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Entrevista: Gabriel de Charbonnières, CEO e fundador da insurtech IZA
ilangoldberg
18/11/2024
Nesta entrevista, conversamos com Gabriel de Charbonnières, CEO e fundador da insurtech IZA. Vindo de uma família com longa tradição de atuação no mercado segurador, Gabriel compartilha os desafios que o levaram a empreender, voltando-se para o até então pouco explorado segmento de profissionais autônomos.
Com formação em instituições acadêmicas renomadas, ele explica como essas experiências influenciaram sua trajetória e como a participação no primeiro sandbox regulatório da Superintendência de Seguros Privados (Susep) ajudou a testar o modelo de negócios da IZA.
Gabriel também aborda as tendências de inovação, os desafios enfrentados pelas insurtechs e sua perspectiva sobre o futuro do mercado de seguros no Brasil.
Confira a entrevista completa a seguir:
Seguros Contemporâneos — Gabriel, você vem de uma família com cinco gerações no setor de seguros, que criou e desenvolveu uma das seguradoras mais tradicionais do País. Que aprendizados (prós e contras) extraiu dessa longa trajetória?
Gabriel – Os aprendizados foram inúmeros. O primeiro foi a necessidade de construir uma carreira acadêmica robusta, o segundo, a importância de uma formação em gestão de empresas familiares, e o terceiro, ser um executivo o mais alinhado possível com as boas práticas de governança corporativa. O caminho foi árduo, com muito vento contra de todos os lados e, muitas vezes, injustiças “só porque eu era da família”. Isso me deu uma casca muito grossa para suportar a pressão, e minha capacidade de trabalho e foco me ajudaram a superar os inúmeros obstáculos encontrados.
O que motivou a decisão de trilhar a sua carreira solo e empreender no mercado de seguros?
Eu tinha uma visão muito diferente do planejamento estratégico da empresa e da cultura de governança que lá existia. Quando joguei a toalha na clássica crise dos quarenta, fui repensar a vida e minhas escolhas, e voltei para a sala de aula para ganhar o distanciamento necessário sobre o que era importante para mim e para os meus próximos anos de vida ativa.
E acabou acontecendo o inevitável: empreender na indústria na qual nasci, cresci e trabalhei. Seguro, no Brasil, ainda é voltado para o “branco rico”, e esse mercado pouco evoluiu na centralidade da real necessidade do cliente: excelência no atendimento e pagamento rápido do sinistro. Percebi que poderia fazer a diferença ao entrar em segmentos de consumo não atendidos pelas seguradoras incumbentes. Assim nasceu a IZA.
Como foi a experiência de participar, por meio da IZA, do primeiro sandbox regulatório lançado pela Susep no país? Se possível, fale dos prós e contras.
O desafio foi significativo. Vivi 17 anos como executivo de grandes empresas, “protegido” por essas estruturas corporativas, e, quando você “vai para a rua”, precisa se reinventar como pessoa e como profissional. O Sandbox me permitiu fazer isso. Com regras mais flexíveis para novos entrantes em um mercado dominado por oligopólios nacionais e internacionais, ele me possibilitou testar minha visão e conceito de como deveria ser uma seguradora digital focada em pessoas (e não patrimonial). A Susep foi fantástica em todos os aspectos, e só tenho agradecimentos.
No novo modelo de sandbox estabelecido pela Susep, que se mantém aberto de maneira permanente a fim de estimular a inovação, que melhorias poderiam ser feitas?
A Susep também está em uma bela curva de aprendizado no que diz respeito à evolução dos modelos de sandbox. A primeira grande inovação foi a redução das reservas técnicas para testar novos conceitos. A segunda permitiu maior abrangência de coberturas e somas seguradas mais altas. Acredito que tudo o que possa flexibilizar e fomentar a inovação e a concorrência é muito benéfico para os consumidores e para o mercado. O Brasil é grande e tem espaço para todos.
Uma vez finalizado o prazo regulamentar, como tem sido a saída do sandbox? Como foi o exercício da concorrência com as grandes seguradoras do mercado antes (durante a permanência no sandbox) e agora, fora dele?
A IZA nasceu focada em um segmento não atendido pelos incumbentes: os profissionais autônomos. As seguradoras tradicionais não tinham apetite para esse perfil de risco, e os corretores de seguros não dispunham de produtos e soluções para oferecer a esse segmento populacional. A grande dor do brasileiro é a falta de proteção financeira e o acesso a procedimentos de saúde que ele possa pagar. Ocupamos esse espaço no segmento de last mile delivery.
Evoluímos o produto de acidentes pessoais, que historicamente é um produto de reembolso, pagando a despesa médica diretamente ao prestador de serviço, o que gera comodidade para o segurado. Integramos nossa API com as principais plataformas de delivery e criamos o primeiro seguro de pessoas intermitente e 100% digital no Brasil.
Realizamos os atendimentos e pagamentos de sinistros de forma digital, e os resultados foram fantásticos: NPS (avaliação dos clientes) de 92, pagamento de sinistros de DMHO (Despesas Médicas, Hospitalares e Odontológicas) em 14 minutos, DIT (Diária por Incapacidade Temporária) em 48 horas e sinistros por morte em até 72 horas.
Hoje, temos uma carteira com mais de setecentas mil vidas seguradas em acidentes pessoais, com uma sinistralidade de 44%, em um segmento considerado de alto risco pelas seguradoras tradicionais. Isso nos permitiu comprovar nossa tese e dar o próximo passo.
A IZA “passou de ano” e, após os 36 meses regulamentares de prazo do sandbox, tornou-se uma seguradora com licença definitiva de vida. Aportamos o capital necessário para a reserva técnica e seguimos em frente com nossa estratégia: sermos uma seguradora de vida, digital, de baixo custo e self-service.
Como você define sucesso na sua carreira como líder de uma companhia de seguros? Existe uma métrica pessoal ou profissional que você busca atingir?
Sem dúvida, minha primeira métrica para me avaliar como líder desta empresa é o fato de conseguirmos alcançar excelência na execução e entregar uma proposta de valor muito clara e eficiente para nossos clientes: eficiência no atendimento, rápido pagamento de sinistro e um resultado de gestão de risco diferenciado. Essas três métricas são nossos pilares, e isso está bem claro para todos.
A questão do engajamento dos 35 colaboradores da IZA, que compartilham o mesmo sonho, acreditam na minha visão e confiam em mim, me torna ainda mais responsável e humilde para atingirmos nossos objetivos.
Por fim, a última métrica seria a famosa estatística de que 85% das empresas morrem nos seus primeiros cinco anos de vida, que se mostra cada vez mais distante para a IZA.
Agora, minha meta pessoal é transformar a IZA em uma empresa perene e geradora de caixa… estamos quase lá.
Como a experiência acadêmica em instituições renomadas, como Harvard e Kellogg School of Management, impactou sua visão de negócios e decisões estratégicas?
Essas experiências foram fantásticas para me ajudar a “abrir a cabeça” e entender melhor que tudo é possível quando se tem uma boa ideia. O modelo americano para o empreendedor, onde tudo é possível, foca em entender qual é o problema do consumidor, identificar a possível solução e partir para a execução. É melhor ter uma execução muito boa do que uma estratégia mirabolante. O foco deve estar na real necessidade do cliente, sabendo que o resto virá.
Em termos mais macro, como enxerga o mercado de seguros no Brasil numa visão de curto e de médio/longo prazo?
Acredito que o mercado de seguros no Brasil poderia ser maior e abranger mais consumidores, e a tecnologia é o meio para permitir que corretores de seguros e bancos alcancem esses segmentos populacionais que ainda estão fora da proteção financeira e do acesso à saúde de forma acessível. A participação no PIB ainda é baixa em comparação com países mais maduros. Por isso, vejo o futuro com bons olhos e muito promissor. A Susep tem essa consciência e busca essa ampliação.
Em termos de inovação, como as insurtechs têm utilizado a tecnologia para democratizar o acesso ao seguro? Quais foram os principais desafios ao trazer uma abordagem diferente para um setor considerado conservador?
As insurtechs, em geral, focaram muito na tecnologia como um meio de venda direta (sem a figura do corretor de seguros), com uma proposta de valor baseada em jornada digital de compra e preço. No entanto, esqueceram que o cliente, de fato, compra eficiência no atendimento e rápida regulação do sinistro. Após quatro anos do primeiro Sandbox, elas passaram a falar mais sobre a inclusão do corretor de seguros na cadeia, gestão de sinistros via inteligência artificial e atendimento. Há um amadurecimento nesse sentido.
No caso da IZA, nascemos com a visão de venda B2B e foco nos três pilares que já citei: excelência no atendimento, liquidação de sinistros em menos de 24 horas e gestão de risco. O corretor de seguros sempre esteve em nossa estratégia de distribuição. Fomos muito questionados pela maioria do mercado incumbente e pelas insurtechs, e hoje parece que nossa visão tem se mostrado a correta.
No contexto regulatório, como você enxerga o ambiente para insurtechs no Brasil? Há alguma mudança que facilitaria a atuação de empresas?
Acredito que a Susep faz um excelente trabalho de controle de solvência e regulação das empresas que atuam no Brasil e, sem dúvida, há muitas oportunidades em cada segmento de riscos. No entanto, isso varia bastante em função do momento do consumo no Brasil e das necessidades dos clientes. Os contratos existentes devem ser respeitados, mas, olhando para o futuro, com a digitalização da economia e dos hábitos de consumo, a agilidade na regulação e o apoio à inovação oferecem muitas avenidas para a Susep, o que é muito positivo para todos.
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