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Diário de Carreira: Advogado da União na área consultiva
Luciano Dutra
04/08/2017
Aos quinze anos de idade, após o término do então “científico”, atual ensino médio, morando em uma cidade pequena do interior da saudosa Minas Gerais, deparei-me com um dilema que aflige quase todos os secundaristas: o que fazer daqui para frente?
Para aplacar minha angústia, socorri-me do meu eterno ídolo (meu pai), que sugeriu que fizesse concurso para as carreiras militares, orientação que segui à risca. Assim começou minha trajetória de quinze anos como militar, de aluno da Escola Preparatória de Cadetes do Exército, passando pela Academia Militar das Agulhas Negras, até capitão do Exército Brasileiro.
Neste ínterim, já como tenente do Exército, ingressei na inesquecível Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora, graduando-me em 2005.
Já em 2006, mais um impasse domina meu íntimo: continuar na carreira castrense ou trilhar novos rumos na seara jurídica? Decidi enfrentar o desconhecido e voltar aos estudos para concurso público. Em 2007, tomei posse para analista do Ministério Público da União e, em 2009, para advogado da União, meu objetivo final.
Vamos falar um pouco sobre a carreira e nossa instituição.
Advogado da União e procurador da Fazenda Nacional compõem as carreiras da Advocacia-Geral da União (AGU). Temos, ainda, duas carreiras que hoje não integram a AGU, mas que possuem um regime jurídico semelhante: os procuradores federais e os procuradores do Banco Central.
A Constituição Federal estabelece, no art. 131, que “a Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo”.
Tal mandamento é replicado pelo parágrafo único do art. 1º da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, que institui a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União, nos seguintes termos “à Advocacia-Geral da União cabem as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos ao Poder Executivo, nos termos desta Lei Complementar”.
Notem que a AGU atua em duas grandes dimensões: a contenciosa e a consultiva.
No contencioso, a AGU representa a União judicial e extrajudicialmente, valendo-se dos seguintes órgãos: o Advogado-Geral da União, que representa a União perante o Supremo Tribunal Federal; a Procuradoria-Geral da União, que representa a União perante os Tribunais Superiores, salvo nas questões tributárias, cuja tarefa cabe à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional; as Procuradorias-Regionais da União que representam a União junto aos Tribunais Regionais Federais; as Procuradorias da União nos Estados que representam a União junto à 1ª instância nas capitais perante à Justiça Federal e à Justiça Trabalhista; e as Procuradorias-Seccionais e Escritórios de Representação que representam a União junto à 1ª instância no interior do País.
Esta representação judicial é exercida em defesa dos interesses da União, quando figurar como autora, ré ou, ainda, terceira interessada. Já a representação extrajudicial é exercida perante entidades não pertencentes ao Poder Judiciário, como, por exemplo, o Tribunal de Contas da União, o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público.
Por outro lado, a atuação consultiva da AGU perante o Poder Executivo visa dar segurança jurídica aos atos administrativos praticados pela Administração Pública direta e indireta de direito público, notadamente quanto à materialização das políticas públicas, à viabilização jurídica das licitações e dos contratos e, ainda, na proposição e análise de medidas legislativas (leis, medidas provisórias, decretos e resoluções, entre outros) necessárias ao desenvolvimento e aprimoramento do Estado Brasileiro.
Além disso, na dimensão consultiva a AGU exerce atividades de conciliação e arbitramento, cujo objetivo é o de resolver administrativamente os litígios entre a União, autarquias e fundações, evitando, assim, a provocação do Poder Judiciário.
Exercem atividades consultivas na AGU: o Advogado-Geral da União, a Consultoria-Geral da União, as Consultorias Jurídicas da União nos Estados, as Consultorias Jurídicas junto aos Ministérios e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional junto ao Ministério da Fazenda.
Tenho muito orgulho e satisfação de ser Advogado da União, carreira que se consolidou nos últimos anos como uma das mais importantes no cenário jurídico nacional.
Na Advocacia-Geral da União já atuei nas duas dimensões. Na área contenciosa, atuei na Procuradoria-Geral da União perante o Superior Tribunal de Justiça e, no consultivo, atuei na Consultoria-Geral da União, na Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e na Consultoria Jurídica junto ao Ministério das Cidades, local em que estou hoje, exercendo, cumulativamente, a Coordenação-Geral de Assuntos Licitatórios, Convênios, Contratos e demais Procedimentos Administrativos.
Além de Advogado da União, sou professor de Direito Constitucional em cursos preparatórios para concursos públicos presenciais e online. Sou também autor da obra “Direito Constitucional Essencial”, pela Editora Método e mantenho um canal no YouTube, em que comento os Informativos do STF e dou dicas semanais de Direito Constitucional, além de ser marido da minha querida esposa Fernanda e pai da nossa princesa Rafaela. Intenso? Muito. Mas conto com o apoio incondicional de minha família, a quem amo com todas as minhas forças.
Quem desejar me conhecer um pouco mais, pode acessar meu site. Agora, vamos à minha semana de trabalho.
Segunda-feira
A semana já começa intensa. Minha dica é criar uma rotina.
Pela manhã, começo a jornada lendo os emails em três caixas diferentes: os email pessoais, os emails da caixa da AGU e os emails da caixa do Ministério das Cidades.
Depois, acesso os sistemas eletrônicos de processos denominados “Sapiens” e “SEI”, para verificar se há novas distribuições de processos. Havendo, divido as tarefas entre os colegas da Coordenação.
Feito isso, vou estudar os processos que estão sob minha responsabilidade, respondendo as consultas suscitadas pelos órgãos consulentes.
Neste dia, surgiu uma demanda urgente, que recebeu tratamento prioritário: um processo de contratação de empresa especializada para atualização de ativos de rede para a camada de acesso e datacenter, relativos à infraestrutura de rede de dados da pasta. Lembremos que as contratações públicas federais dependem de prévia aprovação da AGU, por força do parágrafo único do art. 38, da Lei nº 8.666, de 1993.
Importante dizer que, nesta análise, a atividade do advogado da União fica facilitada, haja vista que a Consultoria-Geral da União mantém comissão permanente de atualização de minutas de editais e contratos que são adotados pelos órgãos assessorados. Tal iniciativa nasce de um profundo trabalho desenvolvido pela AGU, que, ao fim e ao cabo, vai ao encontro de determinação exarada pelo Tribunal de Contas da União no Acórdão nº 2.328/2015 – Plenário, em que a Corte de Contas, diante das deficiências constatadas na governança e gestão das contratações públicas, traz recomendações a serem adotadas no âmbito da Advocacia-Geral da União e voltadas precipuamente ao aprimoramento dos modelos de listas de verificação, editais e contratos administrativos.
À tarde, dei continuidade à análise jurídica da minuta do edital e seus anexos da contratação acima citada e, na qualidade de Coordenador-Geral, participei de uma reunião de gestão na Consultoria Jurídica.
Terça-feira
Nesta manhã ensolarada do inverno brasiliense, com uma vista sensacional do 13º andar do Ministério das Cidades, comecei minha rotina lendo os emails e acessando os sistemas de processo eletrônico.
Depois, voltamos aos processos para não perder o prazo. Importante que se diga que no consultivo não há, por óbvio, os prazos judiciais peremptórios, mas buscamos seguir a orientação de devolver as consultas no prazo máximo de quinze dias, o que não é nada fácil. Hoje, ao abrir meu sistema, constatei que possuo seis processos aguardando solução. Tenho de arregaçar as mangas e atender com celeridade e eficiência nossos órgãos assessorados.
À tarde, interrompi meu parecer para atender a um chamado do Consultor Jurídico, que solicitou urgência em um assunto de interesse do país. Teremos que revisitar as normas afetas ao Programa Minha Casa Minha Vida para viabilizar a construção de casas populares em locais afetados por calamidade pública reconhecida.
Depois, voltei ao parecer para revisão final e encaminhamento ao órgão consulente.
Quarta-feira
Após a rotina de emails e sistemas, tenho de selecionar o processo de hoje, de preferência respeitando a ordem cronológica. É um aditivo de prazo em contrato de prestação de serviço de natureza continuada.
Importante trazer que, considerando a natureza repetitiva da demanda, já produzi uma manifestação jurídica referencial que se aplica a todos os casos que envolvem prorrogação de vigência em contratos de serviços continuados. Nestas situações, cabe, tão-somente, verificar se há dúvida jurídica não albergada pela manifestação jurídica referencial e enfrentá-la. Não havendo novos elementos, aplica-se in totum o parecer referencial.
À tarde, além da análise jurídica do processo administrativo em questão, fui convocado para uma reunião com a equipe técnica da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental para estudar a viabilidade jurídica da reprogramação de um Termo de Compromisso firmado entre a União e um Município.
Quinta-feira
Tive que acelerar a rotina inicial diária porque tinha uma reunião agendada com o secretário nacional de Saneamento Ambiental.
O restante da jornada foi destinado à análise de processos administrativos.
Sexta-feira
Sextou? Ainda não.
Para terminar a semana sem nenhuma pendência, resta analisar um recurso administrativo apresentado por uma empresa que teve o seu contrato rescindido unilateralmente pela Administração, em cumprimento à decisão judicial transitada em julgado.
É isso! Fiquei extremamente feliz em ter compartilhado o diário semanal. Se um dia, você, leitor, resolver ser advogado da União, ficaria muito honrado em recebê-lo em nossa instituição. Fique com Deus e forte abraço.
Veja também:
- Comentando o Informativo do STF #7 – Inf. 857 a 860
- Comentando o Informativo do STF #6 – Inf. 856
- Luciano Dutra: Concursos Públicos e a Lei da Terceirização
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