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DICAS
PORTUGUÊS JURÍDICO
A Exigência do Dicionário nas Peças Processuais
Joseval Martins Viana
19/02/2015
Devemos zelar pela ortografia nas peças processuais. A grafia incorreta das palavras compromete a competência linguística do operador do direito. Afeta a própria peça processual. Palavras escritas incorretamente grassam na linguagem forense.
Leiamos este parágrafo: “Alega, em apertada síntese, que foi contratada para o fornecimento de biscoito de maizena, mas que em dezembro de 2012 passou a encontrar dificuldade para encontrar o produto da marca Todeschini, tendo descoberto em março de 2013 que a empresa havia encerrado suas atividades” (Apelação n.º 3002119-10.2013.8.26.0071).
O relator do acórdão supramencionado confundiu “maizena” (marca registrada) com “maisena”. Escreve-se maisena com -s-, e não com -z-. A palavra Maizena é marca registrada. Maisena é o produto industrial constituído por amido de milho.
Se tivermos dúvida quanto à grafia das palavras, devemos consultar o dicionário para dirimi-la, sobretudo no exercício da nossa profissão.
Notemos que os erros de grafia são comuns na linguagem forense. Na Apelação Criminal n.º 9000001-81.2005.8.26.0800, encontramos o seguinte excerto: “Informou que os roubadores queriam levar trinta mil reais, porém não havia tal quantia no local, motivo pelo qual levaram tudo o que puderam encontrar, tal como roupas, calçados, máquinas digitais, aparelhos celulares e até mesmo shampoo; esclareceu que colocaram todas as resfurtivas em um carro e, antes de sair, os amarraram, pelas mãos e pelos pés, com lençóis, os quais rasgaram”. Além de outros erros gramaticais (por exemplo, “os amarraram”, quando o correto é “amarraram-nos”), a palavra certa é xampu, e não shampoo. Esta é inglesa e aquela, portuguesa.
Erros de grafia são comuns nas palavras analisar e paralisar. Esses vocábulos são escritos com -s-, e não com -z-. Vejamos estes exemplos que merecem atenção e, consequentemente, a devida correção: “(…) lograram fazê-lo sem que a empresa tivesse que paralizar as suas atividades” (Agravo de Instrumento n.º 2115123-27.2014.8.26.0000); “(…) de acordo com o procedimento realizado na poupança, tal como decidido pelo STF ao analizar a constitucionalidade da Lei 11.960/09…” (Apelação n.º 0029731-29.2012.8.26.0161).
Na linguagem forense, outra palavra que merece cuidado é espontâneo com -s-, e não com -x-. Vejamos o cochilo do relator neste parágrafo jurídico: “Sendo assim, considerando que a alegação de ausência de intimação para cumprimento expontâneo não ter sido arguida oportunamente, não pode este Tribunal apreciá-la em sede de Apelação” (Embargos de Declaração n.º 0110279-69.2008.8.26.0100/50000)
É importante fixar a grafia correta das palavras, a fim de registrá-las corretamente. Precisamos evitar erros de grafia nas peças processuais, pois, sem dúvida, a palavra é o instrumento de trabalho do profissional do direito.
Vejamos que algumas regras ortográficas (recomendamos consultar o capítulo sobre ortografia de um bom livro de gramática) podem ser empregadas com o objetivo de evitar erros na grafia. Ensina a gramática que palavra derivada de verbo cujo radical finalize por -ced-, -met-, -gred- ou -prim- escreve-se com -ss-: conceder = concessão; remeter = remessa; agredir = agressão; imprimir = impressão.
Depois de -en-, emprega-se -x-, e não -ch-. Exemplos: enxuto, enxame, enxaqueca etc. Essa regra comporta a seguinte exceção: o verbo encher e seus derivados são grafados com -ch-, porque têm origem na palavra charco, que significa lugar onde há água parada e pouco profunda, atoleiro, poça.
É importante observar também que algumas palavras admitem formas variantes, ou seja, admitem duas grafias: aluguel ou aluguer; assobiar ou assoviar; bêbado ou bêbedo; caminhão ou camião; champanha ou champanhe; chimpanzé ou chipanzé; flecha ou frecha; neblina ou nebrina, quatorze ou catorze (cincoenta não existe); quota ou cota; quotidiano ou cotidiano; registrar ou registar etc.
Para encerrar este artigo, salientamos que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, publicado pela Academia Brasileira de Letras, 5.ª ed., 2009, registra estupro e estrupo. Mas não se assuste, porque estrupo significa barulho excessivo. Exemplo: “O estrupo foi tamanho que o juiz de direito teve de paralisar a audiência de instrução e julgamento”. Então, estupro e estrupo não são palavras variantes, mas vocábulos com significados diferentes.
Vamos ao nosso exercício. Antes disso, a resposta correta do teste dado no artigo “A Procuração ‘ad judicia’ e a Ortografia Oficial” é a letra “e”.
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