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DICAS
FILOSOFIA DO DIREITO
LANÇAMENTOS
Homo juridicus e suas preferências em face do Direito
Paulo Nader
06/10/2021
Assim como as pessoas humanas têm personalidade, maneira individual de agir e de reagir em face de situações e acontecimentos, cada jurista é homo juridicus que possui as suas preferências em face do Direito e se identifica com determinados valores jurídicos.
Entre os cultores do Direito as tendências são as mais diversificadas. Alguns contemplam o Jus sob o prisma da segurança jurídica, outros atribuem maior importância ao valor do justo, havendo aqueles que dão preeminência ao fato.
A concepção tridimensionalista revela uma visão mais equilibrada, pois apresenta o Direito como um complexo formado pelos elementos fato, valor e norma. Os adeptos de tal corrente não especificam, todavia, o tipo de valor que seria fundamental ao Jus Positum, pelo que, entre eles, registram-se também várias tendências.
Homo juridicus legalista
Sob a influência do positivismo, o homo juridicus legalista identifica o Direito com o valor segurança jurídica. Em seus trabalhos exegéticos não se motiva por outros princípios senão os derivados das normas jurídicas. Ser justo é aplicar a norma ao caso concreto dentro da previsão legal.
Os membros da Escola da Exegese, que floresceu na França após a promulgação do Código Napoleão, em 1804, possuíam formação legalista. Para eles o Direito estava apenas no Código. A postura legalista, sobre ser acrítica, não favorece o desenvolvimento da sociedade e nem do Direito. Embora não chegue a ser justificadora do Direito vigente, é doutrina conservadora no sentido em que não provoca inquietações do ponto de vista ético ou sociológico.
Homo juridicus eticista
Em posição diametralmente contrária situa-se o homo juridicus eticista, para quem a lei seria apenas um instrumento de justiça. O valor do justo não é considerado do ponto de vista convencional, como critério da lei, mas substancial, como o que efetivamente confere o seu a cada um.
A análise que exercita não é de mera decodificação, pois submete as instituições à censura ética. A justiça seria a causa final do Direito e seu elemento essencial. Em consequência, a lei injusta não seria Direito, não devendo, destarte, ser aplicada nos tribunais.
O homo juridicus eticista não se conforma com a lei pelo simples fato de ser lei. Por sua atitude idealista, põe-se em busca permanente do dever-ser. A corrente do Direito Livre, que obteve o seu maior desenvolvimento no primeiro quartel do século XX e se projetou nas obras do austríaco Eugen Ehrlich e do alemão Kantorowicz, seus expoentes máximos, seguiu essa linha de pensamento. Seus adeptos preconizavam a aplicação da justiça pelo critério da lei ou apesar da lei.
Observa-se um conflito entre as concepções do homo juridicus legalista e eticista, que na realidade é também entre os valores segurança jurídica e justiça. A harmonia entre os dois valores é possível, não, porém, em termos absolutos. A lei injusta é exemplo disso. Enquanto o legalista reconhece a sua validade e orienta no sentido de sua aplicação, o eticista nega-lhe caráter jurídico e obrigatoriedade. São posições antitéticas e inconciliáveis.
Na opinião de Paulo Dourado de Gusmão a conjugação dos dois valores é possível, mas “só no sistema em que as leis não são ditadas por um, mas por muitos…”[17].
De fato, a ordem jurídica emanada de um regime democrático, de um modo geral, é um saber a que se ater e reúne soluções justas para as hipóteses que prevê. A questão, porém, não se resolve completamente na instância política. Quando o conflito se apresenta inamovível, ao jurista se impõe decidir pela aplicação ou não das normas jurídicas, momento em que expõe a sua preferência na escala de valores e revela a sua vocação como homo juridicus.
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[17] Filosofia do Direito, cit., p. 134.