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JURISPRUDÊNCIA
Partilha e a Coisa Julgada – Respeito à Autonomia da Vontade
Sérgio Jacomino
25/05/2018
Nesta edição enfrentamos um tema caro aos registradores e notários brasileiros – a desjudicialização e o respeito ao princípio da autonomia da vontade – pelo acórdão proferido pela terceira turma do STJ, em voto e relatório da ministra Nancy Andrighi.
A ministra tocou no ponto fulcral da controvérsia: autonomia da vontade. Diz que “quando mais se incentiva a desjudicialização dos conflitos e o sistema multiportas de acesso à justiça, mediante a adoção e o estímulo à solução consensual, aos métodos autocompositivos e ao uso dos mecanismos adequados de solução das controvérsias, sempre apostando na capacidade que possuem as partes de livremente convencionar e dispor sobre os seus bens, direitos e destinos do modo que melhor lhes convier (o que se reflete, inclusive no âmbito do processo, com a possibilidade de celebração de negócios jurídicos processuais atípicos a partir de uma cláusula geral – art. 190 do CPC/15), conclui-se que o acórdão recorrido está na contramão deste movimento e materializa uma injustificável invasividade do Poder Judiciário na esfera privada”.
As considerações e conclusão da ministra são irretocáveis.
Confira abaixo os comentários da registradora Daniela Rosário Rodrigues.
SJ
Partilha de bens e a coisa julgada material e formal – STJ inova o entendimento
Daniela Rosário Rodrigues*
Em recente decisão, o E. STJ, na 3ª Turma, temperou os efeitos decorrentes da coisa julgada para privilegiar a necessária celeridade processual e o princípio da autonomia da vontade privada. Isso porque, em posicionamento inédito, admitiu a alteração do teor de decisão definitiva, transitada em julgado, para tratar de novo acordo sobre partilha de bens decorrente de divórcio consensual, a ser homologado pelo juízo que originariamente homologou o primeiro acordo.
Em ação de divórcio consensual, os divorciandos deliberaram pela venda posterior dos bens pertencentes ao casal. A necessidade da homologação judicial do acordo decorreu do fato de que os filhos do casal eram menores ao tempo do divórcio, o que impediu o uso da via extrajudicial para a dissolução da sociedade conjugal e regulação dos bens comuns ao casal.
No entanto, decorrido o prazo estipulado no acordo, os efeitos por eles esperados – a efetiva alienação dos bens imóveis comuns – não foram alcançados, o que justificou a revisão do acordo.
As instâncias inferiores entenderam por denegar o pedido sob o fundamento de que a decisão transitada em julgado não poderia ser alterada por mero pedido de revisão promovido pelas partes. Seria necessária a propositura de nova ação para tal fim. De outro lado, o entendimento da Corte superior caminhou em sentido contrário, entendendo que seria dispensável a propositura de ação autônoma, sendo viável a homologação de novo acordo apresentado das partes.
E assim ocorreu para reconhecer que: a) em atendimento à celeridade processual, é muito mais benéfico que se atenda naquele mesmo pleito judicial um pedido que não gera prejuízo a terceiros e independe da manifestação de pessoas estranhas ao processo; b) em atendimento ao Princípio da Autonomia da vontade privada, as partes têm legítimo interesse em promover a alteração do acordo outrora feito por perceber que não alcançou os efeitos esperados; c) não compete ao Estado intervir nas relações privadas a ponto de determinar que mesmo as menores relações patrimoniais, que interessam exclusivamente às partes da demanda originária, dependam do crivo judicial. Haveria excessivo intervencionismo estatal.
Demonstra-se, portanto, a tendência cada vez mais presente de desjudicialização das relações patrimoniais consensuais. Novos procedimentos que podem ser adotados no âmbito extrajudicial, em que não haja o conflito resistido de interesses, são a comprovação de reconhecimento de mecanismos de facilitação do acesso à Justiça. Há, portanto, o indireto reconhecimento do privilégio do conteúdo em relação à forma, de tal sorte que a finalidade essencial da prestação jurisdicional e, por conseguinte, dos meios extrajudiciais de solução de conflitos, é o atendimento do interesse das partes e não a perpetuação e a longa duração do litígio.
* Daniela Rosário Rodrigues é Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Monte Mor/SP e Diretora da ENR/IRIB.
Nota do editor:
- consulte a notícia do STJ: Acordo de partilha de bens com trânsito em julgado pode ser alterado por vontade das partes. [http://bit.ly/2ILZeBP].
- REsp 1.623.475 – PR, j. 7/4/2018, Dje 20/4/2018, rel. min. Nancy Andrighi. [http://bit.ly/RESP-1623475]
- Retificação extrajudicial de formais de partilhas judiciais. Félix Renan Ferreira. [http://bit.ly/2IM0t3X].
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