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Regulação da Atividade Econômica de Transporte Individual de Passageiros por Plataformas de Aplicativos

Marco Aurélio Serau Junior

Marco Aurélio Serau Junior

21/11/2018

A Lei 13.640, de 26.03.2018, cuida de regular o espinhoso tema da atividade econômica de transporte privado de passageiros mediante a intermediação realizada por plataformas de aplicativos e sistemas informatizados, a exemplo de Uber e Cabify.

A referida norma altera a Lei 12.587, de 03.01.2012, a qual institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, inserindo nesse contexto e regulamentando a possibilidade de ocorrer o transporte remunerado privado individual de passageiros.

Altera-se a redação do art. 4º, inciso X, da Lei 12.587/2012, que passa a ser a seguinte:

X – transporte remunerado privado individual de passageiros: serviço remunerado de transporte de passageiros, não aberto ao público, para a realização de viagens individualizadas ou compartilhadas solicitadas exclusivamente por usuários previamente cadastrados em aplicativos ou outras plataformas de comunicação em rede.

É importante frisar que a Lei 13.640/2018 não se trata de uma norma de Direito do Trabalho, mas de regra de Direito Público e de Direito Econômico, pois, em essência, visa à regulação daquela atividade econômica de transporte de passageiros em carros particulares com intermediação efetuada pelas diversas plataformas de aplicativos de rede existentes.

Essa interpretação fica ainda mais clara se considerarmos a inserção dos arts. 11-A e 11-B na mencionada Lei 12.587/2012, que impõem diversas exigências para o funcionamento dessa modalidade de transporte privado de passageiros:

Art. 11-A. Compete exclusivamente aos Municípios e ao Distrito Federal regulamentar e fiscalizar o serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros previsto no inciso X do art. 4º desta Lei no âmbito dos seus territórios.

Parágrafo único. Na regulamentação e fiscalização do serviço de transporte privado individual de passageiros, os Municípios e o Distrito Federal deverão observar as seguintes diretrizes, tendo em vista a eficiência, a eficácia, a segurança e a efetividade na prestação do serviço:

I – efetiva cobrança dos tributos municipais devidos pela prestação do serviço;

II – exigência de contratação de seguro de Acidentes Pessoais a Passageiros (APP) e do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT);

III – exigência de inscrição do motorista como contribuinte individual do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), nos termos da alínea h do inciso V do art. 11 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991.

Art. 11-B. O serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros previsto no inciso X do art. 4º desta Lei, nos Municípios que optarem pela sua regulamentação, somente será autorizado ao motorista que cumprir as seguintes condições:

I – possuir Carteira Nacional de Habilitação na categoria B ou superior que contenha a informação de que exerce atividade remunerada;

II – conduzir veículo que atenda aos requisitos de idade máxima e às características exigidas pela autoridade de trânsito e pelo poder público municipal e do Distrito Federal;

III – emitir e manter o Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV);

IV – apresentar certidão negativa de antecedentes criminais.

Parágrafo único. A exploração dos serviços remunerados de transporte privado individual de passageiros sem o cumprimento dos requisitos previstos nesta Lei e na regulamentação do poder público municipal e do Distrito Federal caracterizará transporte ilegal de passageiros.

Rápida análise desses arts. 11-A e 11-B faz perceber que se dispõe sobre a competência regulamentar, fiscalizatória e tributária dos Municípios e do Distrito Federal no tocante à atividade de transporte privado de passageiros mediante intermediação de plataformas digitais.

Também há previsão de exigências para o exercício dessa atividade profissional (modalidade de CNH, tipo e modelo de automóvel, inexistência de antecedentes criminais, licenciamento do veículo e recolhimento das correspondentes taxas etc.).

Esse foi o objetivo central dessa norma, o aspecto regulatório, de Direito Público e Econômico, não se tratando de uma regra de Direito do Trabalho visando à regulação laboral da atividade profissional de motorista que atue nesse segmento de transporte privado de passageiros.

O escopo geral da Lei 13.640/2018, portanto, foi tornar clara a possibilidade de, em território nacional, ser desenvolvida a atividade econômica de transporte privado de passageiros por intermédio dos diversos aplicativos eletrônicos existentes.

Tanto que o art. 1º desse diploma legal faz menção direta ao comando contido no art. 170, parágrafo único, da Constituição Federal:

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

O advento da Lei 13.640/2018 espanca qualquer possibilidade de proibição da exploração da atividade econômica de transporte privado e remunerado de passageiros pelo mecanismo de plataformas digitais.

A questão laboral, que diz respeito à indagação de o motorista que atua mediante as plataformas digitais possuir ou não vínculo empregatício com as empresas que desenvolvem e operacionalizam os referidos softwares, continua em aberto.

Salvo melhor juízo essa questão não foi tratada pela Lei 13.640/2018, a não ser oblíqua e muito vagamente no art. 11-A, inciso III, conforme inserido na Lei 12.587/2012:

III – exigência de inscrição do motorista como contribuinte individual do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), nos termos da alínea h do inciso V do art. 11 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991.

Esse dispositivo exige a inscrição do motorista como contribuinte individual perante a Previdência Social, o que sequer chega a configurar uma novidade, pois a legislação previdenciária sempre permitiu isso a quem exerce trabalho autônomo e possui condições financeiras para o fazer.

A simples referência ao cadastramento dos motoristas de aplicativos como segurados contribuintes individuais não é suficiente para caracterizá-los, em definitivo, como trabalhadores autônomos, pois a figura jurídica do segurado contribuinte individual se aplica não somente aos autônomos, abrangendo também outras expressões econômicas: sócios e administradores de pessoas jurídicas, ministros de confissões religiosas, garimpeiros e pequenos produtores rurais, entre outras.

A menção do art. 1º ao inciso XIII do art. 5º da Constituição Federal, usado como suporte para a inovação legislativa produzida, em nada esclarece a questão de vínculo empregatício entre motoristas e plataformas digitais:

XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

É que o referido dispositivo constitucional faz menção à possibilidade de a lei estabelecer condições para exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, o que se aplica indistintamente tanto ao empregado na relação de emprego como ao profissional autônomo.

Assim, diante da permanência da lacuna normativa sobre a natureza de emprego ou de trabalho autônomo dos motoristas de aplicativos de transporte privado de passageiros, tem-se que a discussão prosseguirá, especialmente na via judicial. E assim se deverá constatar, a partir do princípio da primazia da realidade, a configuração ou não dos elementos da relação de emprego previstos no art. 3º da CLT, notadamente a subordinação.


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