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Crédito Rural Digital: a tokenização no agronegócio

Marcus Vinícius de Carvalho Rezende Reis
22/09/2025
Neste texto de Marcus Reis, Descubra como o crédito rural digital e a tokenização estão revolucionando o agronegócio, ampliando investimentos e reduzindo custos.
A sanção da Lei 14.478/2022, que regulamentou as criptomoedas, garantiu maior segurança aos exploradores do mercado de ativos virtuais através dos famosos tokens.
A lei tem por objetivo impulsionar a entrada de investidores individuais, institucionais, profissionais e qualificados nesse novo mercado que, após um prazo de maturação, tenderá a se consolidar.
O número de pessoas que investem em ativos digitais, segundo os dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), já superou o número dos CPFs cadastrados na Bolsa de Valores brasileira e representa 3% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro1.
O crescimento no investimento em ativos digitais foi impulsionado pela tokenização, que chegou para democratizar o acesso às diferentes modalidades de aplicações e negócios, reduzindo fronteiras, tornando global o acesso a esses investimentos, além de também reduzir os custos das transações, pois não há a necessidade de intermediadores para a concretização do negócio.
De acordo com o Professor Dr. Alexander Ludolf, especialista em gestão de fundos de investimentos e investidor de ativos digitais e startups, e o Professor Jefferson Colombo, que ministra aulas de finanças na Escola de Economia de São Paulo (FGV/EESP), no artigo intitulado “A tokenização de ativos na nova economia digital”, o fenômeno da tokenização pode ser compreendido como2:
A tokenização é o processo que consiste na criação de uma representação digital de um ativo, que pode ser facilmente negociada, fracionada e transacionada em uma rede blockchain. O mercado de representação digital de ativos reais tem avançado a passos largos no Brasil e no mundo, com diversos casos de uso em bens tangíveis, como imóveis, veículos e obras de arte. A sua grande vantagem é tornar o mercado para negociação desses ativos mais acessível e líquido. Além disso, a tokenização também pode ser utilizada para facilitar a gestão e transferência de ativos intangíveis, como direitos autorais e royalties. Apesar disso, é no âmbito dos serviços financeiros, como uma infraestrutura de liquidação e negociação, que a tecnologia tem mostrado sua grande promessa, apresentando propriedades superiores às tecnologias existentes.
Diante desse cenário, a tokenização se revela como um dos pilares da transformação digital no setor financeiro, promovendo a descentralização, a inclusão e a eficiência nas transações. Com o respaldo legal e o avanço tecnológico, o Brasil caminha para se consolidar como um dos protagonistas no mercado de ativos digitais no mundo, ampliando as oportunidades de investimento e remodelando a forma como os ativos são concebidos, negociados e geridos.
O agronegócio e a tokenização de grãos
A tokenização de ativos do agronegócio tende a abrir espaço para um ecossistema financeiro mais inclusivo e transparente, permitindo uma proximidade entre o “campo e a Faria Lima”, reduzindo intermediários e proporcionando melhores condições de financiamento.
A tokenização pode facilitar, dessa forma, a criação de mercados secundários, fazendo surgir os tokens representativos dos ativos do agronegócio.
A utilização da tokenização no agronegócio pode trazer diversos benefícios, como maior transparência nas transações, redução de custos com intermediação, maior liquidez de ativos e a possibilidade de acesso a investidores que antes não tinham condições de investir em projetos agrícolas.
Produtos que podem ser tokenizados no agronegócio
É possível tokenizar praticamente toda a cadeia do agro, como estoques de produtos agrícolas, direitos de safras futuras, produção leiteira de um rebanho, patentes, novos projetos em biotecnologia, mecanização e sustentabilidade.
De acordo com Cassio J. Krupinsk, CEO da BlockBr Digital Assets, fintech especializada na construção de infraestrutura de ativos, os tokens lastreados em commodities são o uso da inovação tecnológica criando uma forma mais eficiente de negociar, transferir e investir no agronegócio brasileiro, aplicando todos os benefícios da tecnologia blockchain – descentralização, segurança, transparência, entre outros.
Cassio detalha que os tokens:
I. Representam a propriedade de uma determinada quantidade de uma commodity física – ouro, prata, petróleo, grãos, rebanhos de corte e outros – e da valorização que ela terá durante o tempo em que for proprietário dela.
II. São valorizados de acordo com a cotação da commodity atrelada a eles.
III. Não há a posse física do produto, e sim o direito a rendimentos de forma similar às ações, com a vantagem de não lidar com o desafio de armazenar a commodity.
IV. A emissão e o funcionamento das commodities em tokens, em geral, são respaldados por reservas físicas da commodity correspondente em uma entidade emissora confiável. A quantidade total de tokens em circulação deve corresponder à quantidade real da commodity mantida em estoque.
Passo a passo da tokenização de grãos
O Brasil é, atualmente, um dos maiores produtores de soja do mundo e desempenha papel significativo no mercado global de commodities agrícolas, sendo, inclusive, o maior exportador global dessa commodity. Por esse motivo, utilizaremos como exemplo a safra da soja.
Após o plantio, o grão de soja estará pronto para a colheita, em média, após 120 dias.
Depois de ser colhido, o grão seguirá para um silo, para ser armazenado, ou encaminhado a armazéns ou fábricas, aguardando passar pelo processo de esmagamento, virando óleo, farelo de soja ou qualquer outro produto ou destino da cadeia produtiva.
Certo é que, mesmo diante de um novo recorde de produção da safra, uma vez que, ano após ano, o Brasil supera em números as safras anteriores, o agronegócio mantém sua grande volatilidade.
Diante desse contexto, a grande quantidade de soja disponível para comercialização confere espaço e flexibilidade para negociação em diversos mercados. E é justamente nesse ponto que a tokenização pode ajudar.
Os produtores rurais precisam aproveitar as oportunidades para evitar manter seus produtos parados em armazéns, suportando, muitas vezes, valores elevadíssimos de armazenagens, aguardando o valor de mercado subir para, somente depois, vender seus grãos.
De acordo com Anderson Nacaxe, diretor da Agrotoken, empresa pioneira em tokenização de grãos, o Brasil já possui 30% das negociações de crédito no agronegócio acontecendo em operações de permuta, onde o produtor já está usando a sua soja como pagamento.
Ou seja, nosso País já possui cultura e legislação que favorecem que se fale sobre esse ativo como um meio de troca, facilitando a negociação por meio de tokens.
E assim se posicionou Cassio J. Krupinsk:3
É possível por exemplo, tokenizar uma safra de soja, ou seja, criar um arquivo digital criptografado na blockchain e alcançar um público potencial maior do que aquele que tem acesso aos produtos de investimentos ligados ao Agro, como os CRAs (certificados de recebíveis do Agronegócio) e as LCAs (Letras de Crédito do Agronegócio).
Toda emissão desses títulos do agronegócio, representativos de produtos agrícolas ou de promessa de entrega de produtos agrícolas, é registrada no blockchain com todos os detalhes do produto, como quantidades, safra, seguro, prazos de entrega, entre outros.
É possível também a retirada da commodity agrícola por meio da destokenização. São inúmeras as possibilidades de estruturas com tokens no agronegócio, sejam tokens de pagamento, tokens de utilidade ou referenciados em outros ativos.
Entretanto, para todas as estruturas de tokenização utilizadas no agronegócio, faz-se necessária a realização do “Teste de Howey”, para avaliação do ativo como mobiliário ou não.
Esse teste define que um ativo será considerado um valor mobiliário – e, portanto, regulado pela CVM – caso estejam presentes as seguintes características, de forma cumulativa:
I. Investimento, por meio de aportes em dinheiro ou bem suscetível de avaliação econômica.
II. Formalização mediante título ou contrato entre o investidor e o ofertante.
III. Caráter coletivo do investimento.
IV. Expectativa de benefício econômico, seja por meio de direito a alguma participação, remuneração, decorrentes do sucesso dos esforços do empreendedor.
V. Esforço de empreendedor ou de terceiro que não o investidor, cuja atuação seja preponderante para gerar o benefício econômico.
VI. Oferta pública que utilize meios de comunicação “destinados a atingir o público em geral residente no Brasil”, incluindo aqui também oferta feita do exterior pela internet.

NOTAS
1 Disponível em: https://exame.com/future-of-money/criptoativos-tem-mais-investidores-individuais-no-brasil-que-mercado-de-acoes-diz-estudo/. Acesso em: 16 abr. 2025.
2 Disponível em: https://portal.fgv.br/artigos/tokenizacao-ativos-nova-economia-digital. Acesso em: 16 abr. 2025.
3 Disponível em: https://agfeed.com.br/campo-das-ideias/artigo-a-tokenizacao-da-soja-e-o-potencial-por-tras-da-queda-no-preco-do-grao/#. Acesso em: 16 abr. 2025.