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A eficácia da norma superveniente no Mandado de Injunção
José dos Santos Carvalho Filho
05/09/2017
A Lei nº 13.300, de 23.6.2016, regulamentando o art. 5º, LXXI, da CF, disciplina o mandado de injunção, individual e coletivo, instrumento adequado quando a falta, total ou parcial, da norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.
Ao instituir tal ferramenta, o Constituinte teve o escopo de enfrentar as omissões normativas, que, em muitas ocasiões, impedem que o titular do direito ou da prerrogativa possa exercê-los com efetividade. Quer dizer: o mandado de injunção auxilia não quem está em busca do direito, mas sim aquele que já é seu titular e que, a despeito disso, não pode torná-lo concreto quando intenta seu exercício.
Se o responsável pela norma regulamentadora for considerado em mora legislativa no mandado de injunção, a decisão que o julgar procedente deve fixar prazo razoável para que o omisso promova a edição da norma (art. 8º, I). Ao mesmo tempo, a decisão estabelece as condições para o exercício dos direitos ou, ainda, as condições para que o interessado promova a ação própria com o objetivo de exercê-los, caso não suprida a omissão no prazo determinado (art. 8º, II). Essas as linhas que devem constar no decisum.
A questão que se põe diz respeito à eficácia da norma regulamentadora superveniente relativamente à decisão proferida no mandado de injunção.
Nesse caso, há que se considerar a situação da decisão ante a nova norma, vale dizer, como ficarão os efeitos dessa norma diante de decisão transitada em julgado que já tenha beneficiado os impetrantes.
No confronto entre os institutos, o trânsito em julgado da decisão prevalece sobre a norma regulamentadora superveniente. Significa que a decisão terá eficácia apenas ex nunc relativamente aos interessados alcançados pela decisão trânsita em julgado. Efeitos anteriores à edição dessa norma não podem ser revistos por ela, porquanto foram produzidos sob a égide de norma válida, qual seja a que decorre da decisão. Os novos efeitos, portanto, só começam a ser produzidos a partir da edição da norma; daí a eficácia ex nunc.
Resulta, desse modo, que a norma regulamentadora superveniente atua para todos, tanto para os que já haviam impetrado o mandado de injunção, tendo obtido decisão favorável, quanto para aqueles que não tivessem recorrido à ação. Afinal, isso nada mais é do que a regra geral de que as leis têm eficácia para o futuro.
Diante desse regime normativo, pode ocorrer que o beneficiado pela decisão seja destinatário de normas regulamentadoras diversas – as contidas na decisão e as disciplinadas pela lei regulamentadora superveniente. Com efeito, suponha-se, para exemplificar, que a decisão tenha solucionado a pretensão do impetrante com as normas A e B. Caso a lei nova tenha adotado a solução com as normas C e D, haveria dupla eficácia para o interessado: uma decorrente da regulamentação judicial e outra oriunda da lei superveniente, cada uma delas incidente sobre seu respectivo período.
Há, porém, uma outra hipótese que merece destaque. Reza o art. 11 da lei, como foi visto, que a eficácia da norma regulamentadora superveniente é ex nunc, “salvo se a aplicação da norma editada lhes for mais favorável”.
Semelhante ressalva deve ser interpretada com cuidado. A norma, a contrario sensu, significa que, se os efeitos decorrentes da lei superveniente forem mais favoráveis para o interessado do que aqueles contidos na decisão judicial, terão eles eficácia ex tunc, vale dizer, retroagirão até o momento em que transitou em julgado a decisão, quando teve início a eficácia primitiva.
Em consequência, poderão surgir três situações diferentes diante da edição da lei regulamentadora.
A primeira é aquela em que a disciplina da lei regulamentadora superveniente é menos favorável do que aquela prevista na decisão judicial. Haverá aqui duas regulamentações sucessivas, sendo que a mais nova tem eficácia ex nunc para o interessado.
A segunda ocorre quando a disciplina da lei regulamentadora é mais favorável do que a contida na decisão judicial. Aqui também haverá duas disciplinas, mas a segunda tem eficácia ex tunc, ou seja, retroage à data do trânsito em julgado da decisão.
Por fim, temos a hipótese em que a disciplina da lei superveniente é idêntica à formulada na decisão judicial. Nesse caso, embora haja duas disciplinas, serão elas coincidentes quanto ao conteúdo. A eficácia da lei nova será ex nunc, como determina a lei, mas, na prática, ex tunc, visto que os efeitos dela já vêm sendo produzidos desde a decisão judicial transitada em julgado.
Todos esses elementos partem do princípio de que já houve decisão judicial regulamentadora em razão da inércia normativa. Mas, se a lei regulamentadora for editada antes de ser proferida a decisão, desaparece a condição do interesse processual para o prosseguimento da ação. Por conseguinte, o processo será extinto sem resolução do mérito (art. 11, parágrafo único).
Essas são apenas observações sucintas sobre a eficácia da norma regulamentadora superveniente no mandado de injunção.
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