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Direito De Família E Das Sucessões: Desafios Para O Futuro (Primeira Parte)
DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES NO BRASIL
VIII CONGRESSO PAULISTA DE DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES
Flávio Tartuce
08/02/2019
Com mais um ano iniciando, nada melhor do que analisar – ou tentar analisar, em certa medida até arriscando –, quais são os desafios vindouros para o Direito de Família e das Sucessões no Brasil. Procurarei fazer isso em dois textos publicados neste canal, tendo como pano de fundo os debates que foram travados quando do VIII Congresso Paulista de Direito de Família e das Sucessões do IBDFAM, realizado entre os dias 8 e 9 de novembro de 2018, na Associação dos Advogados de São Paulo.
O evento foi coordenado por mim e pelo Professor João Ricardo Brandão Aguirre, sendo composto por sete painéis de debates, três conferências e um talk show com o Ministro Paulo Dias Moura Ribeiro, do Superior Tribunal de Justiça. Nos sete painéis, foram apresentados temas altamente divergentes e atuais sobre o Direito de Família e das Sucessões, que justamente representam os desafios para o futuro, com dois palestrantes, respondendo “Sim” e “Não” a perguntas que foram previamente formuladas pela organização.
Havia também uma interação do público, que igualmente poderia participar dos debates votando “Sim” e “Não” no decorrer dos painéis. Veremos aqui, nos dois textos, quais foram as respostas dos palestrantes e como os presentes se comportaram quanto às respostas, a fim de demonstrar os problemas que devem ser enfrentados não só neste ano de 2019 que se inicia, como também nos que seguem.
Antes mesmo dos painéis, anoto que houve uma bela intervenção do nosso presidente estadual, o Professor João Aguirre, associando o momento em que vivíamos com os debates que envolvem o Direito de Família. Na sequência, a Professora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka proferiu conferência de abertura, demonstrando todos os debates teóricos e práticos que existem – e outros que devem surgir –, no plano do Direito das Sucessões, especialmente com as duas recentes decisões do Supremo Tribunal Federal que repercutem nessa temática, ambas com repercussão geral. A primeira delas é o julgado sobre a parentalidade socioafetiva e multiparentalidade. A segunda diz respeito ao reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil e a inserção do companheiro no art. 1.829 da mesma norma privada.
Pois bem, o primeiro painel de debate foi composto pelos Professores Joyceane Bezerra e Maurício Bunazar, que responderam à seguinte indagação: o Estatuto da Pessoa com Deficiência representa uma evolução para o Direito brasileiro? À primeira coube o “Sim” e ao segundo o “Não”. Foram expostos os principais avanços e também os problemas do EPD, notadamente o fato de a lei ter alterado de forma substancial a teoria das incapacidades, fazendo com que não existam mais maiores de idade que sejam absolutamente incapazes. Os dois expositores, apesar das suas defesas até apaixonadas das posições jurídicas, concordaram que alguns ajustes devem ser feitos na lei, sanando também eventuais contrariedades perante o Código de Processo Civil de 2015.
Já nesse primeiro painel, houve um empate técnico, com cerca de 52% dos votantes respondendo positivamente à indagação, e 48% respondendo negativamente. Essa divergência demonstra que, do ponto de vista prático, o EPD ainda traz grandes desafios aos profissionais especializados do Direito de Família Brasileiro, que compunham a grande maioria do público presente.
Isso também foi percebido no terceiro painel, que teve como objeto a pergunta: a tomada de decisão apoiada é instituto com utilidade prática no Brasil? Sabe-se que essa medida de apoio foi introduzida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, com inspirações nos modelos italiano e alemão, sendo uma alternativa à instituição da curatela, que somente é viável em hipóteses fáticas excepcionais e que dizem respeito a restrições de cunho patrimonial, como consta do art. 85 do EPD. Como palestrantes, o Professor Oswaldo Peregrina Rodrigues respondeu “Sim” e o Professor Anderson Schreiber “Não”.
O resultado da votação acabou por confirmar uma impressão teórica e prática a que cheguei, após ministrar curso para os assessores do Supremo Tribunal Federal em abril de 2018 sobre o assunto, de que o instituto terá pouca ou nenhuma aplicação prática. Pelos termos expressos da lei, notadamente pelos parágrafos do art. 1.783-A do Código Civil, a tomada de decisão apoiada é uma medida judicial, burocrática e com trâmites cheios de detalhes que chegam a confundir até mesmo os mais experientes civilistas.
A medida é de iniciativa da própria pessoa com deficiência, que tem à sua disposição meios mais simples para o apoio de atos patrimoniais, como a simples outorga de mandato perante um Tabelião de Notas. Isso acabou sendo exposto e debatido no painel, e a votação foi cerca de 85% dos presentes respondendo negativamente, e apenas 15% respondendo positivamente quanto à utilidade prática da tomada de decisão apoiada.
Voltando ao segundo painel do dia, ele abordou a antiga possibilidade de debate na culpa nas ações de Direito de Família, respondendo “Sim” a Professora Cláudia Stein Vieira e respondendo “Não” o presidente nacional do IBDFAM, Professor Rodrigo da Cunha Pereira. A questão envolve a Emenda Constitucional n. 66, que supostamente retirou do sistema jurídico a separação judicial, instituto que foi reintroduzido pelo Novo Código de Processo Civil, em flagrante inconstitucionalidade. Tivemos mais um empate técnico, com 49% respondendo positivamente, e 51% negativamente.
Os que responderam positivamente, como foi o meu caso, concluíram que a culpa ainda pode ser debatida para os fins de alimentos, da responsabilidade civil e de fraudes praticadas pelos cônjuges ou companheiros. Os que responderam não foram movidos pelo argumento de que os alimentos não são vinculados à culpa, mas ao binômio ou trinômio alimentar, devendo os outros aspectos citados ser analisados em outras demandas, que não na de dissolução de casamento ou de união estável. Restou pacificado, contudo, que a culpa não gera impactos para fins de uso de nome pelos consortes ou para a guarda de filhos. De todo modo, eis mais um tema que não parece ter atingido a devida e esperada estabilidade jurídica, devendo o seu enfrentamento seguir nos próximos anos.
Para encerrar os trabalhos do primeiro dia de evento, como mencionei no começo do texto, houve um talk show sobre o Direito de Família e das Sucessões na recente jurisprudência do STJ, com o Ministro Paulo Dias Moura Ribeiro, que contou com a minha participação, ao lado dos Professores José Fernando Simão, Luciana Faísca Nahas e Daniel Blikstein.
O Ministro escolheu alguns acórdãos para o debate aberto, envolvendo assuntos como o testamento, a sucessão legítima e a concorrência do cônjuge com os descendentes na comunhão parcial de bens, o uso do nome após o divórcio, o direito real de habitação do companheiro e a multiparentalidade. As discussões foram profícuas, com um verdadeiro diálogo entre a doutrina e a jurisprudência, o que venho defendendo há tempos e que necessariamente deve ser incrementado não só nos eventos jurídicos, mas também nas obras de Direito Civil.
No segundo dia de trabalhos, as discussões prosseguiram, com destaque para os desafios do Direito das Sucessões, o que será abordado por mim no próximo texto a ser publicado neste canal.
Veja também:
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