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Assédio moral nas relações de trabalho . Parte II

ASSÉDIO MORAL

ASSÉDIO SEXUAL

Rogério Renzetti

Rogério Renzetti

01/09/2015

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  1. Assédio Moral Coletivo

O assédio moral coletivo ou institucional é uma prática que vem crescendo no país, motivada pela pressão, concorrência e cobrança de resultados rápidos e eficazes por parte das empresas.

No ano de 2013, foram firmados diversos termos de ajustamento de conduta (TAC) com centenas de empresas e ajuizadas ações civis públicas sobre assédio moral coletivo. A maioria dos casos estão ligados a metas: formas de castigo a que o trabalhador é submetido por não atingi-las. É a prática da gestão por estresse ou por medo.

Como sabemos, o instituto do assédio moral é muito novo, começou a ser efetivamente abordado no início dos anos 2000 e, aos poucos, vem ganhando maior visibilidade. Portanto quando se fala em assédio moral coletivo, a coisa é ainda mais recente, nos últimos cinco anos é que começaram a aparecer alguns casos no país.

A maior condenação relatada pelo Ministério Público do Trabalho foi contra a rede Walmart, com uma pena no valor de R$ 22,3 milhões. Os empregados relataram uma rotina de cobranças excessivas, com xingamentos dos seus superiores hierárquicos. Um dos casos pioneiros de assédio moral coletivo é o da empresa de bebidas Ambev, que, no ano de 2006, teve que pagar R$ 1 milhão por obrigar vendedores a dançarem a música “na boquinha da garrafa”, fazerem flexões ou assistirem reuniões em pé se não batessem as metas estipuladas.

Para a configuração do assédio moral coletivo não é necessário que muitos empregados ajuízem uma ação contra a empresa. Basta que um funcionário acione a justiça do Trabalho ou faça uma denúncia ao MPT.

Na maioria dos casos, são as ações individuais, de um empregado ajuizada em face do empregador dizendo ter sofrido o assédio moral individual, que fazem com que o magistrado perceba que a prática não é individual, mas institucional, porque existem outras denúncias e ações contra a mesma organização.

Esta macrolesão, demonstrada por inúmeras ações, revela a reiteração de uma conduta lesiva por parte da empresa. A tutela jurisdicional perseguida por um número expressivo de empregados revela a prática do que vem sendo chamado de “dumping social”, tema que não abordaremos neste capítulo.

Ao se desrespeitar de forma deliberada, reiterada e institucionalizada, os direitos trabalhistas que a Constituição Federal garante ao trabalhador, a empresa não atinge apenas a esfera patrimonial e pessoal daquele empregado, mas também compromete a própria ordem econômica, projetada na mesma Constituição.

Por fim, observa-se uma fiscalização cada vez maior por parte do MPT o que acarreta aumento de preocupação das empresas para evitar esse tipo de comportamento desastroso em seu ambiente. Muitas empresas estão comprometidas, promovem palestras e criam comitês de combate ao assédio moral coletivo.

  1. Distinção entre Assédio Moral e Assédio Sexual

Rodolfo Pamplona Filho conceitua assédio sexual como sendo “Toda conduta de natureza sexual não desejada que, embora repelida pelo destinatário, é constantemente reiterada, cerceando-lhe a liberdade”.

Ambas as modalidades de assédio se traduzem em comportamentos, atos, palavras, gestos ou escritos que tornam o meio ambiente do trabalho hostil, degradante e insuportável, gerando na vítima uma grande tensão psicológica, medo e angústia.

É fato que o assédio moral é mais comum nas relações de trabalho. Temos, inclusive, que o próprio assédio sexual, quando malsucedido, poderá evoluir até instalar na vítima o assédio moral, sendo notável que o maior índice de vítimas é do sexo feminino.

O assédio sexual, ao contrário do moral, ganhou tipificação em nosso ordenamento jurídico através da Lei 10.244/91, que acrescentou ao Código Penal Brasileiro o art. 216-A.

A diferença essencial entre as duas modalidades reside na esfera de interesses tutelados, uma vez que o assédio sexual atenta contra a liberdade sexual do indivíduo, enquanto o assédio moral fere a dignidade psíquica do ser humano.

Embora ambos os interesses violados sejam direitos da personalidade, não há que se confundir as duas condutas lesivas, embora seja possível visualizar, na conduta reiterada do assédio sexual, a prática de atos que também atentam contra a integridade psicológica da vítima.

Outro ponto distintivo é que o assédio sexual importa em uma conduta de sedução, ao passo que no assédio moral a violência se instala silenciosamente, de maneira que a vítima aos poucos desenvolva um processo de dano à saúde física e/ou mental.

  1. O assédio moral na legislação esparsa

Embora o fenômeno do assédio moral ainda seja desconhecido por muitos trabalhadores, nosso ordenamento jurídico é um dos mais aperfeiçoados do mundo, apresentando uma série de leis específicas, tendentes a responsabilizar o assediador moral, notadamente no âmbito dos Estados e Municípios em relação aos seus servidores.

Para muitos, o assédio moral é espécie do gênero dano moral. Assim sendo, este mal vem impulsionando, cada vez mais, a propositura de ações de ressarcimento ou compensatórias.

O artigo 1º, incisos III e IV, da Constituição da República, estabelece a base da tutela constitucional em relação à prática do assédio moral, por considerar como fundamentos da República Federativa do Brasil, enquanto Estado Democrático de Direito, dentre outros, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho.

O artigo 5º, incisos V e X, do Texto Constitucional também estabelece que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização por danos moral e material decorrentes da sua violação.

Desta forma, os três dispositivos acima mencionados compõem a espinha dorsal da proteção constitucional a ser direcionada ao combate do assédio moral.

Inúmeros projetos de lei, no âmbito federal, encontram-se em tramitação, apresentando o assédio moral sob os mais variados aspectos.

O setor público é o ambiente que apresenta de forma mais visível e marcante a prática do assédio moral, haja visto que a maioria dos cargos de chefia são cargos em confiança, ou seja muitas vezes os “chefes” são indicados em decorrência de laços de amizade ou relações políticas, e não por sua qualificação técnica e preparo para o desempenho da função. E, ainda, este chefe não dispõe do vínculo funcional do servidor; sem poder dispensá-lo, passa a humilhá-lo e a sobrecarregá-lo de tarefas inócuas.

Em razão disso a nossa legislação, em especial no âmbito da administração pública, vem avançando efetivamente nas ações positivas de combate a prática do assédio moral, por meio de normas protetivas que podem ser utilizadas pelas vítimas do assédio moral, tanto nas áreas trabalhista e cível, quanto na área criminal.

A Administração Pública, de uma forma geral, começa a se preocupar com o assunto. O Rio de Janeiro foi o primeiro Estado a aprovar uma lei que visa evitar a prática do assédio moral e fazê-la vigorar. Trata-se da Lei nº 3.291/2002, que tem como ementa: “Veda o assédio moral no trabalho, no âmbito dos órgãos, repartições ou entidades da administração centralizada, autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, do Poder Legislativo, Executivo ou Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, inclusive concessionárias e permissionárias de serviços estaduais de utilidade ou interesse público, e dá outras providências”.

Outros Estados também já avançaram no combate a prática do assédio moral no âmbito de suas administrações, como o Rio Grande do Sul (Lei nº 12.561/06), Minas Gerais (Lei nº 116/11 c/c Lei nº 46.060/12 e Lei Complementar nº 117/11), São Paulo (Lei nº 12.250/06), Brasília (Lei nº 2.949/02) e Rondônia (Lei nº 1.860/08), bem como os Municípios de Catanduva/SP (Lei nº 4.205/06), São Carlos/SP (Lei nº 13.261/03) e Divinópolis/MG (Lei nº 5.534/02).

Em âmbito federal existe o projeto de lei nº 4.591/2001, de iniciativa da Deputada Rita Camata, que visa incluir no Estatuto do Servidor Público Federal a proibição e penalidades pela prática do Assédio Moral com a inclusão do artigo 117-A da lei 8.112/90 que abordaria, exclusivamente, o repúdio a este ato. Destacamos que o Estado de Minas Gerais já introduziu esta proibição expressamente no Estatuto dos seus Servidores, por meio do inciso XIX do artigo 144 da Lei Complementar 04/09.

Há, ainda, um projeto de lei de âmbito federal que visa instituir o dia 2 de maio como o dia nacional de luta contra o Assédio Moral. Apesar de não ter sido aprovado até hoje, já foi esta iniciativa reconhecida pelo Estado de São Paulo (Lei nº 13.036/08) e pelo Município de Cachoeira do Sul – RS (Lei nº 3.671/06). Percebam que o dia escolhido como referência para a luta contra o Assédio Moral é um dia após o dia 1º de maio, dia internacional do trabalho.

Contudo, apesar dos avanços legislativos acima mencionados, ainda, não temos no Brasil uma lei nacional que regulamente o assédio moral no ambiente de trabalho, de modo que sua disciplina toma como base as normas estaduais e municipais sobre o tema, que servem de subsídio para a sua aplicação doutrinária e no processo do trabalho.          Além disso, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) possui regras específicas sobre assédio, que também são usadas como fundamento em casos de assédio moral.

Não obstante a ausência de uma legislação nacional especifica sobre o tema, merece destaque um dispositivo federal pouco conhecido, mas de suma importância, a Lei Federal nº 11.948/09 que dispõe sobre os empréstimos concedidos pelo BNDES e em seu artigo 4º determina que: “Fica vedada a concessão ou renovação de quaisquer empréstimos ou financiamentos pelo BNDES a empresas da iniciativa privada cujos dirigentes sejam condenados por assédio moral ou sexual, racismo, trabalho infantil, trabalho escravo ou crime contra o meio ambiente”.

Não resta dúvida de que a prevenção é o instituto mais importante de um Estado que se pretenda democrático e, especialmente, inclusivo. Apenas prevenindo conseguiremos evitar muitos danos, talvez irreversíveis, ao empregado. Dessa forma, o administrador tem o dever de agir preventivamente, sendo inadmissível a sua inércia.

  1. Conclusão

O assédio moral, apesar de não encontrar previsão específica em nosso ordenamento jurídico, consiste em inequívoca violação das obrigações inerentes ao contrato de trabalho, o que pode vir a acarretar a resolução contratual, com esteio nos artigos 482 e 483 da CLT.

É conduta atentatória à dignidade da pessoa humana e aos valores sociais do trabalho, que constituem fundamentos da República Federativa do Brasil.

A sua prática, além de ofender direitos fundamentais da vítima, contamina o equilíbrio do meio ambiente do trabalho, afetando a produtividade e o índice de acidentes de trabalho.

O resgate e a valorização do ambiente profissional devem ser vistos como elementos indispensáveis à modernização das relações de trabalho.

Sem a pretensão de esgotar todos os importantes aspectos relacionados a este instigante assunto, o presente capítulo teve por escopo proceder a uma rápida análise do tema dentro do contexto do ordenamento jurídico pátrio, buscando delinear as principais características inerentes a esta conduta abusiva, bem como explicitar os diversos mecanismos de tutela disponíveis para a vítima.

O Brasil ainda carece de uma legislação específica que discipline o assédio moral. Contudo, felizmente isso não tem inviabilizado o reconhecimento deste fenômeno por nossos tribunais, caracterizando-o como conduta tipificadora de ofensas de caráter moral e patrimonial, as quais podem ser objeto de tutela em sede de ações reparatórias.

Longe de pretender ser uma conclusão sobre o assunto, o presente capítulo busca acrescer ideias e sugestões à ampla e diversificada análise do tema, oferecendo a sua contribuição para o enriquecimento do necessário debate.

  1. Referências Bibliográficas

BARROS, Alice Monteiro de. Proteção à intimidade do empregado. São Paulo: Ltr, 1997

BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho. Rio de Janeiro: renovar, 2002.

BELMONTE, Alexandre Agra. O novo código civil. Rio de Janeiro: renovar, 2002.

BONILHA, Ferreira. Assédio moral nas relações de trabalho. Campinas/ SP: Russell, 2004.

NETO, Xisto Tiago De Medeiros. Dano moral coletivo. São Paulo: Ltr, 2004.

PAMPLONA FILHO, Rodolfo. O dano moral na relação de emprego. 2ed. São Paulo: Ltr, 1999.

SILVA, Jorge Luiz De Oliveira. Assédio moral no ambiente de trabalho. Rio de Janeiro: Editora e Livraria Jurídica do Rio de Janeiro, 2005.


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