados de backdoors.
A discussão que permeia o caso entre Apple e FBI, portanto, é extremamente complexa e trata, fundamentalmente, de facilitar o acesso aos dados pessoais e comunicações dos cidadãos, de modo que eles sejam mantidos à espera do olhar do Estado.
Os termos “facilitar” e “mantidos”, ora destacados, são os mesmos utilizados na proposta de redação do decreto de regulamentação do Marco Civil da Internet (artigo 13) e que está sob consulta pública até este 29 de fevereiro.
Ocorre que os referidos termos são excessivamente amplos e abrangentes, podendo abrir espaço para interpretações expansivas e até mesmo temerárias, mesmo que estas destoem das intenções originais do decreto. Vejamos:
O artigo 13 do decreto pretende regulamentar o artigo 10 do Marco Civil. A partir dele, os provedores de conexão (que fornecem o acesso à internet) e aplicação (que fornecem serviços e funcionalidades na internet) devem facilitar o acesso aos “registros de conexão e de acesso a aplicações de internet”, “bem como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas” de seus usuários.